Um dia quando cheguei em uma das escolas que trabalhei, me deparei com um pai na secretaria exigindo falar com a diretora. O pai estava fora de controle, surtado, desesperado para ser atendido por algum responsável pelos alunos, porque a filha de doze anos estava sofrendo bullying durante o recreio. E para piorar, bem neste dia, nem a diretora e nem a coordenadora estavam presentes na instituição.
Antes que o pai tivesse um chilique, eu o convidei para ir até uma sala para conversarmos melhor, servi um copo de água, convidei-o a sentar e pedi que me explicasse toda situação pacientemente. Ele me relatou alguns abusos que a filha andava sofrendo, que ela estava sendo ofendida de “gorda”, “elefante” e “rolha de poço”, e ás vezes até mesmo sendo agredida por alguns colegas.
Quando ele acabou de falar eu olhei bem no fundo dos olhos dele e disse que não iria enrolá-lo e que iria mandar a real. E a real era que nem a diretora, nem a polícia, e nem mesmo ele próprio poderia fazer algo pela filha, porque infelizmente, nós vivemos em um país onde a maioria das pessoas não tem educação, e consequentemente, não educam seus filhos. Somente ela mesma poderia fazer por si própria, porque mesmo com a jovem idade, é na escola que começam nossos primeiros aprendizados. É na escola que aprendemos a superar nossas primeiras dificuldades, a transpor nossos primeiros problemas, porque isso faz parte da vida. Você pode se lamentar e se queixar pelo resto de sua existência para as pessoas ao seu redor pensando que o mundo é injusto somente com você, ou você pode ir lá e resolver o problema definitivamente, contribuindo para sua própria evolução.
Orientado por mim o pai colocou a filha para fazer aulas de taekwondo e boxe. E em menos de quatro meses nunca mais ela chegou em casa reclamando do abuso que vinha sofrendo por parte dos colegas.
Primeiro, porque aprendera a se defender fisicamente e a doutrinar sua mente. Depois disso, a autoestima dela aumentou melhorando o rendimento escolar e contribuindo para a diminuição do sobrepeso corporal. Com o tempo, o próprio pai começou a fazer aulas junto com a filha, aproximando-os e melhorando a relação familiar entre os dois.
Quando relato esta estória em alguns congressos, seminários e palestras sobre educação, ou até mesmo nas salas de aula para tentar enriquecer o conhecimento dos colegas de mestrado e doutorado, geralmente a maioria dos que escutam tem a tendência de primeiro rir pensando tratar-se de uma brincadeira. Porém, quando percebem que estou falando sério mudam suas expressões faciais e acabam me reprimindo alegando que a minha atitude foi (e é) inadequada.
Entretanto, não é preciso que eu faça uma pesquisa minuciosa ou escreva um artigo científico bastando apenas um breve momento de questionamentos para descobrir no público ouvinte, que as pessoas que riem ou que consideram a minha atitude inadequada são aquelas mesmas pessoas que quando jovens nunca sofreram bullying na escola ou na faculdade. Porque as pessoas que sofreram bullying pertencem a um grupo específico de minorias no mundo. Isso é a mesma coisa que você perguntar para um indivíduo que teve a mãe e a esposa violentada por algum criminoso se ele ou ela são a favor dos direitos humanos nas prisões.
As pessoas que não passaram por uma determinada situação, apesar de se acharem aptas a julgarem, no fundo, não compreendem aquilo que os oprimidos viveram na íntegra, e qual seu real desejo para com os opressores.
Eu não sou a favor do bullying. Eu seria um péssimo agente da educação se afirmasse isso. Entretanto, eu gostaria que as pessoas compreendessem que o bullying sempre existiu e sempre existirá na sociedade, porque ele faz parte da necessidade de crescimento e da evolução do indivíduo. Eu mesmo sofri muito bullying na escola por parte dos colegas “mais legais” e “mais fortes” por ser um nerd e obeso, e sei o quanto é desagradável passar por isso. Porém não morri, não me tornei um inválido, tampouco um marginal traumatizado. Pelo contrário, isso apenas me fortaleceu. Hoje em dia continuo sendo nerd, não sou mais obeso, e atingi uma posição moral e profissional superior em relação aqueles que cometiam bullying comigo.
Caso o meu ponto de vista não esteja sendo apoiado em alguma referência científica, pesquise pelas biografias de grandes nomes como Bill Gates, Steven Spielberg e Paulo Coelho. Eles também sofreram bullying na escola, e utilizaram disso para se fortalecerem e mostrar para os opressores quem era melhor na dança da vida. Você ou o seu filho podem sofrer bullying por parte dos outros, mas só depende de vocês próprios decidirem se ficarão em um canto acuados lamentando as injustiças do mundo, ou se melhorarão seu estilo de vida e superarão aqueles que lhes fazem mal, mostrando a força interior e desenvolvendo a supremacia do seu espírito sobre o seu corpo.
Nós passamos por momentos difíceis na nossa vida, e é natural desejarmos que nossos filhos não passem pelos mesmos traumas ou pelas péssimas situações que vivenciamos. Entretanto, esquecemos que foram estas experiências ruins que nos tornaram o que somos hoje. Foram as más experiências que nos fortaleceram e nos ensinaram como a vida funciona. Se privarmos nossos filhos disto, estaremos privando-os de amadurecerem por si próprios e, consequentemente, de viverem suas próprias experiências.