Aprendemos na escola, desde pequenos, que o ciclo da vida é “nascer, crescer, se reproduzir e morrer”, mas cada vez mais pessoas recusam o terceiro item. O que antes se via como natural agora é encarado como um mandato social a ser questionado.

Antes, nos tempos de nossas avós, ter filhos não era somente algo normal, mas também algo sobre o qual não se decidia. Não havia métodos anticonceptivos eficazes e as mulheres eram economicamente e socialmente dependentes de seus maridos. Ele era quem decidia se manter relações sexuais ou não, se ter filhos ou não. Por isso elas – e as mulheres antes delas – tinham casamentos longos e muitos filhos: muitas vezes, muitos mais do que teriam escolhido ter, se pudessem.

Nos tempos das nossas mães, elas já podiam trabalhar sem precisar de consentimento do marido, tinham mais possibilidades de ter acesso a métodos anticonceptivos eficazes, e já não eram mais dependentes social e financeiramente dos homens.

Criar um filho se tornou muito mais caro, tanto financeiramente quanto no aumento do tempo dedicado ao trabalho. Por isso, tiveram menos filhos. Claro, estou falando de mulheres com um acesso privilegiado à educação, saúde e métodos anticonceptivos: uma realidade muito diferente é a das que carecem de tudo isso.

Nos tempos das nossas avós, elas se casavam ou iam para o convento; no das nossas mães, elas foram criadas ouvindo que casar e ter filhos é a melhor coisa que poderia acontecer na vida de uma mulher. Eu mesma, como millennial, também ouvi muito essa história.

A geração millennial começou a questionar mais fortemente essa “obrigação”. Foi e é a geração mais instruída, mas pior paga. Criar um filho era caríssimo e normalmente significava a retirada (temporária ou definitiva) da mãe do mercado de trabalho formal, e voltamos ao aspecto da dependência financeira. Significava uma dupla ou tripla jornada de trabalho, algo que nem todas estavam dispostas a aceitar. Mais ainda em países como o Brasil, onde as tarefas domésticas e de cuidado estão tão mal repartidas.

Então, mulheres e homens começaram a se perguntar: realmente ter filhos está nos meus planos?

Incrivelmente – ou não – as reações da sociedade quando mulheres e homens não querem ter filhos são completamente diferentes.

Homens são tratados normalmente ou até festejados por isso, mas mulheres são acusadas de egoístas e mal-amadas, ou até atacadas por pais e mães orgulhosos dos seus rebentos, tentando convencê-las a mudarem de ideia.

O capitalismo vive da maternidade compulsória. É um modelo que obriga as mulheres a produzir mais e mais mão de obra barata para sustentar o sistema.

O planeta está em crise climática e pode se tornar inóspito em pouco tempo. Muitas mulheres decidem não ter filhos também por isso, porque não querem condená-los ao sofrimento. Daí nasce o movimento childfree.

Childfree, em inglês, significa literalmente “livre de crianças”, ou seja, sem filhos por escolha. É diferente do conceito de childless (sem filhos, também em inglês), porque nem todas as pessoas que não têm filhos o são por escolha. Infertilidade e doenças, por exemplo, podem ser algumas das causas.

Lembrando que a vida reprodutiva (ou não) de uma pessoa não é da conta de ninguém. Infelizmente, nunca falta quem tente “meter a colher” onde não é chamado, e isso pode trazer efeitos nada desejados.

Millennials tiveram, em muitos casos, ainda menos filhos que seus pais, ou muitos nem tiveram filhos – por escolha.

A geração Z também enfrenta cada vez mais essa questão. Muitos integrantes dessa geração se preocupam com as mudanças climáticas e entendem que, em países com salários baixos e serviços essenciais caros ou de difícil acesso pelo sistema público, ter filhos ou não é um questionamento extremamente válido, e diria, inclusive, responsável. Não está fácil nem barato colocar e sustentar outra vida neste mundo, e o custo ambiental a pagar é muito alto.

Algumas mulheres, de diferentes idades, até dizem que o bicho-papão da infância – “ficar pra titia” e ter a casa cheia de gatos – soa a paraíso a estas alturas.