Para Sigmund Freud (1856 – 1939), neurologista e psiquiatra austríaco, sem a categoria de “mal-estar” não é possível pensar o destino do sujeito na atualidade. A felicidade como exigência da vida social se torna inalcançável.
Nos sentimos ameaçados o tempo todo pela doença, o luto, as rupturas dos laços sociais e principalmente a incerteza do futuro. Nossos relacionamentos desde a infância com irmãos, pais e familiares, já são sociais, de maneira que não é possível separar a psicologia individual da psicologia social. O que diferencia é somente em relação ao número de pessoas pelas quais o indivíduo é influenciado.
Para Freud a pulsão que nos leva à vida em sociedade não é algo inato e indivisível, tem suas origens nos círculos mais próximos do indivíduo, como na família e escola por exemplo.
O indivíduo que, antes de se juntar à massa, era talvez culto em seu isolamento e sua invisibilidade, torna-se um bárbaro, uma entidade guiada por pulsões, quando se junta ao grupo. Os impulsos libidinais que uma massa obedece nunca são capazes de considerar os interesses de autopreservação da capacidade intelectual do indivíduo.
As massas são movidas por palavras de ordem, o qual nenhuma razão ou argumento são fortes o suficiente para mudá-las. Elas também não possuem sede pela verdade, são movidas por ilusões e fantasias. O ponto principal que caracteriza as massas é que elas precisam de um líder para seguir.
Para que um simples grupo de indivíduos se torne uma massa, é preciso que tenham algo em comum uns com os outros: um interesse comum em relação ao objeto, uma maneira muito parecida de sentir as emoções e situações, com uma capacidade de se influenciarem mutuamente.
O indivíduo quando faz parte de um grupo, altera o seu comportamento, suas emoções aumentam, sua capacidade intelectual diminui, nivelamento aos outros indivíduos da massa.
Freud em seu conceito psicanalítico da libido, tenta explicar a psicologia das massas, de maneira mais apropriada, considerando que a libido é uma expressão da doutrina das emoções, ou da afetividade, e diz respeito àquela energia, quando considerada de forma quantitativa, mas não mensurável, da pulsão que está relacionada a tudo o que se pode resumir sob o nome de amor.
Esse amor, contudo, não é apenas aquele ao qual os poetas fazem referência, mas envolve também o amor-próprio, o amor aos pais, o amor da amizade, o amor à humanidade ou até mesmo o amor às ideias abstratas. Platão deu a esse amor o nome de Eros, assim como o apóstolo Paulo faz referência a esse tipo de amor ampliado.
A essência das massas reside em uma ligação libidinosa, e a característica fundamental que a libido explica é de que uma simples sugestão faz com que o indivíduo, ao se integrar a um grupo, renuncia à boa parte de sua individualidade e se deixa sugerir pelos outros. Isso porque temos mais a necessidade de permanecer em concordância, do que em oposição aos outros membros da massa, ou seja, temos a necessidade de sermos aceitos.
A ligação de uma pessoa a outra considerada em psicanálise como identificação, foi uma das primeiras características psíquicas que a psicanálise tomou conhecimento, o que Freud denominou de complexo de édipo. Ele chamou de enamoramento. Na teoria freudiana, uma das características mais importantes para o estudo da psicologia das massas, nessa situação de enamoramento, é o fato de que o objeto amado dispõe de uma certa liberdade de crítica.
O objeto amado com suas características é supervalorizado como tendo um valor muito maior comparado ao olhar de outras pessoas, ou mesmo em comparação com o próprio objeto, quando ainda não era amado. O procedimento que realiza essa falsificação recebe o nome de idealização.
Nessa situação, o objeto é tratado como o próprio Eu. No enamoramento, grande parte da libido narcísica escoa para o objeto, de modo que a escolha de objeto, em muitos casos, serve claramente ao propósito de substituir o ideal do eu. O individuo quer alcançar uma perfeição de si mesmo, e isso acontece de maneira indireta tornando o objeto como perfeito para satisfazer seu próprio narcisismo.
Nos casos de auto-sacrifício, quando o enamoramento e a supervalorização sexual crescem, as correntes de satisfação sexual direta são cada vez mais inibidas, de modo que o Eu se torna menos exigente consigo mesmo e valorizando o objeto desejado. Por fim o objeto toma para si todo o amor-próprio do indivíduo.
Na identificação, o Eu se enriquece com as características do objeto que tomou posse, sendo que no enamoramento, ele se empobrece, se entrega ao objeto e o coloca no lugar de partes importantes da sua constituição. Porém o objeto sempre será mantido, mas às custas do Eu. Todavia, a identificação acontece entre os membros do grupo, como exigência de tratamento igual para todos. Todo individuo da massa quer ser bem tratado e necessita de uma liderança.
Para Freud, a massa da ordem primitiva é de origem da civilização, onde irmãos motivados pela inveja que sentem do pai se unem para matar o mesmo e ocupar o seu lugar, e o pai primevo se torna aquele que tinha acesso a todas as mulheres; o único com direito ao poder do gozo, um líder narcisista e ainda assim um ideal da massa, por identificação narcísica. As emoções compartilhadas pela massa, o desejo de ser amado/odiado pelo líder, é o anseio dos homens por proteção em relação ao seu sentimento primitivo de desamparo infantil.
O ponto em comum de ligação das massas é o fato de que os indivíduos são ligados uns aos outros, mas o pai (líder) dessa horda é livre. Cada indivíduo pode ser membro de várias massas, identificando um ideal em cada uma delas que participa, porém, a união com a massa torna esse individuo cada vez mais incapaz de desenvolver sua independência e capacidade de individualidade do self.