Num país onde a sua largura, ou seja, do litoral para o interior, é de aproximadamente de 220 quilómetros de distância (Foz do rio Neiva a Miranda do Douro), nem deveríamos ter em equação a existência de um contraste demográfico, social ou económico tão acentuado, mas bem o existe.
O interior de Portugal, tem sido ao longo dos anos, uma das regiões mais afetadas por desequilíbrios demográficos: por exemplo, o distrito de Bragança entre 1970 e 2021 perdeu cerca de 50 mil pessoas. Há também os desequilíbrios socioeconómicos, desde os tempos dos reis. Utilizavam-se as cartas de foral como medidas à adoção de políticas públicas direcionadas à revitalização e fixação de população para fins defensivos, ou simplesmente como local de refúgio a perseguições que aconteceram por toda a Europa, como foi o caso dos Judeus. Por outro lado, essas terras sempre foram de gente que emigra, com um familiar em França, Suíça, Alemanha, Brasil ou em outro lugar do mundo, sendo atualmente, em termos de proporção da população, o país da Europa com mais emigração e o 8º em todo o mundo.
Haverá no mundo uma terra mais pobre que esta?
Sim. Trás-os-Montes, em Portugal.
É possível que esta velha região histórica seja a mais atrasada da Europa civilizada, junto com as áreas mais remotas e ilhas da Grécia e o interior da Sardenha, Sicília, Jugoslávia...(Júlio Llamazares)
A atual escassez de empregos, a perda de população jovem para os grandes centros urbanos e a falta de transportes públicos (como o desmantelamento da linha ferroviária da Linha do Sabor, da Linha do Corgo e da Linha do Tua, por exemplo) são alguns dos grandes problemas do interior, apesar da qualidade de vida existente. O envelhecimento populacional agrava a situação local, e muitos jovens, em busca de melhores oportunidades de emprego e de educação, são obrigados a migrar. Este fenómeno não é recente, mas tem-se intensificado nas últimas décadas, com a globalização e o avanço da tecnologia que permite maior mobilidade e acesso à informação. Em algumas aldeias, as escolas e serviços de saúde são cada vez mais escassos, o que leva as famílias a procurar melhores condições de vida nas cidades.
Além disso, o interior de Portugal enfrenta uma constante luta contra o abandono rural. As casas que antes estavam cheias de vida, hoje estão desertas, com famílias que foram em busca de melhores condições e empregos. Isso resulta numa paisagem marcada pelo vazio e pela nostalgia de um tempo mais próspero. A falta de infraestruturas e de políticas públicas eficientes para atrair a juventude e incentivar a criação de novos empregos também são fatores que dificultam a revitalização desta região. Tal como na escola, onde o aluno que enfrenta mais dificuldades recebe mais apoio e medidas para alcançar o sucesso na aprendizagem, no caso do interior do país, apesar de algumas medidas, como o programa Territórios de Baixa Densidade e a melhoria da rede de estradas, estes ainda são insuficientes para inverter este ciclo.
É necessário um plano mais robusto e mais nacional, que envolva tanto a criação de novas empresas (diminuição de IRC) e oportunidades de emprego como um maior investimento nas infraestruturas digitais, que permitem o teletrabalho e, assim, a fixação de mais pessoas, a descida de IVA e IRS, como existe na Região Autónoma da Madeira, a aproximação ao país vizinho ser um fator de atração a nível industrial ou o apoio às já empresas instaladas no local. A revitalização do setor agrícola, a promoção do turismo sustentável e o apoio ao empreendedorismo local também são caminhos importantes para a renovação económica da região.
A agricultura é o setor com maior predominância nesse território, valorizando produtos como azeite, amêndoa, castanha ou o vinho. No entanto, este setor enfrenta desafios, como as alterações climáticas, a falta de modernização e a competitividade com outros mercados globais sendo o rendimento do produto muito volátil, por exemplo o garrafão de azeite (5 litros) num ano pode estar a 50 € e no ano seguinte a 20 €.
As festas do solstício, únicas em Portugal, com sua riqueza cultural e identitária, as paisagens maravilhosas além do Marão, acima de tudo, as pessoas, com seus sotaques únicos, incluindo a segunda língua oficial de Portugal, o Mirandês, e a sua gastronomia desde Trás-os-Montes até ao Alentejo são imperdíveis (posta mirandesa, alheira, feijoada à transmontana, cabrito assado, migas, entre outros), até estou a ficar com fome… são características que tornam a região especial.
Ainda assim, o desafio continua a ser encontrar formas de fazer a região prosperar, sem perder as suas tradições e identidade. O turismo de massa, se não for bem gerido, pode trazer consigo problemas de gentrificação e degradação ambiental como vemos nas grandes cidades europeias.
Neste sentido, é essencial que o governo central olhe para o território como uma parte integrante e não como paisagem, dinamizando e revitalizando as suas caraterísticas, aproveitando o seu local de raia com Espanha e apoiando-o.
O ciclo cada vez mais negro, menos pessoas, menos votos, menos interesse… urge alterar a situação, restar-nos-á (sempre) as memórias e histórias das aldeias e vilas cheias de vida.