Caro leitor, é com grande pesar que informo que, em um breve futuro, seremos exceção. Você como leitor e eu como escritora. Com o advento das tecnologias cada vez mais deixaremos de ler e escrever para falar e ouvir.
Assim como o fogo e a roda, a escrita e a leitura também são tecnologias que foram inventadas pelo homem. Já parou para pensar em um mundo em que no passado as pessoas não pudessem registrar seus pensamentos, sentimentos, dúvidas e ensinamentos? Imagine um mundo sem a poesia de William Shakespeare, sem a ciência de Galileu Galilei e sem as experiências de Leonardo da Vinci? Acontece que devido à falta de tempo e de novos gadgets que possibilitam a comunicação de forma cada vez mais rápida, estamos deixando de ler e principalmente de escrever.
Com o início das mensagens por telefone, em que era possível enviar apenas pequenos textos, ainda praticávamos o hábito diário da escrita. No entanto, com a possibilidade do envio de áudio via aplicativos, essa atividade ficou cada vez mais obsoleta, afinal basta apertar um botãozinho e falar.
Aliás, faço mea-culpa para o uso desta tecnologia, pois nesse exato momento, estou falando e utilizando a função de ditado do meu editor de texto. Falar é muito mais rápido do que escrever e, como as minhas ideias fluem mais rápido do que os meus dedos digitam, prefiro fazer o desenvolvimento do meu texto primeiro falando e depois reescrevendo, fazendo as correções gramaticais, ortográficas e de concordâncias de acordo com a gramática normativa do português brasileiro.
Não bastasse apenas o uso de áudio para nos comunicarmos pelo telefone, por meio de mensagens rápidas, utilizamos a função de acelerar os áudios, pois também estamos considerando que a fala e a prosódia necessária para o entendimento da oratória, é muito lenta para nossa tão corrida jornada diária e, portanto, aumentámos sua velocidade em uma ou duas vezes.
Os livros estão dando espaço aos audiolivros e os jornais, que já não andavam muito bem das pernas, pois passaram a ser digitais ao invés de impressos, hoje já enfrentam outra concorrência e competem diretamente com podcasts em que é possível ouvir e assistir aos conteúdos apresentados, não apenas por especialistas ou jornalista, mas por qualquer pessoa que tenho um celular com câmera e acesso à internet. Nunca tivemos tantos “especialistas” como no presente momento da sociedade, não é mesmo?
Algumas empresas de tecnologia, como recentemente fez a Apple e a Google, perceberam há décadas o que é mais fácil para o nosso cérebro. Segundo a teoria inatista de Noam Chomsky, nosso cérebro nasce para falar. Embora haja diversas teorias que discordem do linguista, temos que concordar que falar e ouvir é muito mais fácil do que escrever e ler, mas isso é assunto para um outro texto.
O que eu gostaria de destacar é que, independentemente da contribuição da tecnologia para a nossa comunicação, devemos tomar cuidado e observar o quanto estamos deixando de ser plurais e passando apenas a consumir informações que atendem unicamente aos nosso interesse, trancafiando-nos em uma bolha sem o multiculturalismo necessário para nos desenvolvermos como sociedade.
Na minha singela opinião, ainda é utópico falar que em um futuro breve, a leitura e a escrita serão obsoletas. Não podemos negar que precisamos estar atualizados com as novas ferramentas inteligentes, até porque as tecnologias também agregam muito, vejam o caso da Alexa e da Siri que ligam até a máquina de lavar roupas por comando de voz.
Além disso, os aplicativos que utilizam a voz, contribuem para a inclusão de pessoas com dificuldades de comunicação, permitindo-as voltarem ao mercado de trabalho e para atividades escolares. Aliás, as ferramentas de comunicação assistivas, como são conhecidas, tem sido amplamente utilizada em escolas de todos os níveis acadêmicos.
As ferramentas digitais possibilitam autistas nao-verbais, pessoas que por algum motivo degenerativo ou de acidentes perderam a habilidade motora da fala e pessoas com diversas especificações cognitivas, possam se comunicar por meio de olhares, gestos e até por ondas cerebrais.
Nos últimos dias, a Apple lançou o seu novíssimo produto que integra áudio e campo visual, permitindo ao usuário uma experiência transformadora ao utilizar um óculos virtual. Ainda que seja para poucos, pois o aparelho custa cerca de algumas centenas de dólares, e vivendo em um momento em que algumas sociedades pelo mundo sequer tem acesso a água potável, podemos observar a dimensão da exclusão não apenas social, mas digital também.
É fato é que o ser humano ainda precisa aprender a “ser humano” para iniciar as discussões sobre tecnologia. Temos um caminho longo para percorrer como sociedade e para garantir o básico para muitos, portanto, ainda teremos muitos encontros como leitor e escritora da forma tradicional, assim como faziam nossos longínquos ancestrais. Te espero no próximo encontro!