A fotografia captura emoções de uma maneira única. Ela não apenas preserva momentos, mas também registra sentimentos e atmosferas que permeiam instantes fugazes. A magia da fotografia nos desperta nostalgias, alegrias, saudades, desejos, conhecimentos.

A fotografia histórica, por exemplo, é mais do que um registro do passado; é uma narrativa visual que documenta momentos, personagens e lugares que moldaram a História. Desde seu surgimento no século XIX até os dias atuais, a fotografia histórica desempenha um papel crucial na preservação da memória coletiva e na compreensão das transformações ao longo do tempo.

Cada fotografia é como uma cápsula do tempo, capturando momentos que podem ter sido decisivos para o curso da História ou simplesmente representativos de uma época específica.

Foi desta forma que vi as fotografias do alemão Augusto Riedel pela primeira vez, como uma mágica viagem no tempo por Minas Gerais do século XIX. A técnica fotográfica ainda dava os seus primeiros passos quando Riedel fez os registros que me fizeram percorrer os cenários e conhecer os personagens da década de 1860.

O mundo viveu sem a fotografia até 1826, quando o francês Joseph Niépce desenvolveu o primeiro mecanismo que a tornou possível. Ele utilizou uma câmera escura, ou seja, um equipamento que projeta a imagem do exterior na parede interna oposta ao orifício, de forma invertida. Esse equipamento era utilizado desde a Antiguidade, mas sem a possibilidade de fixação da imagem.

A novidade da invenção de Niépce foi a inserção de uma placa de estanho coberta com betume no fundo da câmera escura. A entrada da luz do sol na câmera queimava o betume na placa, formando e fixando a imagem. A vista da janela de Niépce é considerada a primeira fotografia da História. Mas para esse processo eram necessárias cerca de oito horas de exposição à luz.

Foi somente após a invenção do daguerreótipo, em 1839, que a fotografia se popularizou. O aperfeiçoamento da criação de Niépce por Louis Daguerre acelerou o processo de fixação da imagem, reduzindo o tempo de exposição à luz. Daguerre optou por ceder a patente de sua criação ao governo francês, em troca de uma pensão vitalícia.

O daguerreótipo tornou-se, portanto, de domínio público, foi se aperfeiçoando e na década de 1860 atingiu uma tecnologia mais prática e de custos mais acessíveis. Nesse momento, vários daguerreótipos se multiplicaram pelo mundo, chegaram ao Brasil e às mãos de Augusto Riedel.

Os primeiros fotógrafos daguerreotipistas chegaram à América para registrar paisagens, pessoas e eventos históricos. Estúdios fotográficos começaram a ser inaugurados em cidades como Rio de Janeiro e São Paulo. A partir daí, a fotografia foi usada para documentar aspectos da vida social, cultural e política do país. É nesse contexto que Riedel entra no Brasil e na História da Fotografia, deixando registros inesquecíveis.

Augusto Riedel nasceu na Alemanha em 1811 e emigrou para o Brasil na década de 1840. Havia estudado desenho e pintura na Academia de Belas Artes de Berlim antes de se dedicar à Fotografia. A formação artística influenciou a abordagem diferenciada de Riedel como fotógrafo.

No Brasil, introduziu e popularizou o daguerreótipo, estabelecendo renomados estúdios fotográficos em São Paulo na década de 1860 (Rua Direita nº 24) e no Rio de Janeiro na década de 1870 (Rua Cassiano nº 41). Era conhecido por produzir daguerreótipos de alta qualidade, retratando paisagens urbanas, naturais e figuras ilustres.

A obra de Riedel nos permite acompanhar visualmente a evolução urbana brasileira e fatos marcantes como cerimônias e visitas de estrangeiros ao país. Foi capaz de capturar nuances difíceis de se alcançar com a tecnologia fotográfica da época.

Augusto Riedel não se contentou com o sucesso profissional de seus estúdios fotográficos e de suas ações na cena cultural da época, como a participação em grandes exposições e eventos artísticos no Brasil e no exterior. Desejava desbravar, conhecer e registrar com seu daguerreótipo outras paisagens e personagens do país que adotou para viver. Realizou, então, algumas expedições fotográficas por vários estados do Brasil como Rio de Janeiro, Minas Gerais, Bahia, Pernambuco e outros.

A viagem a Minas Gerais entre 1868 e 1869 foi marcante em sua trajetória profissional. A paisagem montanhosa, as minas de ouro e as cidades de arquitetura barroca foram cenários que Riedel pôde explorar com toda a sua capacidade artística. No arraial de Lagoa Santa esteve com o cientista dinamarquês Peter W. Lund, considerado o Pai da Paleontologia Brasileira.

As fotografias que realizou do cientista e do cenário que o circundava são registros raros, publicados em diversos livros de História da Ciência pelo mundo.

Riedel esteve em Minas Gerais na comitiva de viagem do Duque de Saxe, marido da princesa Leopoldina e genro do imperador D. Pedro II. Percorreu e fotografou as cidades de Diamantina, Ouro Preto, Mariana, Sabará, Lagoa Santa. Visitou a Mina de Morro Velho e os rios São Francisco e Velhas. A expedição visitou também os estados de Alagoas e Bahia.

Riedel realizou os primeiros registros fotograficos de muitos desses lugares e publicou o álbum “Viagem de S.S.A.A. Reaes Duque de Saxe e seu Augusto Irmão D. Luis Philippe ao Interior do Brasil no Anno 1868” com 40 fotografias. Essa obra é considerada uma precisosidade da documentação fotográfica do século XIX no Brasil.

As viagens de Riedel e seus registros contribuíram para a consolidação da fotografia como importante meio de documentação histórica e como uma elevada expressão da Arte no Brasil. Suas belas imagens constribuem para o melhor entendimento da História e da Cultura do país.

Augusto Riedel faleceu em 1883 deixando um acervo precioso no Instituto Moreira Salles e no Museu Histórico Nacional. Mas há inúmeras de suas fotografias perdidas ou sem autoria reconhecida. Informações da imprensa da época relatam que Riedel teria se naturalizado brasileiro em 1876 e viajado para Alemanha em 1877, mas sua biografia ainda é pouco conhecida e cheia de lacunas.

Durante muitos anos acreditou-se que Augusto Riedel fosse filho do botânico Ludwig Riedel que viajou com Peter Lund pelo Brasil entre 1833 e 1834 e, mais tarde, tornou-se Diretor do Jardim Botânico e da seção de Botânica do Museu Nacional do Rio de Janeiro. Esse equívoco foi desfeito com a descoberta de uma nota publicada na imprensa carioca na qual há um depoimento do verdadeiro filho de Ludwig Riedel, homônimo do fotógrafo, esclarecendo a situação.

Augusto Riedel, empregado na casa dos Srs. Leuzinger & Filhos, e filho do falecido botânico Dr. Luiz Riedel, declara, por causa de dúvidas, que nada tem de afinidade com Augusto Riedel, photographo, e que de hora em diante, assignar-se-ha Augusto Fernando Riedel. (O Globo, 10 de novembro de 1874).

Augusto Riedel era artista e fotógrafo, alemão e brasileiro, empreendedor e explorador, e nos deixou registros históricos e artísticos memoráveis. Como nos alertou Walter Benjamim em sua obra icônica “A Obra de Arte na Era de Sua Reprodutibilidade Técnica”, a Fotografia passou a ter um significado político, pois registra indícios e provas de um processo histórico. O trabalho de Riedel é uma demonstração desse poder da Fotografia.

Etimologicamente, a palavra Fotografia é formada por foto que significa “luz”; e grafia que quer dizer “escrita”. O conceito de fotografia é, portanto, “escrever com a luz”. Ver o Brasil e Minas Gerais através das fotografias de Augusto Riedel é como abrir uma janela para tempos que já se foram, é como ler um emocionante livro de luz e sombra.

Nada melhor do que finalizar essa escrita sobre imagens fotográficas com a imagem poética do mineiro Carlos Drummond de Andrade sobre o tema. Poesia e Fotografia são expressões artísticas que contêm a mesma magia de nos conduzir a outras dimensões no tempo, nos sentidos e nas emoções.

Diante das fotos de Evandro Teixeira (1985)

A pessoa, o lugar, o objeto
estão expostos e escondidos
ao mesmo tempo, sob a luz,
e dois olhos não são bastantes
para captar o que se oculta
no rápido florir de um gesto.

É preciso que a lente mágica
enriqueça a visão humana
e do real de cada coisa
um mais seco real extraia
para que penetremos fundo
no puro enigma das imagens.

Fotografia — é o codinome
da mais aguda percepção
que a nós mesmos nos vai mostrando,
e da evanescência de tudo
edifica uma permanência,
cristal do tempo no papel.

Das lutas de rua no Rio
em 68, que nos resta,
mais positivo, mais queimante
do que as fotos acusadoras,
tão vivas hoje como então,
a lembrar como exorcizar?

Marcas de enchente e de despejo,
o cadáver insepultável,
o colchão atirado ao vento,
a lodosa, podre favela,
o mendigo de Nova York,
a moça em flor no Jóquei Clube,
Garrincha e Nureyev, dança
de dois destinos, mães-de-santo
na praia-templo de Ipanema,
a dama estranha de Ouro Preto,
a dor da América Latina,
mitos não são, pois que são fotos.

Fotografia: arma de amor,
de justiça e conhecimento,
pelas sete partes do mundo,
viajas, surpreendes, testemunhas
a tormentosa vida do homem
e a esperança de brotar das cinzas.