Atolados, soberbos, cheios, esfomeados, talvez sejam as palavras que mais se enquadram no século que estamos a vivenciar, ou pelo menos, nas décadas que se enquadram neste pequeno grande século. Estamos esfomeados por conhecimento, mas cada vez mais sentimos ser difícil criar, estará já tudo criado? Sem sombra de dúvida que não.

Mas claramente que sentimos o tempo cada vez mais apertado, mais completo, tanto mais. Criar torna se difícil, pensar talvez ainda mais, é natural se pegar no que existe, e transformar? Não. Mas serão sempre fontes de inspiração para gerações futuras. Completamente positivo.

Torna-se extremamente preocupante o que estamos a viver de momento. E com tantas outras coisas prioritárias que se estão a passar, a cultura fica um pouco de parte, e converte se num entretém nato. Mais uma vez.

O problema, é claro. E efetivamente, há sempre um problema, se não, nunca surgiriam as questões e as soluções, é que na verdade, não temos imaginação. Não pensamos. Forçamo-nos a criar robôs e melhorar a nossa vida que não nos demos conta de que os robôs somos nós. Máquinas, rítmicas e semânticas. Aptas a um trabalho e nada mais, fazemos o mesmo inúmeras vezes por dia, sem efetivamente nos apercebermos do que efetivamente estamos a fazer.

E como não pensamos idealizamos, e não nos damos conta de que apenas idealizamos o que já existe, convertemos pequenos contos e pequenos filmes em enormes filmes que já existem, a história não é nova, as personagens também não, mas efetivamente são corpos diferentes. Afinal muitas gerações passaram de um aos outros. E confrontamo-nos com um conformismo ridículo, com um está tudo bem e porquê pensar mais nisso?

Porque estamos cada vez mais inconsistentes, mais fracos de espírito e maquinizados. Ora acordar a mesma hora repetir o mesmo ritual todos os dias, e dormir. Amanhã seremos diferentes? Não, amanhã, tudo será igual, e a cultura assim bloqueou. Serão mais um par de anos, se tudo correr bem, iguais, paralelos e sem distinção, e quando damos conta, mais um Natal, mais uma passagem de ano.

Grandes estreias, mas apenas com melhor qualidade e som incrível. Com alta resolução e efeitos especiais fora de série. Mas o conteúdo? Esse já existia. Será um orgulho para as mentes criadoras? Ou um culminar do esquecimento das maiores peças? Afinal só os amantes e verdadeiros apaixonados irão dar preferência aos primórdios, a maioria prioriza a qualidade da performance ao invés da qualidade da criação.

Adaptações, dizemos a nós mesmos. É para perdurar, para educar e ensinar as novas gerações. Contamos a nós mesmos. Memórias, pensamos.

Não. Grande não.

Apenas desculpas para perdoar o imperdoável e o problema que vivemos, a falta de imaginação.

Não sabemos criar porque encaramos gerações complexas onde parece e paira o sentimento de estar tudo feito. Onde o “comercial” é um problema musical, por vezes pouco entendido. O “comercial” torna tudo uniforme e todos gostamos do mesmo. Mas se todos gostarem apenas de arroz, nunca ninguém jamais comerá massa.

Ou a necessidade de afirmação nas criações antigas e não na época contemporânea. Qual é a piada de alterar protagonistas por afirmação? Quando poderemos manter os clássicos e criar futuros clássicos.

Mas Calvino questionava, o que é um clássico?

Grave.

Atolados, repito. Não há forma de descrever a mente humana neste momento. Incapaz de pensar, incapaz de gerar fusão, pois a preocupação parte por um molde semelhante ao que temos, quando recorremos à famosa IA. Só pode processar dados do que aconteceu, não pode criar algo. E estamos iguais, também não pensamos para lá da data de hoje.

Triste para quem produz cultura ter de adaptar e deixar de pensar. Afinal, pensar para quê?

Estamos perante as imitações.

Os grandes pensadores da história não poderiam compreender esta forma de pensar, porque aplicamos a sofística como molde de criação, arte de bem falar a uma arte de bem criar.