Tendo em conta o papel estratégico da língua portuguesa e da diversidade linguística e cultural, é inegável que, alicerçados nos verdadeiros valores da Lusofonia, podemos fomentar a evolução do projeto político de um mundo mais justo, mais democrático e com maior respeito pelas diferenças.
Será coerente denunciar as tendências da economia e das finanças na era da mundialização e aceitar, resignadamente, o uso de uma única língua da economia e das finanças? Será coerente denunciar a falta de democracia nas organizações internacionais e nas relações internacionais e, resignadamente, investigar, trabalhar e negociar em uma única língua, que uns dominarão sempre mais do que outros?
Porque recusamos a segregação linguística e o darwinismo cultural, já não estamos dispostos a confiar a um globish – uma atrofia conceptual – a missão de transmitir toda a complexidade e diversidade do pensamento através de uma parca lista de 1500 palavras. Devemos tornar-nos insurretos linguísticos, cientes de que, a par de outras línguas, a língua portuguesa pode afirmar-se como uma língua científica, técnica, económica, financeira, jurídica, e que tem vocação para ser uma língua de transmissão de conhecimentos e de produção de material de referência, uma língua profissionalizante, uma língua da sociedade da informação, uma língua de criação artística e cultural.
O português científico
Uma acção em prol do «português científico» só pode surtir algum efeito se for articulada e empreendida no âmbito de uma intervenção ponderada e resoluta a favor da projecção científica dos países lusófonos. Ora, para esses países, tal projecção implica um domínio quádruplo, tanto a nível do ensino, quanto da investigação: o domínio da transmissão do saber e dos conhecimentos, o domínio da sua capacidade criadora, o domínio da avaliação dos resultados, o domínio da respectiva difusão. É no domínio destas diversas vertentes que importa analisar como, e em que medida, o uso do português pode e deve desempenhar o papel de “língua científica”.
Talvez essa comunidade linguística venha a descobrir, progressivamente, o significado profundo que pode ter – tanto para a última, quanto para toda a comunidade científica – a preservação e o desenvolvimento de um pensamento científico que é procurado, desenvolvido, manifestado e transmitido recorrendo frequentemente à língua portuguesa. Descobrirá, então, que não deve ceder à tentação da uniformização que, em ciência, se afigura inebriante. Até em ciência é necessário proteger e fomentar as diversidades de pensamento, de concepções, de imaginário cultural e, nesse aspecto, nada as favorece tanto, quanto a diversidade linguística.
A possibilidade de contar com uma manifestação, em língua portuguesa, da ciência viva, original, de qualidade, sustentada pelas reflexões e pelos trabalhos da comunidade lusófona, estimulada pelas suas próprias necessidades, mas aberta à comunidade mundial e com ela articulada, seria a forma mais segura de evitar determinados monopólios. Uma utopia?... Um sonho inalcançável?… Juntamente com outras famílias linguísticas, a nossa missão consiste em mostrar as dificuldades inerentes a este repto, esclarecer os objectivos, revelar a magnitude dos meios necessários e aclarar as condições para a sua consecução. Face às suas dúvidas, estarão os nossos países e os nossos dirigentes disponíveis para superar o desafio?