Cresci nos anos 90 e sempre fui de uma forma ou outra apaixonado por música. A tendência para a música pesada e/ou alternativa estabeleceu-se cedo, com a tendência emergente do punk rock californiano de bandas como os The Offspring, cujo álbum S.M.A.S.H. continua a ser o lançamento mais vendido de sempre por uma editora independente (a lendária Epitaph Records).
A meados da década que originou estilos musicais como o pop punk, o grunge e o gangster rap, esses mesmos estilos começaram a confluir e a ser eclipsados por uma nova tendência, que chegou verdadeiramente ao topo do mundo da música. O estilo acabou por ser apelidado de nu metal, derivado do termo "new metal" e maior parte das vezes usado como perjurativo. Tratavam-se de bandas como os Korn, os Deftones e os Coal Chamber, aos quais se juntaram mais tarde nomes como os Limp Bizkit, os System Of A Down e os Linkin Park, entre muitos outros.
O próprio nome nu metal nunca tinha até ao atual momento reunido consensos, e ao longo das últimas duas décadas vi cada uma das bandas que mencionei e muitas outras a mudar de ideias sobre o termo: ora rejeitavam ser nu metal ora se orgulhavam e adotavam o termo. Não estou a criticar ninguém, eu pessoalmente também sou culpado de inconsistência na forma como me relacionei com o estilo ao longo dos anos, especialmente a partir de 2003/2004, altura em que o estilo teve uma quebra vertiginosa de popularidade, por razões que ainda hoje são debatidas.
Mas vivi certamente o momento, e entre 2000 e 2003 tive a oportunidade não só de assistir a espetáculos que com o passar dos anos se tornaram históricos como ainda de conhecer alguns dos meus ídolos de adolescência, experiências que certamente tiveram peso quando optei por seguir o jornalismo como carreira. Nos meus anos de secundário cheguei a ser o coordenador da rádio da minha escola, e numa era em que as rádios tradicionais já deixavam de chegar a estas audiências, fiz a minha parte por imortalizar faixas como "Freak On A Leash", "Last Resort", "Wait And Bleed", "Chop Suey" e muitas outras.
E tive o privilégio de conhecer, ainda enquanto menor, diversos artistas não apenas como ídolos mas como seres humanos, uma experiência que me enriqueceu tremendamente. Em 2002, por exemplo, ganhei um meet & greet com a formação original dos Disturbed, de quem ainda guardo os autógrafos. Em 2003 conheci Corey Taylor, vocalista dos Slipknot e um dos maiores embaixadores da música pesada da sua geração, aquando da primeira visita dos Stone Sour a Portugal, no palco do antigo (e para alguns lendário) Paradise Garage. Neste local tive a oportunidade de conhecer várias outras bandas, desde os Ill Niño aos Killswitch Engage, já no momento em que o nu metal foi suplantado pelo metalcore.
É raro um movimento musical desvanecer de uma forma tão rápida quanto o nu metal, mas chegando a 2003/2004, faltou por completo o fôlego ao estilo que deu por si desprezado pelos elitistas do underground e ignorado pelo mainstream, que já tinha dele retirado os lucros necessários e seguido para outra.
Vejo com muito bons olhos o revivalismo que atualmente se vive, em que o nu metal e a sua estética são hoje mais valorizados do que alguma vez foram, e vemos traços do estilo presentes um pouco por todo o espectro da música pesada ou alternativa, cumprindo assim a promessa de hibridização com a sonoridade e cultura do hip-hop que fazia originalmente parte deste movimento.
É difícil dizer quando é que a moeda mudou de face, e o estilo passou de desprezado a incrivelmente popular, mas a certa altura era inegável. Estas influências podem atualmente ser discernidas no deathcore de bandas como os Emmure, os Atilla ou os Alpha Wolf, no metalcore de apelo massificado como o dos Bring Me The Horizon ou dos Architects, ou nas sonoridades do espectro trap metal que surgiram na década passada, inicialmente em plataformas como o Soundcloud e agora representado por artistas como Zillakami, Scarlxrd ou Ghostmane assim como grupos como $uicideboy$, Fever 333 ou Dropout Kings.
Esta mistura de géneros sempre esteve na origem da popularidade do nu metal, mas eu defenderia que isso foi parte do que fez com que o movimento tivesse um fim tão ignominioso. O abismo cultural que existia entre o universo do rock e metal e o do hip-hop levou muitos fãs e até muitos artistas a "escolher um lado", e daí eu já ter lido há anos entrevistas de todas as bandas que este ano fizeram tour pelos EUA com o festival Sick New World, onde na altura falavam mal ou se tentavam distanciar dessa alcunha - nu metal. Mas sabemos bem que a música a este nível de popularidade é acima de tudo um negócio, e não aproveitar este momento de redescobrimento do estilo seria quase criminoso.
E desta vez, sendo que já não existe mainstream a ser conquistado, também já não existem gatekeepers tradicionais para estigmatizar da mesma forma o género musical. Aliás, num contexto musical e cultural em que categorizar estritamente estilos musicais é cada vez mais difícil e anacrónico, codificar identidades pessoais baseadas nas bandas ou artistas que ouvimos parece ser cada vez mais uma coisa do tempo dos nossos pais.
E estamos mais uma vez perante a passagem de testemunho, em que são os mais novos a revitalizar tendências que a geração anterior deixou cair. Quanto mais as coisas mudam, mais elas ficam na mesma.
Deixo um video do Show do Slipknot no Rockstar Mayhem Festival, em Nova Iorque (2008).