O mercado financeiro é conhecido por seus altos e baixos, de elevação e retração de valores que nem sempre entendemos sua origem ou suas motivações. Vira e mexe, aparece uma notícia aqui ou ali dizendo que “empresa X perdeu Y% do seu valor”, isso quando não aparece nominalmente “empresa J perdeu K bilhões em valor de mercado”. Isso, em números, assusta; em gráficos, encanta. O encantamento ocorre, claro, quando não temos dinheiro ali envolvido e estamos apenas vendo o abrir e fechar a boca de um crocodilo adormecido, quando não sabemos se está para touro ou para urso. Ainda assim, muitos se arriscam a olhar o bailar dos gráficos, uma valsa de vai e vem que encanta, um sobe e desce de uma montanha-russa que não sabe onde quer chegar. Será que não sabe mesmo?
Sempre que me pego olhando e analisando os gráficos, me recuso a acreditar na crença dos grafistas de que o gráfico possui memória, de que existe uma mente ali, um ser divino, um tipo de DJ que controla a música dançada pelos candlesticks. Só que eu me recuso a acreditar que seja totalmente aleatório. Então, eu recuso os padrões, mas também recuso a ausência total deles. Olha só, temos uma dicotomia, um binário. Como diria o jornalista Reinaldo Azevedo, eu sou um “nem nem” do baile dos gráficos. Então, nesta minha coluna aqui na Meer, quero que você, meu leitor, possa compreender essa valsa, antes que se arrisque a dar seus primeiros passos nessa dança.
O gráfico de candlestick é formado a partir de algumas informações básicas: preço de abertura, preço de fechamento, mínima do dia e máxima do dia. Então, na leitura sabemos quanto valia aquele ativo, quanto ele passou a valer, qual foi o máximo que aceitaram pagar e qual foi o mínimo que alguém aceitou vender. Temos, numa única barra, emoções, esperanças, apostas e descontroles. Afinal, quem aceitou pagar a máxima do dia? Foi uma escolha racional? E quem vendeu pelo menor valor do dia, será que se arrependeu? E quem está lá no meio da barra, esperando o quê? Notem: muitas perguntas e nenhuma resposta. O corpo do candle é baseado nos quatro fatores mencionados, mas ele conta uma história sobre uma guerra; de um lado, havia pessoas querendo comprar aqueles ativos, e do outro, havia pessoas querendo vender.
Os compradores tinham apenas uma motivação: a de que aquele ativo iria subir, seja por estar barato para os fundamentalistas, seja por estar rompendo uma resistência para os grafistas. Os fundamentalistas acreditam que é possível comprar o valor de 10 unidades monetárias por 5 unidades monetárias, ou seja, eles acreditam que quem está vendendo não compreende o valor do bem que tem em mãos.
Os grafistas acreditam que a manada logo irá seguir algum estouro e correr para aquele ativo. Os vendedores possuem um universo mais restrito; uns estão vendendo porque acreditam que não irá crescer mais do que aquilo, outros porque, para o valor que compraram, a subida já foi suficiente, e outros porque irão migrar para um ativo com maior potencial. Então, veja: temos diferentes motivações racionais.
Não citamos ainda as irracionais — as apostas, o simples comprar e vender por comprar e vender. Todas essas motivações, ou a falta delas, movimentam o mercado. Quando as pessoas querem muito um ativo, ou várias pessoas disputam sua compra, o preço sobe, como em um leilão. Quando as pessoas querem muito vender aquele ativo, ou melhor, se livrar dele, é como em uma feira livre: o preço desce. O candlestick nos conta essa história, ele nos fala se naquele momento as forças estavam para touro ou para urso.
Eu, como um incrédulo, como um “nem nem”, entendo esses pormenores que movimentam o mercado. Acredito que agora você irá olhar aqueles gráficos e ver toda essa luta, essa esperança, esse desespero daqueles que participaram da história daquele candlestick. Agora, o mercado deixa de encantar, ele mostra seu lado mais feroz.
Toda essa ferocidade pode gerar alegrias para uns e tristezas para outros. Claro que, quem acertou a posição e lucrou vai buscar encontrar outro momento sublime como esse; provavelmente essa pessoa se autodenominará trader, day trader e afins. Aquele que foi pego pelo movimento contrário começará a repensar se deve vender ou segurar. A opção de vender pode estancar a sangria de ver seu ativo valendo cada vez menos. Outra opção é segurar e aguardar a volta daquela posição na valsa; ele falará para todos que pratica a filosofia buy and hold. Seja qual for sua escolha, ele irá olhar o gráfico novamente para buscar a próxima entrada; afinal, na próxima dará certo.
Então, o trader é uma pessoa carregada de técnica, seja gráfica, seja fundamentalista, e de esperança, pois ninguém consegue adivinhar ou prever o futuro. O trader, assim como um religioso, um militante político, acredita em sua causa e que ela está “mais correta” do que as demais. Nosso trader é uma pessoa de fé, muita fé.
Antes que você venha me criticar, saiba que sou um trader que acredita no gráfico (mesmo desconfiando) e no fundamentalismo (mesmo sabendo de seus contras). E, como todo trader que deseja sucesso nesse mercado, você precisa acertar mais do que errar. O grande segredo do trade — não o day; mas sim o swing trade — é você manter uma boa constância nos acertos e não deixar os erros te abalarem. Acertar ou errar são duas faces de uma mesma moeda, porém queremos ver mais uma delas do que a outra. Então, ao acertar, você precisa ser recompensado pelo risco corrido; ao errar, mitigar os prejuízos gerados. O ato de ganhar tem que compensar as perdas; o ato de perder não pode ser desenfreado.
O grande problema do trade hoje não é a atividade em si, mas a maneira como ela é vendida, ofertada ou ensinada. Os gurus, coachs ou como preferir chamar, vendem por aí setups, fórmulas mágicas, mentorias, robôs, IA de como realizar a atividade. Realizar a atividade não é ilegal, nem feio; ela só é perigosa. É como fornecer um caminhão para uma pessoa fazer frete, sem ensinar as regras de trânsito, sem realizar provas e afins. Alguns conseguirão êxito e farão dinheiro com os fretes; outros causarão apenas acidentes, mortes e afins.
Se você quer realizar uma atividade, primeiramente deverá conhecer os riscos envolvidos, as competências necessárias e, após uma profunda análise, deverá definir se a atividade é ou não indicada para você. O ato de dançar a música dos candlesticks não é para todo mundo: é preciso treino, estudo e sorte. Muita sorte!
O mercado financeiro é feroz, cheio de medo, desespero e pessoas que não sabem o que estão fazendo. Por outro lado, é cheio de graça, técnica e esperança. Antes de entrar no salão de dança, veja se está com os sapatos corretos e se está disposto a dançar no ritmo do mercado, pois aqui a gente só realiza os passos; quem irá escolher a música serão os candlesticks.