Visto que milhares de pessoas se aglomeraram, a ponto de se atropelarem umas às outras, Jesus começou a dizer, antes de tudo, aos seus discípulos: — Cuidado com o fermento dos fariseus, que é a hipocrisia. — (Lucas 12:1)

“Evangelho de Fariseus” chamou a atenção do Brasil todo, ao ser cantada e escrita pela voz de Ayme Rocha, durante a sua participação do Dom Reality, um programa que busca encontrar novos talentos gospel. Com uma letra impactante, Ayme atacou todo o sistema político e religioso do Brasil em menos de 3 minutos de música. Antes de continuar o artigo e decifrar essa canção, acho que a letra fala por si e dispensa meus comentários por agora, então, assistam ao final do artigo para tirar as suas conclusões.

A letra começa com “Fazemos campanhas para nós mesmos” e para quem não frequenta igrejas evangélicas ou não conhece, as chamadas Campanhas são práticas muito comuns dentro deste ambiente. Quando falamos nelas, normalmente não estamos falando em campanhas para arrecadação de doações, estamos falando sobre campanhas de oração, que é quando a igreja se reúne para orar por uma causa, que em grande maioria, está relacionada a algum tipo de ganho na vida pessoal de cada indivíduo que está participando, por exemplo, campanha para prosperidade financeira, para casa própria, para abençoar os negócios, para quitar dívidas…

Também não podemos esquecer que estes movimentos são ótimos para arrecadação de dinheiro, coisa que grande parte dos pastores e líderes religiosos parecem adorar tanto quanto a Deus. Por isso, quando a música começa com a frase “Fazemos campanhas para nós mesmos” é gerada uma situação muito interessante, pois além de estar relacionado ao fato de a maioria das campanhas de oração estarem ligadas a pedir algo para Deus, vale lembrar da campanha política de Bolsonaro, que foi baseada em fake News e voltada para o público evangélico que é em sua maioria, completamente cega pelo seu “capitão”.

Na sequência, a letra fala sobre “eventos pra nós mesmo” e nesse quesito é preciso mencionar as celebridades e subcelebridades do meio gospel que cobram cachês exorbitantes das igrejas, para irem cantar, pregar ou qualquer que seja a aparição. Muitas vezes os eventos são apenas palco para que essas subcelebridades possam estar em evidência, aparecer e lucrar.

A própria comunidade evangélica se perdeu no seu próprio discurso, pois os eventos “profanos” ou “do mundo” que são fortemente criticados por milhares de razões, e na verdade, eles fazem exatamente o mesmo, pois quando o foco do evento deixa de ser a presença de Deus e passa a ser os convidados especiais que estarão presentes, eles já não são tão diferentes assim daqueles que apontam o dedo.

“Estocamos o maná para nós”. Segundo a Bíblia, quando Deus libertou o povo da escravidão do Egito, eles foram rumo à terra prometida, e Ele os guiou pelo deserto, por isso não podiam plantar nem colher. O que levou o povo escolhido a reclamar muito sobre a situação que estavam passando. Por outro lado, a Bíblia também relata que Deus queria que os israelitas dependessem totalmente do sustento e da provisão que vinha do céu. Então no livro de Êxodo está escrito que Deus enviou sustento divino, durante 40 anos. Esse sustento foi chamado de maná, que era formado depois da evaporação do orvalho formado durante a madrugada, é descrito como uma coisa pequena, em flocos, como uma geada branca, parecido com sementes de coentro e como bdélio, que lembrava pequenas pérolas. Geralmente era feito moído, cozido ou assado, sendo transformado em bolos e diz-se que tinha sabor a mel.

Ainda segundo a Bíblia, o maná era enviado diariamente e não podia ser armazenado para outro dia, caso fosse estocado, ele estragava de um dia para o outro. Também não era fornecido aos sábados; por isto Deus enviava uma quantidade maior às sextas-feiras, e neste caso, o único dia que o maná podia ser guardado sem se deteriorar era no sábado. Por isso, quando é mencionado que o maná foi guardado, está se referindo ao fato de um povo receber um presente de Deus, mas ao invés de partilhar, eles guardam o que era suposto dividir e essa atitude estraga muitas vezes o que é tão precioso de ser compartilhado.

“Oramos, por nós e pelos nossos. O reino virou negócio. O dízimo importa mais do que os corações.” O dízimo que vale mais do que os corações, é o resultado de uma igreja que vendeu o seu ministério e chamado para a relevância, poder e ganância. E é por isso que vemos uma quantidade de absurdos como “parcelar o dízimo”, “… se você não der o seu salário inteiro o Senhor não irá te abençoar…”, “…a escassez que está na sua casa é culpa sua por não dar o dízimo…” e assim por diante, poderia ficar horas falando sobre isso. Igrejas que se vendem em nome de um indivíduo que vai capitalizar a igreja e torná-la um negócio extremamente lucrativo.

Mas a questão é, se Jesus pregou a simplicidade do amor e a importância de cuidarmos uns aos outros, por que existem tantos pastores evangélicos milionários? Caio Fábio, pastor, respondeu muito bem essa pergunta dizendo que são ladrões conforme o previsto, o Apóstolo Paulo fala sobre isso quando menciona em um de seus livros dizendo “eles farão comércio de vós… maltratarão, venderão…”, Caio ainda acrescenta que “ouvir falar na simplicidade de Jesus lhes dá coceira nos ouvidos”. Eles se cercam de teologias antievangélicas para justificar os seus atos. As ovelhas são usadas, torturadas e tudo isso em nome do reino. Jesus alerta aos seus discípulos sobre o "fermento dos fariseus". Fermento é uma substância que, em pequena quantidade, ao ser misturada à massa do pão a faz levedar e crescer. Aqui o fermento dos fariseus é a hipocrisia, que sendo aparentemente inofensiva, causa um grande e crescente mal.

Com a politização do meio evangélico no fim dos anos 90 início dos anos 2000, eles foram ficando cada vez mais ideologizados com o que podemos chamar de Teologia do Domínio, então por mais que se diferenciam com práticas e doutrinas, eles todos conseguiram convergir para as maiores e piores formas de radicalização política, com apenas um objetivo: unirem-se para que possam se tornar a maioria na sociedade e assim podendo eleger todos os níveis desde vereador até presidente da república.

Durante o período de ditadura no Brasil, eles se aliaram profundamente à ditadura e foi onde começaram a ganhar rádios e programas de televisão. A ditadura então descobriu que uma ótima maneira de seduzir os religiosos evangélicos eram os commodity de rádios e televisão, que eram as grandes mídias da época e chegou a tal grandiosidade que existem grupos religiosos que têm mais rádios ou repetidoras espalhadas pelo Brasil do que a própria Rede Globo.

E aí, aconteceu um grande crescimento de status e poder para os grupos que se aliaram à ditadura e começaram a ganhar essa visibilidade, porque aonde quer que você iria, determinado grupo teria uma rádio na sua cidade e essa visibilidade era o que os vereadores, prefeitos e etc., precisavam para se eleger, e é aí que começa a mistura de religião e política. Para então chegarmos ao cenário atual de que temos um presidente que é colocado no poder, onde a democracia passa a ser uma máscara e pretexto, para uma dominação religiosa. Isso se aplica também a outras instâncias como no Supremo Tribunal, Suprema Corte o objetivo é fazer maioria, para que o que domine não seja a constituição, mas sim os valores e costumes da Bíblia e média ponderada religiosa.

Os fariseus, tal como os religiosos falsos dos dias de hoje, vivem uma vida dupla, corrompida, contaminando a outros para agirem da mesma forma. "Assim são vocês: por fora parecem justos ao povo, mas por dentro estão cheios de hipocrisia e maldade" (Mateus 23:28). Esse gancho serve para eu te contar quem são os 5 pastores evangélicos mais ricos da igreja brasileira… em primeiríssimo lugar o controverso e polêmico “pastor” Edir Macedo fundador da Igreja Universal do Reino do Deus, conhecida por pedir o dízimo de forma bastante direta e incisiva, a fortuna do homem é atualmente estimada em bilhões de reais que é atualmente uma das pessoas mais ricas do Brasil.

Quem ocupa a segunda posição é Valdemiro Santiago, fundador da Igreja Mundial do Poder de Deus, a igreja se destacou dentro do cenário evangélico por prometer curas e milagres aos fiéis, sua fortuna é estimada em centenas de milhões de reais, provenientes do dízimo arrecadado nas suas congregações. Em terceiro lugar o estimado Silas Malafaia, fundador da Assembleia de Deus, este personagem ganhou notoriedade devido a suas falas polêmicas e extremamente conservadoras. O próximo da lista é o RR Soares, fundou a Igreja Internacional da Graça de Deus, é muito conhecido pelo seu programa de TV de todos citados é o que menos se envolve em polêmicas, mas ainda tem um espaço especial quando se trata de pedir dízimo as suas ovelhas… Por fim, Estevam Hernandes fundador da Igreja Renascer em Cristo, ficou conhecido por uma abordagem mais contemporânea e dinâmica, sua fortuna também é estimada em milhões de reais que vêm diretamente do dízimo dos fiéis.

Sem mencionar aqui, tantos artistas e outros nomes como Deive Leonardo, que comemorou com seus fãs a conquista da sua Ferrari novinha, a família Valadão que vibra em Miami com suas igrejas milionárias, Camila Barros usando roupas avaliadas em mais 30 mil reais (apenas na bolsa), Aline Barros… e por aí vai… A questão aqui não é sobre ter dinheiro ou não, mas sim sobre os meios usados para tal, quando as maneiras de conseguir toda a riqueza são a base de mentiras e manipulações, de um povo humilde e faminto, não existe nenhuma hipótese de ser algo que venha de Deus.

Para finalizar, vale lembrar que Jesus é quem deu voz aos que não tinham voz. Ele viveu em favor dos surdos, cegos, mudos, coxos, dos presos, dos oprimidos, pobres, prostitutas, desfavorecidos na sua sociedade. Todas as pautas e prioridades de Jesus estavam voltadas para esse povo e acima de tudo pregava o amor e a paz como sendo base de tudo.

Então quando nos consideramos cristãos e dizemos que vivemos em favor do evangelho, surge uma igreja cuja pauta é qualquer coisa diferente do que Jesus disse já não podemos considerar. Ele mesmo disse “quem com ferro fere, com ferro será ferido”, o seu posicionamento sobre armamento sempre foi muito claro, porque ele era a favor da paz, então me custa entender como uma igreja pode oferecer uma pauta em favor do armamento e do ódio contra seus irmãos. Nós temos que viver a nossa vida, respeitando nossos irmãos, em todos os sentidos; lutar pelo desarmamento da sociedade em todos os níveis, seja emocional, psicológico, físico, relacional…

― Vocês ouviram o que foi dito: “Olho por olho, dente por dente”.

Mas eu digo: não resistam ao perverso. Se alguém o ferir na face direita, ofereça‑lhe também a outra. E, se alguém quiser processar você e tirar a sua túnica, deixe que leve também a capa. Se alguém o forçar a caminhar com ele uma milha, vá com ele duas. Dê a quem lhe pede e não volte as costas àquele que deseja pedir algo emprestado. ― Vocês ouviram o que foi dito: “Ame ao seu próximo e odeie o seu inimigo”. Mas eu digo: amem os seus inimigos e orem por aqueles que perseguem vocês (Mateus 5:38–44).