Nos Estados Unidos da América avizinham-se novas eleições presidenciais a 5 de Novembro de 2024 e tanto o Partido Repulicano como o Partido Democrata já estão a preparar terreno e os seus respectivos candidatos, nestas que serão eleições de extrema relevância a nível interno e externo.
A maratona presidencial do próximo ano, teve já inscrições e dos candidatos até aos
dias de hoje, apresentam-se alguns inesperados, como é a candidatura de Ron
DeSantis, candidato do Partido Republicano e - ainda - Governador da Flórida, com
uma candidatura intimidativa contra Donald Trump, o seu velho amigo no Partido
Republicano.
Surgem entretanto, com a espuma dos dias, novos candidatos tais como, Tim Scott,
senador da Carolina do Sul desde 2013, Nikki Haley, antiga governadora da
Carolina do Sul e embaixadora dos EUA na ONU, Asa Hutchinson, antiga
governadora do Arkansas, Robert K. Júnior, sobrinho de JFK e um candidato
polémico devido às suas posições sobre a pandemia da Covid-19 e das vacinas.
Vão surgindo outros possíveis candidatos que se vão chegando à frente, nesta que
será uma maratona frenética e já com grande adesão.
No centro das atenções, está o regresso do duelo entre Biden e Trump, ainda que
considere que DeSantis veio desviar o foco destes já velhos conhecidos e querer
afirmar uma alternativa política. Aquilo que alguns parecem esquecer é que,
DeSantis nada mais é do que um discípulo tanto da imagem de Trump como das
suas atitudes e ações políticas.
Como a idade não perdoa e decorre da natureza da vida, tanto Biden como Trump
já vão tendo uma idade avançada e o fator idade para os americanos, é importante.
Até porque, o passar dos anos não traz só experiência mas igualmente limitações,
quer seja na falta de espírito crítico quer seja na diminuição desta, e parece-me que
não é isso que se pretende certamente de um Presidente de um país como os EUA.
A juntar a este fator, vão se gerando outros que considero igualmente importantes e
que podem colocar os candidatos numa melhor ou pior posição, mesmo sendo este
ainda o período de aquecimento e não da corrida.
No duelo entre os dois pesos-pesados da política americana, Biden e Trump, é possível retirar algumas ilações. No caso de Biden, o seu índice de popularidade tem sofrido um decréscimo, e este precisa de um discurso direcionado para os jovens e para aquela que é a sua base eleitoral, mas também para convencer aqueles que não tinham votado nele, conseguindo angariar assim mais votos a seu favor.
O panorama económico interno é uma pedra no sapato dos Democratas, principalmente de Joe Biden, e para justificar esta afirmação recorro a uma pesquisa recente feita pela McLaughlin & Associates, onde identifica que 65% dos eleitores acreditam que os EUA estão a ir na direção errada e 79% afirma ainda que as suas finanças foram duramente afetadas pelo estado atual da economia, recordando que o risco de recessão continua elevado, assim como o incumprimento (default) da dívida.
No caso de Trump, este não tem tido os melhores dias da sua vida pessoal e política, tudo devido aos casos polémicos em que se vê envolvido, sendo o mais mediático, o caso amoroso em 2016 com uma atriz de conteúdo adulto e de este, alegadamente, lhe comprar o silêncio no valor de 130.000 dólares. De ressalvar que, Donald Trump é o primeiro ex-presidente na história dos EUA a ser formalmente acusado pelo grande júri de Nova York. Igualmente importante, este está ainda a ser indiciado por outros crimes, como a interferência no processo eleitoral na Geórgia e ainda a incitação da invasão ao Capitólio. Sendo este, sempre, o maior responsável moral pelo triste acontecimento. Nada parece abalar a fé de Trump e as suas pretensões à Casa Branca. Mesmo que este continue a reiterar que tem sofrido uma “caça às bruxas” por parte dos tribunais e dos media, de forma a fazê-lo desistir e não prosseguir com a sua candidatura às eleições de 2024. Ainda assim, para alguém que vive dos media e dos holofotes, acredito que virará o mar a seu favor e navegará na onda de popularidade como sendo a vítima de uma perseguição, digna de um enredo de drama de Hollywood.
Antes de abordar a importância destas eleições para o futuro dos Estados Unidos da América e da sua posição na cena internacional, é preciso compreender quais as dinâmicas internas, destacando, a organicidade do sistema eleitoral americano e a transfiguração que daí será resultante. No sistema eleitoral americano, ao contrário do português, o sufrágio é indireto e cada um dos 50 estados tem um peso distinto, dependendo da variável população. E o sistema de governo é presidencialista, o que faz com que quem define a estratégia interna e externa do país, seja o presidente. As presidenciais são decididas pelo voto de 538 delegados de todo o país que formam o colégio eleitoral. O candidato que receber, no mínimo, 270 votos do colégio eleitoral, é o vencedor. Os delegados que formam o colégio eleitoral são escolhidos pelos partidos, antes da eleição presidencial, nas convenções dos próprios partidos (um pouco como acontece em Portugal para as eleições legislativas. Onde se verifica que, nos partidos predominantes e após eleições internas, geralmente o secretário-geral ou líder do partido, avança, ou tenta, como candidato às eleições e aquele que reunir mais votos, torna-se no primeiro-ministro).
Na prática, o povo americano não está a votar diretamente para o candidato a Presidente e sim para os delegados que os irão representar nesse estado. Depois destes se reunirem nas capitais estatais, votam para aquele que será o então Presidente.
Através de uma leitura analítica à realidade eleitoral dos 50 estados norte- americanos, é possível reunir quais os estados com mais delegados eleitos, os intermédios e os estados com menos delegados. O top 3 de estados que elegem mais delegados e que por conseguinte, tornam-se os mais significativos eleitoralmente, são eles, California (55), Texas (38) e Florida (29). Os estados considerados intermédios, registam-se, a Carolina do Norte (15), Geórgia (16) e Michigan (16). Por último, os estados que menos elegem delegados são, Alasca (3), Delaware (3) e Distrito de Columbia (3).
Os resultados das eleições de 2020, onde Joe Biden saiu vencedor, revelam que o Partido Democrata avançou nos grandes centros urbanos, como em Pennsylvania, Michigan e Wisconsin, enquanto que os Republicanos, reforçaram a maioria nas áreas rurais em Ohio, Iowa e Florida. Além desta análise, é ainda possível verificar que em 48 estados e no distrito de Columbia, o sistema aplicado é o famoso “winner-takes-all”, onde o candidato mais votado leva todos os delegados desse estado. O mesmo não se aplica em 2 estados, Maine e Nebraska, onde os delegados são atribuídos de forma proporcional, ou seja, derivam do resultado da votação.
O que altera este jogo, não são os estados que elegem menos delegados e sim aqueles que são denominados por “swing states”, que nada mais são estados que não mantêm uma tendência política fixa e que pregam surpresas (agradáveis ou desagradáveis) tanto aos candidatos como aos partidos.
Existem outros fatores a ter em conta, como por exemplo, o panorama interno, seja ele político, económico ou social, que nem sempre estarão a favor do Presidente eleito. Isto faz com que este esteja constantemente, ou à procura de fazer um bom mandato ou ser vítima do efeito inverso, isto é, não corresponder às expectativas e ser diretamente afetado pela instabilidade e crises profundas no país. Isto afetará não só a figura do Presidente como trará igualmente um impacto negativo ao partido e ao número de representantes no Congresso. E como a história já nos mostrou, nem sempre existem vitórias eternas, e o partido vencedor acabará sempre com uma perda de representantes no Congresso nas eleições intercalares.
Surgem ainda outros riscos internos elevados, como por exemplo, caso o resultado das eleições intercalares seja favorável ao partido opositor e este ter em suas mãos as duas câmaras, Senado e Câmara dos Representantes, instalar-se-á um grande impasse partidário, não haverá margem para a ação legislativa, haverá instabilidade e rupturas no governo, haverá pressão constante por parte do partido opositor em relação ao Presidente e à sua agenda política. De forma resumida, o Presidente eleito teria as asas cortadas pelo partido opositor e a mobilidade adormecida, ou seja, não teria asas para voar livremente e não teria membros suficientemente fortes para suportar tanto impacto a que estava sujeito.
Certamente não é isto que os norte-americanos desejam e muito menos, estarem a assistir que o seu país perde mais tempo com conflitos internos do que ter força e capacidade para manter o seu status de superpotência e hegemon na cena internacional.
Novos candidatos começam a colocar-se a postos e os veteranos, como é de costume, não gostam de ter os mais novos no mesmo patamar e muito menos, de perderem o seu lugar e prestígio eleitoral para estes. Ao longo desta reflexão, deixei explícito alguns dos fatores que demonstram a importância das eleições em 2024, pois será através destas que ficará visível o sentimento da sociedade norte-americana atual, ou seja, se optará por um projeto de continuidade ou de renovação política.
As eleições presidenciais norte-americanas, sempre nos acostumaram a um elevado número de candidatos, a realidade é que girará em torno de dois candidatos, isto é, se um terceiro não tiver força suficiente para se manter ao mesmo nível dos dois primeiros. Destacando, principalmente, a campanha “Let's finish the job” de Joe Biden, a de Donald Trump, “Make America Great Again” e a do seu amigo Ron DeSantis, “Great America Comeback”, um leve rebranding da de Trump.
Este artigo não terá conclusão, até porque além de todo o conhecimento ser efémero, deve ser sujeito ao teste de falsificabilidade tal como afirma Popper. E esta reflexão estará sempre preparada para isso mesmo.
A verdade é que a ordem internacional está em mutação, de forma gradual e permanente. Acompanhar cada processo desta mudança, torna-se imperativo e acima de tudo, devemos ter assente as lições de um passado recente, de forma a não cometer os mesmos erros.
Os Estados Unidos da América têm plena consciência da mudança no teatro internacional e do desenvolvimento de novos atores potenciais, como a Federação Russa e a República Popular da China. Os EUA reconhecem ainda, esta última, como a única adversária com pretensões reais de reformular a ordem internacional, e como não se ganha só com pretensões, é preciso meios que as sustentem. Não nos podemos esquecer de duas premissas, a primeira, é que o normativo internacional, assenta sobretudo, na tradição ocidental. A segunda, é que independente dos resultados, se uma presidência não estiver num bom estado, esta irá ser o espelho do país, ou vice-versa, dependendo do ângulo de observação.