Após a II Grande Guerra Mundial, no advento do plano Marshall para recuperação económica européia, o dólar viu-se como o padrão de moeda para trocas mundiais e digamos assim, hoje finalmente visto como mais um dos principais ‘produtos’ Norte-Americanos. Reserva de valor, um meio-de-troca livremente intercambiável no mercado internacional de produtos e serviços mas também, no comércio de moedas, consequentemente. A Teoria Cambial, é a disciplina que estuda a matemática, as variações de valores, compensações e pagamentos das, e com moedas estrangeiras no mercado financeiro global que, recentemente, foi tema de disputas económicas, denominadas por Guerras cambiais. Politicamente, o dólar substituiu o padrão ouro, se assim poderiamos afirmar, devido à nova realidade mundial e de comércio global originada naquele momento, em que o GATT foi criado para organizar e regular uma nova era de comércio internacional que emergia. Sua força e confiabilidade econômica, suportada pela diplomacia económica e política ocidental, permitiu este processo de substituição de garantias financeiras que deu o encaminhamento para uma economia liberal, o capitalismo do século XX. E, a principal política de mercado e de Estado da história, até então. Derrotou o sistema comunista soviético e do leste europeu, subsidiando também recentemente, um capitalismo híbrido oriental e asiático.
A limitação do ouro em espécie, foi substituída pela emissão de moeda e títulos de dívidas do governo dos EUA, permitindo um crescimento econômico mundial, quase ilimitado. Isto deu um poder de compra quase infinito aos consumidores e ao governo dos EUA, sem riscos para o Balanço de Pagamentos e sem a necessidade de lastro para conversibilidade em ouro, com o fim deste padrão, em 1949. Este crescimento limitou-se pela Diplomacia Ambiental, chamemos a ela assim, quando após um financiamento desenvolvimentista internacional se viu o mundo ameaçado pela poluição ambiental, dos recursos naturais e um crescimento humano desenfreado e às vezes, descontrolado. Com uma população mundial superior aos 8 bilhões, a Índia acaba de suplantar a ex-líder China, neste quesito do ranking populacional global. Como numa provável previsão histórica oriental, hoje não condenaríamos totalmente um certo e antigo controle populacional chinês, outrora famoso. Em diversas teorias modernas observamos uma reorientação mundial, para o histórico e antigo domínio cultural, económico e político daquela sociedade, considerada a mais antiga do mundo! Inclusive os breves adormecimentos chineses, sendo eles, o dos fins das navegações chinesas ocorrido, num possível fechamento de fronteiras terrestres da era Marco Polo e, a Guerra do Ópio, retiveram processos naturais do desenvolvimento e progresso internacional humano.
Neste ínterim, o Reino Unido acreditava que receberia privilégios para uma conversibilidade do Pound Sterling. Mas Keynes, o responsável do governo britânico para aquela diplomacia financeira na época, adoentado inclusive, não conseguiu êxito. Surpreendido pelo sistema político norte-americano, diferentemente do parlamentarismo inglês, o congresso legislativo não concordou com o governo, desaprovando benefícios para a moeda de reserva da Commonwealth. A França, também sofreu despesas imensas em Francos, devido às guerras em Argélia. A Alemanha, historicamente traumatizada pela hiperinflação, sofreu os reveses referentes à tal prejuízo da sua moeda de então, o Marco. O Japão, por sua vez, ao respeitar o plano Dodge, pró-exportador e de desvalorização cambial bem como, de investimentos e incentivos de exportação, tornou-se a segunda economia mundial. E, representa a experiência dos anos 80 que a China de hoje, sugere reproduzir. Os asiáticos, são disciplinados aprendizes do capitalismo ocidental, após a II Guerra Mundial. Ou ainda não o seriam? Talvez os sistemas monárquicos parlamentaristas do Japão e, o seu equivalente socialista-mercantilista chinês, não tenham assim tanta diferença. Será que a Índia será a próxima economia oriental a espelhar tais experiências, dentro em breve? O Japão, potência dos anos 80 e 90, seria um exemplo da China dos anos 2.000, mas claro, com as devidas proporções. Digamos que o Japão foi visto como ensaio, hoje reproduzido para o grande Império Vermelho do Oriente. O cuidado em manter a moeda desvalorizada e o investimento externo controlado, fez do Yen o experimento ideal para se reproduzir com o Renminbi/Yuan.
Portanto, a moeda e o valor cambial dependeriam, basicamente, da confiabilidade numa economia e nos seus governos, dos balanços de pagamentos e fluxos de comércio bem como, dos serviços dos países emissores da moeda. Sua conversibilidade e liquidez pode falhar a qualquer momento, se a confiabilidade é posta em dúvida. Como na bolsa de valores, as ações das empresas estariam representadas pelos atos de seus administradores, acionistas e líderes, frente aos desafios que enfrentam de tempos em tempos e do poder de competição que possuem. Harry Dexter White, Secretário do Tesouro Americano, criador do FMI e especialista em Franco Francês, desarmou o plano inglês de Keynes logo após o famoso advento do ataque a Pearl Harbor, Hawaii com os Planos Marshall para Europa e, Dodge para o Japão, na recuperação das economias destruídas pela guerra. Será que a China desenvolverá um plano de recuperação para a guerra econômica e cambial que culminaram com a Pandemia da Covid-19? Ou ambos EUA e China o fariam em conjunto como associados complementares? Aguardemos, pois, que a Índia possa ser a próxima economia de explosão.
Percebemos no referido texto, alguma relação do passado com o presente econômico, que ora se repete num espectro mais abrangente, apesar de certas particularidades anacrónicas dos atores e agentes de transformação destas novas guerras, cambial e digital moderna. Desde a II Guerra Mundial e o fim do padrão ouro no Governo Nixon, com a transformação do GATT e as regras do FMI ao longo daquelas 7 décadas, vimos o Franco Francês e a Libra Esterlina se desvalorizarem, o Marco Alemão não desejar ocupar supremacia e nem mesmo o Yen Japonês. Porém a aparição do Euro como moeda única Européia pode intencionalmente ocupar uma posição ideal de ‘rivalidade’ no mercado cambial global. Vemos, portanto, esta divisão de forças transitar pelo Hemisfério norte, sendo que o Sul ainda é um personagem complementar e coadjuvante, da Economia Política Internacional. Talvez os líderes dos Organismos Internacionais já mencionados, como a Organização Mundial do Comércio/OMC e a Organização das Nações Unidas/ONU, estejam aí estabelecidos para uma transição da Rodada Doha que pavimentará a preparação e integração internacional, dentro da nova ordem econômica que se projetará, em breve.
Se um padrão-ouro voltasse, a cotação do ouro e da prata se valorizariam consideravelmente e, uma inflação controlada será necessária, para a reordenação monetária internacional; talvez a antiga guerra-fria tenha sido substituída pela guerra econômica e cambial, durante uma pandemia internacional, que ela mesma foi guerreira e guerrilheira. Talvez as moedas internacionais virem moedas digitais e, os bitcoins e as cripto-moedas tenham servido de testes empíricos para serem empregadas quando, e se necessárias. O histórico dos Direitos Especiais de Saques, a moeda internacional do FMI e de seus associados, serviu de grande experiência empírica, às moedas conversíveis. O que parece ser uma certeza é que, o quadro pandêmico do COVID-19 veio a trazer uma realidade econômica de suspensão maciça do comércio, regional e internacional de múltiplos serviços e produtos, estimulando principalmente o de alimentos e medicamentos, higiene, transporte marítimo e, principalmente, o do novo sistema econômico digital. Como nos períodos de entre e pós-guerras, há uma expectativa de mudança de paradigmas e da explosão de crescimento econômico em vários segmentos, porém, com a extinção, substituição e transformação de muitos outros.
O que pode-se afirmar é que, uma mudança já começou e vem sendo gradativa, mas, quando a maioria do mercado estará esperando por uma 'tempestade perfeita', geralmente ocorre um ‘cisne-negro’ económico que surpreenderá à quase todos, exceto aos poucos e experientes traders da diplomacia comercial, que estejam profissionalmente preparados. Mas atenção: estes, apenas aqueles que não descansam, nunca se desinformam e desconfiam de ditas 'conspirações'. Muitas vezes, estes períodos exigem que boa parte da economia internacional adote momentos recessivos e de transição, quando o certo a fazer, é não fazer nada. Movimentos financeiros e económicos instáveis que, aos desavisados, trará prejuízos seguramente! Como os profissionais de clubes económicos restritos, que amadores não o são, nem sequer apressados, verão talvez um dólar ainda sair mais valorizado entre novas potências. Uma desejável utopia, traria um futuro cada vez mais positivo e próspero que, evoluindo gradativamente, algum dia esteja além de guerras bélicas. Mas, se um ‘Nudge'² guiar, carregar ou dragar sociedades económicas inteiras para um determinado sentido, melhor desconfiar. Novamente, nada que uma breve escassez não resolva.
Referências
¹ Exorbitant Privilege: The Rise and Fall of the Dollar. Eichengreen, Barry. Cap 3, Dominance, p. 39. Oxford University Press, 2011
² Nudge: orientação, condução, provocar tendência