O Rei tenta avançar, suado, nervoso, mas protegido por uma fornada de soldados. Assim, é bloqueado por um conjunto de peças que atrasam o seu longo caminho, querem que ele caia. O rei tenta novamente avançar, mas a rainha oposta assusta, impõe respeito, o bispo mantém uma posição diagonal poderosa e a torre é a mais direta, vai de frente.
O jogador tenta ajudar o peão, é ponderado mas com tempo contado, e o peão, assustado e sem meios, fica pelo caminho, é mandado fora, exausto, lá vai ele para fora do tabuleiro branco e preto.
E como tudo na vida, alegorias estão de par a par connosco, em todo o lado. As sátiras permitem o mundo rodar. Basta pensarmos no grande Charlin Chaplin, que era o cómico do povo mas a sátira do governo. Ele permitiu o mundo andar.
E se falarmos de cultura? Das suas necessidades, mas acima de tudo das suas benfeitorias? A cultura faz o mundo andar.
Se considerarmos a cultura no interior, e pensarmos com clareza nas dificuldades que isto requer pensar, o X-Y do jogo pára, quanto mais se a ponderarmos idealizar. Vamos falar de custos? Vamos falar de deslocação? Vamos falar de políticas? E seguros? Contratos ou recibos verdes? Vamos considerar tudo isso como questões de grande porte, mas vamos referir acima de tudo que a cultura deve e merece ser paga.
Considerar cultura no prisma de entretenimento e de colocação de um corpo são, é um filtro consistente para este assunto.
Não podemos colocar cultura na tabela geral, senão temas como religião e futebol seriam também colocados no jogo de xadrez. A cultura também merece a sua atenção.
Considerar problemas culturais no litoral? É ignorar simplesmente o privilégio que o litoral enfrenta relativamente à Cultura. Quase que parece um rico a reclamar com ordenados.
Não podemos apresentar só defeitos quando alguém está pior. O umbigo tem mais para lá do mesmo. Se o litoral já se sente muitas vezes ressentido, podemos sequer falar do pobre do interior?
Vamos considerar um município no interior como sendo o Rei do tabuleiro; a Rainha é o orçamento; os Cavalos a deslocação e o Bispo o alojamento. Sobra claramente a Torre, que se refere ao local do evento a decorrer, os Peões são os artistas e o Jogador é o espectador.
Para um jogo de xadrez começar, uma peça tem de dar o primeiro passo. Mas sem jogador nada é feito, e o jogo só é concluído se o Rei concluir a sua jornada na mantra ao xadrez.
E assim começa a batalha.
Em países bem ornamentados, cheios de vida e atividade cultural, independentemente do sítio, os primeiros a avançar no tabuleiro aos quadrados brancos e pretos é ao estilo de Magnus Carlsen. Com movimentos ponderados, acertados e vitoriosos. Mas quando se trata de países incrivelmente bonitos mas com visões infelizmente inferiores, enfrentamos um jogador como o vizinho do lado, que aprendeu a jogar com o computador e tenta umas táticas que viu no Youtube.
Afinal, hoje em dia aprende-se tudo online.
Assim, colocamos nas mãos do vizinho, o futuro da Cultura num país que deveria ser tão rico pela sua beleza natural.
E enquanto o Peão tenta a sua longa viagem até ao fundo do tabuleiro para conseguir ser a Rainha, e na lógica do pensamento, obter o seu orçamento, enfrenta até lá toda uma jornada, cheia de percalços pelo caminho.
A cultura acaba por ser criada e fomentada por gente das terras que pouco ou nada consegue mais que um ordenado mínimo para se sustentar. Além do sustento pessoal e familiar, tenta com afinco vingar na área, contratações de sangue novo? Infelizmente nem vê-lo, não por não querer, mas por não poder. Não é para quem quer, mas para quem pode.
Contratar artistas do litoral, mais conhecidos, que certamente trarão mais audiências são objetivos, no entanto, por vezes nem disso passam.
Deslocações ao interior, implicam claramente o pagamento aos artistas. Continuo a defender a necessidade da cultura ser paga. Mas há toda uma deslocação não facilitada por portagens caríssimas, as Portagens SCUTS, a juntar ao combustível.
Aluguel de autocarros?
Vencimento pela atuação/performance?
Vale a pena essa deslocação?
Quem paga?
E esta shaturanga quebra.
Os Cavalos deste tabuleiro ficam caros. A Torre deste Xadrez não compensa, e as Torres do litoral acabam por ser as eleitas por questões óbvias. Os jogadores são em maioria. Só eles geram o movimento.
O Bispo também não ajuda e o Peão não consegue virar Rainha.
Mas todas as áreas enfrentam diversas problemáticas, a Cultura não deixa de ser diferente. O Rei vai tentando, mas com alguns percalços pelo caminho.
As Torres do interior têm poucos jogadores, é pena. Mas não têm menos qualidade, atenção. O interior é só, e apenas só, o interior.
Outrora cidades lindas e vistosas, uma delas a antiga Manchester de Portugal, vive hoje lutando por qualidade para os seus e os que saem em luta.
O Rei do tabuleiro lá vai colocando uns trocos para a cultura, o que pode, afinal acima dele há uma outra monarquia que não se pode sequer controlar.
E pequenos centros culturais vão tentando, juro que vão tentando, mas portas cerradas fica mais barato. Afinal, para que queremos cultura?
Não passa de um jogo de tabuleiro, sem o Rei nada acontece, a Rainha é a que mais permite movimentações; Cavalos, Bispo e Torre, funcionam em torno do Rei, a Torre é o drama da questão e os Peões só andam se o Jogador tiver forma de pagar.
Mas isto nem é importante, afinal é só Cultura.