Com a chuva a cair contra a janela e a minha saída com uma amiga a aproximar-se, lembrei-me de algo que li na internet. Alguém escreveu que uma das melhores coisas para se fazer em Lisboa num dia chuvoso é ir à Pastelaria Versailles e pedir um aconchegante chocolate quente e um scone tostado com manteiga. E foi exatamente isso que decidi fazer nessa tarde chuvosa e nublada.
A Pastelaria Versailles fica situada na Avenida da República e é um dos cafés mais antigos de Lisboa. Nasceu a 25 de Novembro de 1922 pelas mãos de Salvador Antunes, um português fascinado pela cultura francesa. Ao início deu-lhe o nome de “Patisserie Versailles”, e esta distinguia-se pelo seu atendimento feito por empregados com fardas impecáveis. Algo que 100 anos depois não se perdeu.
Por volta das 16h30 estávamos nós a sair da estação de metro do Saldanha. Basta subir as escadas em direção à Avenida da República que nos deparamos logo com a Versailles. Entre tantos prédios das Avenidas Novas, a arquitetura deste estabelecimento não nos deixa enganar no sítio.
A sua arquitetura, tanto por fora como por dentro, continua a apresentar vários elementos da sua origem, muito característicos da Art Nouveau. Além de ser um ponto de referência da capital portuguesa, este património foi classificado pelo IPPAR em 1987 como marco arquitetónico.
Visto do lado de fora, o lugar parece-nos pequeno, iludidos também pela escolha de fazer uma pequena esplanada. Contudo, quando empurramos as altas portas de vidro, deparamo-nos com um espaço amplo, antigo, mas acolhedor. Do nosso lado direito está uma grande vitrine cheia de doces e salgados, onde algumas pessoas pedem expressos para beber na hora e compram bolos para levar; e do lado esquerdo estão dispostas um número elevado de mesas, das quais muitas já estão ocupadas.
Devido ao seu valor monumental e decoração de requinte, entrámos um pouco a medo. Mas o nosso receio não podia ser mais descabido. Fomos logo recebidas com uma simpatia gigante e o empregado pôs-nos logo à disposição para escolhermos a mesa que mais nos agradava (das disponíveis, claro).
Uma casa ao estilo Luís XIV, com um interior que impressiona qualquer um com a sua decoração adornada de frescos de estilo neorromântico, com vitrais naturalistas, elaborados candelabros, tetos embelezados e adornos em talha dourada.
Para conservar a sua essência são realizadas obras de restauro e de limpeza com regularidade. O teto e a talha dourada das paredes obrigam a limpezas cuidadosas de dez em dez anos.
Sentamo-nos e esfoliamos o menu. Não foi preciso muito tempo, pois sabia o que queria experimentar: o famoso chocolate da casa e o scone torrado, que mantém a mesma receita de há 100 anos.
Enquanto esperamos pelo nosso pedido, fui absorvendo o ambiente que me rodeava. Para meu espanto, não é um ambiente silencioso com apenas uma música baixa para preencher a atmosfera. É completamente o oposto. É um espaço preenchido por conversas, risos, tilintar de chávenas, cheiros doces e pão acabadinho de torrar. As pessoas espalhadas pelas diversas mesas são de várias faixas etárias, desde crianças a idosos. Um café que remonta os anos 20, agora acolhe várias gerações e histórias.
O nosso lanche não demorou muito tempo a chegar à mesa. A bebida vinha quente e o bolo com uma camada fina de manteiga derretida a escorrer. O chocolate quente é como beber chocolate de leite derretido em banho-maria. Um pouco grosso, mas ao mesmo tempo suave e não muito doce nem muito amargo. Combinado com o scone, a sala morna dos fornos a trabalhar e os pingos da chuva a bater na janela, criou-se ali, naquela pastelaria, um conforto igual a um abraço quando estamos tristes.
Apenas saímos de lá por volta das 19h, depois de várias conversas e elogios à casa. Na rua, a chuva já tinha parado e o dia começava a esconder-se por trás do luar.