Essa discussão de tornar o Brasil semipresidencialista costuma surgir no momento mais agudo das crises institucionais da nossa república e por oportunismo de políticos brasileiros com interesse de esconder as pautas que realmente lhes interessam, voltadas ao afrouxamento do enfrentamento à corrupção e a outras pautas que agradariam suas bases e seus interesses particulares.
Mas esse debate é muito interessante e é um dos pontos mais nevrálgicos das discussões de reforma política. Por que deve ser pensado assim? Justamente porque o sistema presidencialista é um dos principais vetores de crises e um dos principais problemas do sistema político brasileiro.
O presidencialismo de coalizão brasileiro fracassou muito na ideia de promover uma figura hiperpoderosa para a sociedade, o presidente. O presidente tem uma grande quantidade de poder no executivo e, com essa quantidade, acaba cometendo erros muito grandes e deixando um passivo político e econômico muito alto para os governos posteriores, gerando mais crises. Na cabeça de muitas pessoas, vai surgir a seguinte ideia: o brasileiro tem de aprender a votar melhor. Sim, isso se faz necessário com medidas junto à educação. Mas percebe-se também que uma figura com muitos poderes em Brasília não tem sido saudável para o Brasil e não tem sido saudável para um povo intuitivo e muito afetivo, como dizia Roberto Campos no prefácio do livro Psicologia do Subdesenvolvimento de Meira Penna.
Outro grave ponto da falência do presidencialismo de coalizão está na fraqueza das coalizões desse sistema de governo. As pessoas vão pensar duas situações: isso não faz parte do histórico da política brasileira ser muito instável e não faz parte da natureza frágil das coalizões pautadas em clientelismo de grupos políticos como Centrão e PSD/MDB. Isso está relacionado também, sendo necessário mudar a natureza desses acordos de forma gradual e cuidadosa por novos políticos, que possam surgir no futuro.
É necessário até atacar isso em outros pontos da reforma política. Mas, em parte, tem envolvimento do presidencialismo de coalizão, uma vez que ele não cria um chefe de governo ligado ao Parlamento, não cria um compromisso mais forte do parlamento com acordos políticos e a agenda do governo eleito, e não abre espaço para a participação de outras forças políticas no executivo. Fazendo com que Executivo e Legislativo se dissociem muito, sendo necessário uma quantidade gigantesca de acordos para conseguir aprovação de matérias de interesse do governo eleito.
Sendo que, no semipresidencialismo, toda a articulação é feita no início do mandato com o primeiro-ministro e o parlamento, obrigando o executivo a cumprir a maioria dos acordos logo no início para não ser retirado da posição por uma moção de censura e para que seja garantida a confiança do governo escolhido, restando apenas alguns acertos ao longo do caminho.
Outro grande problema do presidencialismo de coalizão brasileiro é a falta de alguma instituição para conter as crises agudas ao longo do mandato do presidente da república. Uma vez que ficou provado que as últimas escolhas da população brasileira conduziram para uma quantidade excessiva de crises institucionais, muitas delas criadas pelo ocupante do executivo de ocasião. Ou seja, o próprio presidente seria um freio de arrumação para essas crises agudas, se tornando uma espécie de quinto poder da república e contendo certos excessos do primeiro-ministro de ocasião.
Portanto, observo claramente que fracassou a ideia de ter um presidencialismo de coalizão no Brasil. Muito porque a população faz escolhas completamente pautadas pelo afeto e pela intuição, fazendo com que as crises institucionais mais agudas sejam muito frequentes, gerando incerteza e atraso para um país com um excesso de problemas socioeconômicos. Apesar dessa necessidade de fazer alteração de uma das muitas implantações que deram errado no Brasil, se faz necessário, neste artigo, deixar a seguinte dúvida: os políticos obcecados pelo poder renunciariam ao enorme poder desse cargo para seguir o caminho da França e de Portugal?