Um dos maiores inimigos do homem é inerente a ele, é seu instinto. Condenado pelos sistemas religioso e secular, é vista como uma atitude infausta, uma eficiente pedra de tropeço e a própria condenação espiritual do homem: a soberba.
Somos soberbos e não nos damos conta, ou nunca admitimos. À luz da Bíblia estamos todos contaminados pelo orgulho. De acordo com o escritor italiano Dante Alighieri, em sua obra A Divina Comédia, os orgulhosos estão no ponto mais distante de Deus. Culturas antigas como a greco-romana, desde os primórdios dos tempos, consideram o orgulho uma doença da alma. O tempo passou, mas o orgulho do homem permanece nele. Somos, por excelência, aqueles cheios de si. E junto de toda essa nossa empáfia existencial, carregamos outros males intrínsecos a ela. É por esta soberba que nos corrompemos com mentiras, enganações, invejas, obsessões – violando não somente o bom sendo e justiça na convivência dentro da sociedade, mas também os mandamentos de Deus, segundo a doutrina cristã. O impacto da soberba no mundo pode ser verificado em toda a história da humanidade, desde muito antes de Cristo, passando por iniquidades e negligências sociais, Segunda Grande Guerra, até os dias de hoje.
De acordo com o cristianismo, a humildade de espírito é uma virtude que é a base para toda ação e argumento. Tal admoestação contra a soberba é encontrada em toda a Bíblia, de Gêneses a Apocalipse, e intensamente condenada. Em Provérbios está escrito: “A soberba precede a ruína, e a altivez do espírito, a queda”. A 1ª Epístola de João adverte que a soberba da vida é semente de todo o pecado. Na visão cristã, a soberba faz com que o homem busque incessantemente a própria satisfação, sem nenhum temor ou discernimento, numa filosofia de vida humanista e autossuficiente – a qual valoriza o homem que independe da misericórdia e graça de Deus. É a criação que veio do pó, vangloriando-se perante o seu Criador.
A censura à soberba sempre teve um lugar de destaque nas doutrinas das Igrejas que professam a fé cristã. Tanto a Católica quanto a Protestante, assim como as Neopentecostais. No entanto, foi a Igreja Católica que a colocou no alto de uma lista que chamou de “os pecados capitais”, os passíveis de condenação. Entrementes, esta lista não consta na Bíblia como “pecados capitais”. Sabe-se que surgiu por volta do ano 375 e foi atribuída a um monge grego, Evágrio Pôntico. Ele teria listado o que considerava oito doenças espirituais. Mais tarde, no ano 590, o Papa Gregório I incorporou a lista à doutrina católica, sob o título de Os Pecados Capitais, além de reduzi-la para sete. Mas no século XIII, São Tomás de Aquino a modificou novamente, de acordo com o que considerava mais grave, deixando-a como conhecemos hoje: Gula, Avareza, Luxúria, Ira, Inveja, Preguiça e Soberba (ou Vaidade).
No topo da lista católica – que dividiu os pecados em dois grupos – para muitos teólogos e estudiosos das Escrituras, está a soberba como sendo o pilar de toda a transgressão do homem. Isso porque a soberba é considerada como o pecado original, uma vez que existia muito antes do homem e da criação. Uma linha teórica cristã acredita que Satanás, o anjo caído, se corrompeu em soberba. O Livro de Isaías, por exemplo, relata a queda do anjo: “Derrubada está na cova a tua soberba (...) serás precipitado para o reino dos mortos, no mais profundo abismo”. No entanto, alguns teólogos rejeitam essas passagens bíblicas por não acreditarem que se referem a tal fato. E por isso, para eles, a soberba surgiu com o homem.
Além do cristianismo, o judaísmo e o islamismo também atribuíram à soberba vários conceitos como semente do mal, destruidora dos homens, maldição e queda do espírito, ruína e crimes da alma, praga maldita, paixões da carne, etc. No poema de Dante Alighieri, A Divina Comédia – o purgatório principal é composto por sete círculos, os quais representam os sete pecados capitais. No primeiro círculo encontram-se os “orgulhosos” (ou os soberbos), e os aponta como os que mais se distanciam de Deus, já que ali se encontra o alicerce para uma vida de pecado. A penitência para eles é o exercício da humildade.
A soberba é manifestada em nós o tempo todo. E faz sentido quando pensamos em nosso egocentrismo, ou em nossa vaidade e ambição exasperada, ou em nossa necessidade de grandeza e valorização. E em como batemos orgulhosos no peito bradando o próprio nome, com espírito altivo. Somos melhores que todos os outros, merecemos mais. Exigimos respeito, exigimos reconhecimento, queremos poder, queremos status, queremos atenção para o que consideramos ser a mais maravilhosa criação dos céus: nós mesmos. Triste verdade para nós, grave pecado segundo o cristianismo. Pura soberba. Tudo vaidade – como já dizia o sábio Rei Salomão. Contudo, temos já garantido um canto no primeiro círculo de Dante.