Os mendicantes, no meio dos sofrimentos dos séculos XII e XII, prestaram eficazmente seu serviço: Franciscanos com a simplicidade de vida unida à fraternidade1, os Dominicanos com seu saber procuraram extirpar as heresias, desenvolver o saber teológico e administrar a inquisição2 . Os Carmelitas e os Eremitas de Santo Agostinho mantêm-se a meio caminho entre o estudo e a solidão. Para os Franciscanos é importante a paixão por Francisco de Assis; para os Dominicanos, a organização da própria Ordem:
Elas são um dos frutos mais belos da vida religiosa na Igreja Católica, e com outras organizações que lhe são afins, representam, na sua organização e constituição, um tipo completamente novo na série das ordens religiosas3.
Com o desenvolvimento do comércio e do artesanato, velhas cidades experimentaram um desconhecido reflorescimento. A vida humana trouxe à luz um novo tipo de homem: mais crítico, racional, aberto a novas correntes espirituais e a heresias, ao não conformismo. A Igreja avessa ao comércio e rejeitando a usura, não se adaptou a esta nova sociedade. Tratou-a com desconfiança. Enquanto isso os leigos foram igualando-se e superando o clero.
O desenvolvimento do comércio está ligado às cruzadas. Também novas ideias filosóficas e religiosas penetraram na Europa. Os benefícios vindos do oriente se manifestariam na escolástica:
Com o entusiástico ardor as novas ordens se dedicaram à cura das almas, então muito descuidada, e mitigaram a crescente tensão entre pobres e ricos, que os novos interesses econômicos tinham engendrado. O papado valeu-se deles como de um exército móvel e eficaz, para combater a heresia, para desenvolver a obra missionária entre pagãos e maometanos e para atingir seus fins político-eclesiásticos e de reforma; também no campo da ciência eclesiástica deram esplêndidos resultados4 .
O espírito que moveu Francisco, por sua vez, o fez buscar uma vida nova, constituída de novas relações, não se alheando de modo algum à sociedade. Não fugiu do mundo, porém não quis uma vida monacal, e também disse não ao seguimento de Regras de vida religiosa existentes em sua época. Desejava criar novas relações interpessoais e convidar as pessoas para também mudarem sua forma de agir. Tudo isso porque o amor e a doação de Jesus Cristo crucificado, foi o maior e o melhor exemplo de vida. Se Ele, primeiro, amou toda a humanidade, toda a humanidade deve amar sem distinção:
A regra e vida destes frades é esta, a saber, viver em obediência, em castidade e sem próprio, e seguir a doutrina e os vestígios de nosso Senhor Jesus Cristo5 .
A vida e o exemplo de Jesus Cristo, pobre e humilde, tornou-se um termômetro social da vida de Francisco e dos primeiros irmãos, o qual passou a caracterizar a Ordem, impulsionando-a à uma postura notável perante e na sociedade a partir de então. A Fraternitas era o resultado do encontro de homens que abandonavam tudo o que tinham, para seguir um novo caminho, orientados pelos passos do Evangelho de Jesus Cristo6, descritos na Regra não bulada7 (RnB) e na Regra bulada (RB)8.
A primeira ordem: Ordem dos frades menores (OFM)
Após a sua conversão, pouco a pouco, ao redor de Francisco se forma um grupo disposto a viver toda essa experiência de comunhão com o mistério de Deus que se lhe revelava. Jovens de Assis, na Itália, vão pelo mundo afora como andarilhos, mas vivendo a experiência de fraternidade. Tudo e todos passam a ser sentidos como irmãos e irmãs, pois o frade não é mais senhor de nada e de ninguém.
A Ordem Franciscana foi criada como uma Ordem de Irmãos, que assumiam a missão de viver e pregar o Evangelho. Não era uma Ordem Clerical (Ordem composta por sacerdotes), como outras que já existiam. O próprio Francisco não quis ser sacerdote e os primeiros frades também não tinham esse objetivo9.
Desde o início, porém, houve o ingresso de alguns sacerdotes já formados, que desejavam ser franciscanos. Algum tempo depois, sobretudo quando Santo Antônio, professor de Teologia, ingressou na Ordem, passou a ensinar Teologia aos frades e alguns deles passaram a se ordenar sacerdotes:
No início, para se identificarem perante o povo, os componentes do grupo adotaram o nome de penitentes de Assis. A seguir, parece que pensaram em chamar-se pobres menores; percebendo, porém, o perigo que essa denominação comportava, numa época em que tantos ostentavam a pobreza como bandeira de contestação, Francisco optou pelo nome de frades menores. Fraternidade e minoridade resumiam bem o ideal evangélico10 .
Mais tarde, devido principalmente às necessidades da Igreja, a maioria dos frades passou a se ordenar. Mas até hoje, dentro da ordem Franciscana, convivem como irmãos, em igualdade de condições, frades sacerdotes e não sacerdotes (estes chamados outrora de irmãos leigos, por não serem sacerdotes), cada um exercendo a sua função.
Esse é, sem dúvidas, um dos aspectos mais belos da Ordem criada por São Francisco. Mais tarde, a Ordem se dividiu em três ramos: Ordem dos Frades Menores (OFM), Capuchinhos (OFMCap) e Conventuais (OFMConv).
A segunda ordem: Ordem de Santa Clara (Clarissas)
Francisco, além de fundar a 1ª Ordem Franciscana (masculina), foi também o fundador da 2ª Ordem Franciscana, conhecida também por Ordem de Santa Clara, abrindo assim a vivência do ideal franciscano para o ramo feminino. A primeira religiosa franciscana foi a jovem Clara Offreduccio, mais tarde chamada de Santa Clara de Assis, jovem de família nobre e admiradora de Francisco desde que o conhecera como “Rei da Juventude” pelas ruas e festas de Assis. Passou a admirá-lo mais ainda, quando se tornou um inflamado pregador da alegria e da paz, da pobreza e do amor de Deus, não só através de palavras, mas com o exemplo de sua própria vida11 .
Era isso precisamente o que almejava a jovem Clara. Não estava satisfeita com os esplendores do palácio de sua família, nem com o sonho do futuro enlace principesco ao qual seus pais a estavam encaminhando. Sonhava com uma vida mais cheia de sentido, que lhe trouxesse uma verdadeira felicidade e realização. O estilo de vida dos frades a atraía cada vez mais.
Com o correr dos anos, rainhas e princesas, juntamente com humildes camponesas, ingressaram naquele convento para viver, à luz do Evangelho, a fascinante aventura das Damas Pobres, seguidoras de São Francisco, muitas das quais se tornaram grandes exemplos de santidade para toda a Igreja.
As Irmãs Clarissas vivem um estilo de vida contemplativa, sendo enclausuradas. Quer dizer que não têm, normalmente, uma atividade pública no meio do povo, dedicando-se mais à oração, à meditação e aos trabalhos internos dos mosteiros.
A terceira ordem: Ordem secular
Os franciscanos seculares constituem uma verdadeira Ordem na Igreja. Não formam um mero movimento ou associação qualquer. A OFS é uma ordem reconhecida como tal pela Igreja, que lhe apresenta uma forma de vida chamada Regra.
Como tal, ela é acolhida, aceita e abençoada pela Igreja em todas as partes do mundo. Ela faz parte da grande Família Franciscana e contribui para a plenitude de seu carisma. A Ordem Franciscana Secular é constituída por Fraternidades abertas a todos os cristãos seculares:
Começaram a vir a São Francisco muitas pessoas do povo, nobres e plebeus, clérigos e leigos, querendo por inspiração de Deus militar para sempre sob sua orientação e magistério[...]. A todos propunha também uma norma de vida e demonstrava de verdade o caminho da salvação em todos os graus12 .
Nelas há lugar para jovens, para casados, viúvos e celibatários no mundo; para clérigos e leigos; para todas as classes sociais, todas as profissões, para todas as raças; para homens e mulheres. Há lugar para todos porque se busca viver segundo o Santo Evangelho como irmão e irmãs da penitência.
O projeto de vida de todo cristão e especialmente de todo franciscano secular é o seguimento da vida de Nosso Senhor Jesus Cristo, conforme os ensinamentos que nos foram revelados através do Santo Evangelho13 . Por isso, a regra e a vida dos franciscanos seculares tratam de: observar o Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo, segundo o exemplo de São Francisco de Assis, que fez do Cristo o inspirador e o centro de sua vida com Deus e com os homens14 .
Notas
1 Villoslada, Ricardo Garcia et. al. Op. Cit., p.729. Madrid: Editora Católica, 1953.
2 Idem, p. 279.
3 Bihlmeyer, Karl; Tuechle Hermann. Op. CIt., p. 295. São Paulo: Paulinas, 1964.
4 Idem, p. 296.
5 RnB 1, 1.
6 RnB 9, 21.
7 A Regra não bulada é a versão final que resultou em 1221, depois que os capítulos gerais foram acrescentando modificações à Regra Primitiva, para se adequar à vida de uma fraternidade que não parava de crescer.
8 Foi dado esse nome porque foi aprovada pela bula “Solet annuere” de Honório III (1223). É a Forma de Vida que vale deste 1223 para todos os Frades Menores e, por isso, é amplamente conhecida por todos os franciscanos, que a sabem de cor.
9 1Cel, 22.
10 Iziarte, Lázaro. História Franciscana, p.41. Petrópolis: Vozes, 1979.
11 Idem, p. 500.
12 1Cel 37.
13 1Cel 18.
14 1Cel 115.