Fala, jovem! Vamos começar hoje uma série de textos que falam sobre religião! Algumas análises, discussão de dados e por aí vamos.
Hoje vou apresentar para vocês um conto (polêmico) que gosto bastante sobre religião do tão odiado ou amado Machado de Assis.
O conto "Igreja do Diabo", de 1884, oferece uma perspectiva crítica e irônica sobre a natureza humana e as relações entre religião e moralidade.
Um resumo da obra
Na narrativa, o Diabo decide fundar sua própria religião, onde os adeptos seriam livres para praticar impiedades.
No entanto, a ironia central da obra reside no fato de que, mesmo sob essa nova doutrina, os seres humanos, em sua essência contraditória, acabam por agir de maneira benevolente.
Essa crítica à hipocrisia e à ambivalência da natureza humana é uma das chaves para entender o contexto social e cultural do Brasil do século XIX.
Crítica à hipocrisia e contradição humana
O Diabo, personagem central, é apresentado com uma eloquência irônica, refletindo características humanas que incluem a ambição, a manipulação e o poder.
Sua proposta de criar uma religião é descrita como uma reação ao "caos" existente, prometendo aos fiéis uma experiência de liberdade que, paradoxalmente, leva à contradição.
A ideia de que os humanos, ao se libertarem de uma moralidade tradicional, possam agir mal, apenas para descobrir sua inclinação ao bem, destaca uma crítica profunda à hipocrisia presente na sociedade.
A narrativa reflete um entendimento de que a natureza humana não é tão simples quanto a dicotomia entre bem e mal sugere.
Ao tentar cortar a bondade e solidão da vida cotidiana, a doutrina proposta pelo Diabo revela-se incapaz de extinguir o que é inerente à condição humana: a necessidade de valores que orientem o comportamento.
Esse conflito entre a ideologia do Diabo e as ações dos humanos ilustra a complexidade da moralidade e das crenças, uma questão que ressoa na crítica à sociedade brasileira da época, marcada por profundas transformações sociais e políticas.
Relação cômica entre religião e natureza do homem
Machado de Assis utiliza a comédia como uma ferramenta para explorar a relação entre religião e a natureza humana. O Diabo, com suas promessas de liberdade e prazeres mundanos, acaba se revelando um verdadeiro charlatão.
As promessas de uma missa com "vinho e pão à farta" e todo o aparato eclesiástico familiar são uma paródia das instituições religiosas tradicionais.
Esse tom cômico provoca uma reflexão sobre a manipulação das ideologias religiosas e como elas podem ser utilizadas para controlar a massa, ao mesmo tempo em que expõe a fragilidade da condição humana diante dessas imposições. O diálogo entre Deus e o Diabo também serve para enfatizar essa relação irônica. O Diabo, em seu papel subversivo, propõe uma nova ordem que, ao invés de libertar os indivíduos, revela suas contradições mais profundas.
Esse aspecto do conto remete a questões mais amplas sobre como as ideologias se estabelecem e como os indivíduos se comportam diante delas.
O ser humano, em sua busca por sentido e direção, acaba se sujeitando a doutrinas, mesmo que estas sejam enganosas.
Contexto social e cultural
A obra de Machado de Assis deve ser entendida no contexto da monarquia brasileira em decadência, onde novas ideias republicanas começavam a circular.
A crítica ao catolicismo e às instituições tradicionais reflete a busca por uma identidade nacional que se distancie dos padrões europeus.
Antônio Cândido, em Literatura e Sociedade, argumenta que a literatura brasileira deve ser vista como um reflexo das tensões sociais e culturais do período.
A crítica de Assis à religião não é apenas uma questão de moralidade, mas também uma discussão sobre a formação da identidade nacional e a resistência a imposições culturais.
Por outro lado, Silviano Santiago aponta que a produção cultural brasileira é muitas vezes uma resposta ao "reboque" da classe dominante, que impõe suas próprias ideologias e valores.
O Diabo, como figura subversiva, simboliza a resistência a essa imposição, mas também revela a fragilidade das ideologias que emergem nesse contexto.
Ao mesmo tempo, o texto de Assis expõe como a cultura brasileira está em constante diálogo com influências externas, refletindo uma realidade de dependência e a busca por uma autonomia cultural.
Para fechar
"Igreja do Diabo" é mais do que uma simples história sobre a fundação de uma religião; é uma crítica profunda à natureza humana, à hipocrisia e à ambivalência das ideologias.
Através do humor e da ironia, Machado de Assis desafia o leitor a refletir sobre a complexidade da moralidade e a necessidade intrínseca de doutrinas que orientem o comportamento humano.
A obra ressoa com as preocupações sociais e culturais de sua época, ao mesmo tempo em que estabelece um diálogo com temas universais, como a religião e a condição humana.
Em suma, a narrativa não apenas diverte, mas provoca uma reflexão crítica sobre o papel da religião na vida dos indivíduos e na formação da identidade nacional.
O Diabo, ao tentar manipular a moralidade, acaba por expor a verdade fundamental da natureza humana: a impossibilidade de escapar de sua própria essência contraditória.
Assim, "Igreja do Diabo" se torna uma obra atemporal, que continua a ressoar nas discussões contemporâneas sobre moralidade, liberdade e a busca por sentido em um mundo em constante transformação.
Relaxa que meu próximo texto é mais teórico! Esse foi só para descontrair.
Na próxima coluna vou abordar o que são religiões, de onde surgem e fazer um panorama geral do assunto no Brasil e no Mundo!
Fique com Deus, Alá, ou Exú, Ciência ou aquele(a) que você acredita.
Você que decide...
Até a próxima!