Curiosamente, ao contrário do que tem acontecido, hoje, não venho para “reclamar” de algo. Hoje venho aqui constatar factos. Não sei se é só de mim, mas tenho vindo a reparar que a sociedade em geral anda a passar por uma crise de identidade no que toca aos valores.
No tempo dos meus pais e dos meus avós, bastava um aperto de mão ou uma conversa para um acordo ficar selado e a partir desse momento, já não havia volta atrás. Corresse bem ou corressem mal o remédio era aceitar as consequências e seguir com a vida. Hoje dá-me a impressão de que isso não acontece. Nem mesmo com a assinatura de um documento que comprova que a pessoa que o assinou se comprometia a fazer “x” ou “y”.
Hoje dá-me a estranha impressão de que o compromisso é algo que as pessoas fogem como o Diabo foge da cruz, desculpem a expressão. Tudo é descartável, até mesmos as pessoas com quem convivemos no nosso dia a dia. Tal como o compromisso parece ter sido banido da nossa sociedade, o mesmo parece ter acontecido com o respeito pelo outro. Por um motivo fútil partimos para o insulto, para a violência em vez de nos sentarmos e conversarmos sobre o que nos martiriza a paciência. Será justo para as gerações que se estão agora criar e para as que hão de vir viverem com esta falta de valores e arrogância que estamos a perpetuar em relação ao outro?
Ouvimos muitas vezes dizer que temos de criar um mundo melhor para as gerações futuras, mas de nada adianta melhorar a política do mundo ou ter a melhor economia, se faltar o mais importante: o respeito e civismo entre os cidadãos. Para alguma coisa deveriam servir os milhões de anos de evolução de que o Homem foi alvo ao longo dos tempos, foi para evoluir e tornar-se, dentro do espectável, um ser melhor, mais compreensivo e respeitoso. Contudo, a cada ano que passa parece que o ser humano tem cada vez menos isso em conta.
Quem fala em crise de valores na sociedade, o mesmo será dizer que também as profissões estão a carecer nos seus valores. Atualmente, as empresas no processo de recrutamento dão a conhecer aos possíveis colaboradores a ideia de que o importante são as pessoas e de que dentro da empresa são uma família, onde todos têm de vestir a camisola. O problema está quando atrás desse aparente conceito de família nada mais importa do que atingir os objetivos da mesma e gerar lucros, mesmo que os fins não justifiquem os meios.
O exemplo que tenho mais concreto deste tipo de atuação é o jornalismo. Ao longo da licenciatura foram poucos os professores que romantizaram a profissão, apesar de nós alunos o fazermos, se calhar por acharmos que os adultos têm uma visão muito pessimista das coisas. Ao contrário deles, por norma os jovens costumam ver sempre o lado positivo das coisas, por mais tenebroso que a situação seja.
Nesse seguimento, considero que também o jornalismo atravessa uma crise de valores, além das muitas outras que atravessa. No passado, o jornalismo tinha o propósito de servir a comunidade dando-lhe informação fiável e credível, apesar de também ter o objetivo de gerar dinheiro, assim como todos os negócios. No entanto, hoje vejo que o jornalismo não é uma paixão, muito menos um meio de a população obter informação fidedigna, mas sim gerar cliques nas redes, valores astronómicos de audiências e, consequentemente, milhões de dinheiro. E como é que se consegue isto? Muitas vezes com sensacionalismo e desrespeito pelo outro.
Nem tudo justifica os meios, nem nas relações pessoais nem nas profissionais, muito menos, se para isso colocarmos em causa os valores que nos incutiram. Tanto nas relações pessoais como nas profissionais, de que nos adianta desrespeitarmos o próximo? Podemos até ganhar vantagem em relação ao outro, pensamos nós, mas no fim do dia quem terá a consciência pesada seremos nós. Além de que o karma tarda, mas não falha e um dia qualquer vai ajustar contas connosco.