Com frequência, somos alertados sobre o impacto das redes sociais em nossa capacidade de atenção. Recursos de monitoramento e bloqueio de apps são cada vez mais utilizados para frear o tempo gasto digitalmente, especialmente nas redes sociais.
Pesquisas recentes, como a da Dr. Gloria Mark*, Chanceler no Departamento de Informática da Universidade da Califórnia, indicam uma queda na nossa média de atenção às telas. De acordo com o estudo, em 2004, o tempo médio de atenção era de 2 minutos e 30 segundos, enquanto em 2012 caiu para 75 segundos. Nos últimos 5 anos, a média foi de 47 segundos. Tais estudos levantam questionamentos sobre o impacto dessa nova realidade em nossas vidas, incluindo o hábito da leitura.
Será que lemos menos devido à redução da atenção? Ou será que lemos menos porque passamos mais tempo nas redes sociais? E se, na verdade, o quadro for o oposto? Por conta das redes sociais, somos influenciados a ler mais?
Em 2022, dois anos atrás, os influenciadores já eram apontados como o principal estímulo para a leitura, de acordo com pesquisas realizadas na Bienal do Livro. Segundo a pesquisa "Retratos da Leitura em Eventos do Livro e Literatura" do Instituto Pró Livro (IPL), em parceria com o Itaú Cultural e aplicada pelo IPEC, 52% dos entrevistados durante o evento mencionaram os influenciadores como uma grande motivação.
O ecossistema literário no mundo digital é extremamente expressivo. Influencers com milhões de seguidores em contas dedicadas exclusivamente à literatura têm impactado significativamente o mercado editorial. Os ecossistemas Bookstagram, BookTok e BookTube, comunidades de entusiastas de livros no Instagram, TikTok e YouTube, respectivamente, têm impactado tanto que o mercado editorial teve que se adaptar. Editoras têm feito parcerias com influenciadores para promover e divulgar seus lançamentos. Em livrarias, não é incomum encontrar prateleiras dedicadas aos "Populares no TikTok". Nos eventos literários, como a última Bienal do Livro (2023), estandes de redes sociais, como o TikTok, fizeram parte da programação com iniciativas, eventos e promoções.
E assim como a moda, a "popularidade literária" também tem sido observada no mundo fashion. Artigos como "livros são os acessórios favoritos das it girls" e "livros são os novos acessórios cool" têm aparecido nos portais de moda nos últimos meses. Fotos de ícones pop, modelos e celebridades com livros na mão são frequentes nessas publicações. Bella Hadid e Gigi Hadid, por exemplo, são constantemente fotografadas entre semanas de moda com um livro na mão. Marc Jacobs, designer norte-americano, compartilha regularmente suas leituras em sua conta pessoal do Instagram, e o autor James Baldwin é uma figura frequente nas postagens do designer por trás da grife Marc Jacobs. Dua Lipa, cantora pop, mantém um clube do livro em uma conta paralela no Instagram com quase 300 mil seguidores.
Apesar da queda na nossa atenção, o livro está em alta no mundo digital. Mas qual é o veredito do mercado literário? Por um lado, há pesquisas que comprovam o efeito prejudicial das redes sociais em nossa capacidade de atenção. Por outro, há uma comunidade literária em ascensão nessas mesmas plataformas. Embora seja difícil avaliar essa dualidade no comportamento humano, podemos olhar para os números do mercado para entender essas forças em nossos hábitos.
Em 2021, como resultado da pandemia que forçou o isolamento e estimulou hábitos de entretenimento em casa, o faturamento global com venda de livros aumentou 7,6% em comparação com 2020. Já em 2022, talvez devido à retomada das atividades sociais fora de casa, esse faturamento caiu 10,11%. A recuperação em 2023 foi modesta, de apenas 2,53%, de acordo com pesquisa da Wordsrated.
O panorama do mercado brasileiro segue a mesma lógica, com um ano de atraso. Crescemos em 2022, mas caímos em 2023.
No último ano, foram movimentados 54,43 milhões de livros, gerando um faturamento de R$2,52 bilhões. Já em 2022, foram 4 milhões de livros a mais, de acordo com a Nielsen BookScan Brasil. O ano de 2023 registrou um volume de livros 7,13% menor do que em 2022 e um faturamento 0,78% menor. A inflação impediu uma queda ainda maior no faturamento. Em 2022, o crescimento em relação a 2021 foi de 2,98% no volume de livros e 8,33% no faturamento.
A Wordsrated prevê que os próximos anos serão de crescimento, com estimativa de crescimento anual de 1,48%, chegando a 82,7 bilhões de dólares em 2027. O mercado editorial é marcado por flutuações, mas os movimentos recentes - como o crescimento dos livros digitais, a presença dos ecossistemas nas redes sociais e a tendência da moda - indicam uma mutação permanente intrínseca ao hábito da leitura. Essa característica garante sua resistência e, ao que tudo indica, sua sobrevivência.