Quando se pensa um conceito, constitui uma simplificação da tarefa racional de o dirimir atentar na etimologia da palavra que o traduz. Tomemos Política e Cidadania como equivalentes sinonímicos, de polis e civis, traduzíveis na arte de construção da cidade-espaço-público-bem comum. Arte, a montante de técnica. Vocação, a montante de profissionalização. Ministério (ou seja, serviço) a montante de pragmatismo remunerado. Tudo complementar, nada excludente. Nesta ordem, dificilmente invertível.

Não subsistirá demasiado tempo uma “política” feita de políticos profissionais. Podia ser condição para a adesão militante a um partido o texto de Max Weber sobre o exercício político como vocação. Isto, por um lado. Tal empreendimento careceria de expor os jovens a verdadeiras experiências de discernimento sobre o modo como olham o espaço público, perspetivam a sua transformação e se entusiasmam disponivelmente para dela participar. Ainda a montante da militância partidária. Esta seria o corolário (lógico) de uma escolha livre, consciente e informada.

Estamos a deixar os mais novos reféns do arrebanhamento ocasional, sustentado frequentemente em lógicas perversas que acenam com “carreirismos”, premeiam “fidelidades” e não esperam outra competência que não a da “obediência”. O digital, com pouco escrutínio e com agendas pouco inocentes massifica e amplifica esta adesão “clubística” que toca a irracionalidade. Uma vez assentada a ‘poeira’ resultante do aceno das coloridas bandeiras, regressamos a uma letargia silenciosa e cómoda, que eclode novamente no próximo ato eleitoral. No intervalo, “eles” fazem algo (ou “nada”!) com eles (jovens) e nós (cidadãos “comuns” menos jovens) divorciados desse vínculo instantâneo de paixão assolapada.

Regressando aos jovens, o centro deste texto, a Política (em sentido forte) tem de ser parte do currículo académico “informal”, porque é parte essencial do ser pessoa e cidadão. O social que cada um é, não constitui um acrescento, mas é identidade. Como tal, e como todas as outras dimensões da vida, não pode pressupor-se que cresce (apenas) com o passar cronológico do tempo e a acumulação de experiência. Só conseguimos dar o que temos e amar o que conhecemos.

Saltando para o campo da militância, importa que esta não seja perspetivada como profissão. Não se é político, neste sentido do trabalho partidário ou governativo, está-se nessa função. Nesse sentido, é trabalho temporário e precário. Quando se eterniza, significa que o poder exerceu uma sedução de tal ordem, que se converteu em maior que a vontade livre dos seus protagonistas. No mínimo. Acenar aos jovens com a normalização deste “estado de coisas” não é muito diferente do que apostar nas qualidades futebolísticas de uma qualquer criança e fazer a triste figura do “familiar adepto de bancada” que tantas vezes se relata em campos de Portugal. Além de que significa cuidar da educação dos jovens pensando-os como esquartejados em partes, o que resulta inevitavelmente num todo coxo ou mutilado.

Do lado da Escola, importará resolver o drama concetual do binómio educação-ensino. Se o espaço escolar se esgotar no ensino-aprendizagem (admito que o essencial) distinguir-se-á pela fisicalidade do corpo (umas vezes presente, outras ausente), mas não terá muitos mais elementos diferenciadores. Circunscrever o ensino à transmissão-assimilação de informação, quanto baste para reproduzir num lugar onde se procura o erro e o que o aluno não sabe, além de errado, é ingénuo e enganador. Desde logo, porque de tão temporário e caduco que é, dificilmente essa informação se transforma em conhecimento apropriado. Além disso, qualquer aluno tem acesso democratizado e ilimitado a milhares de horas aos mesmos conteúdos, com a vantagem de mais consistentes, fundamentados e apelativos.

Nessa lógica, importa implementar um processo de assertiva, cirúrgica e corajosa revisão dos currículos e das avaliações. Seguramente que para trocas e ajustes, mas, sobretudo, para incorporar a “informalidade” e tudo aquilo que torna verdadeiramente humana uma pessoa. Claro que em complementaridade com a família, no ideal e caso a caso (para respeitar identidades livres, mas para suprir deficiências estruturais), mantendo as autonomias e especificidades de cada “instituição”.

E aí entra a Política, como a Religião, como a literacia financeira, como a literacia cidadã em geral. Numa laicidade que existe para que todos tenham lugar. Sobretudo os diferentes, que são a experiência de enriquecimento social, que estagna na repetição da mesmidade. Ninguém nasce ensinado, mas também não vem como livro de instruções.