Eram duas horas da tarde, talvez um pouco mais ou um pouco menos, mas estava de facto muito calor. Entre lenços nos ombros e na cabeça, percorremos montanhas, rochedos e pequenos trilhos. Esculpidos ainda, entre cada uma das rochas, desenhavam-se templos e antigas igrejas, mosteiros, santuários, e pequenos teatros. Verdadeiras antiguidades, preciosidades de outros tempos e de outros olhares.
Percorremos cada um deles, quase sempre em silêncio, entre alegria e cansaço. Íamos parando calmamente, não só pelo olhar, mas pelo chamar de tantas vozes: «Welcome, Welcome!» Entre cada uma das paisagens, e dos pequenos caminhos, surgiam pequenas barraquinhas de cor branca, atadas com sisal e troncos fininhos. Em cada uma delas vendiam-se rochas, tapetes, colares e pulseiras de todas as cores.
Dentro de cada uma, éramos verdadeiramente bem-vindos, chamados para tomar café ou, mais frequentemente, um típico chá. Em pequenas chávenas, com muitas colheres de açúcar e especiarias de cor escura. Ficávamos, enfim, a conversar. Aprendíamos sobre a cultura Bedouin, sobre as pessoas que ainda habitam as grutas de Petra e as que preferem agora a «village». Aprendíamos sobre o dia-a-dia, a vida, as inúmeras vidas.
Uma das senhoras, a «Hope», traduziu o seu nome para inglês, dizendo que era este o significado em árabe e que era uma pessoa mesmo assim: com esperança. Víamo-la nos olhos e na voz, cantada e tranquila, verdadeiramente amiga. Contou-nos a sua história, os seus cinco filhos e o desejo de voltar à escola. Porque era tempo de pensar em si própria outra vez.
Porque era tempo de voltar a tentar. Era tempo de ter esperança. De ser mulher com toda a coragem e integridade. Alguém que tanto deu uma vida inteira, e que sabia que era momento de o fazer por si também. Depois de olharmos em volta, no pormenor de cada gruta e cada rocha, conseguimos entender a que coragem e esperança se referia. A tentativa de nos realizarmos, independentemente de qualquer lugar, enquanto direito de cada ser humano. Saber esperar, saber estar, uma simbologia de quem vive entre o calor e a frescura das grutas.
A «Hope» colocou-nos o lenço na cabeça, como na tradição Bedouin, e convidou-nos para um casamento na village, nessa noite. Ofereceu-nos ainda várias chávenas de chá. Durante esse tempo aprendemos a estar, a ouvir com tempo e alegria, a saber abraçar. Partimos felizes para o Mosteiro, no alto da montanha, porque era já fim do dia e quase viria o pôr-do-sol. Perdemonos novamente, entre trilhos e montanhas, até chegar.
E voltámos a ficar em silêncio porque há coisas que a alma não deixa contar. Sao imagens fortes e muito definidas, instantes que ficam escritos para sempre nas páginas das memórias, da amizade, de cada vida. Pessoas com histórias que guardamos sem que sejam possíveis de esquecer, pela força e sabedoria que trazem.
No último dia em que visitámos Petra, encontrámos novamente a «Hope», que subira uma rua bem inclinada para se despedir de nós. Vinha cansada, mas trazia o mesmo brilho nos olhos e na voz, que agradecia a nossa amizade e pedia para voltarmos um dia. E para conhecermos melhor a sua história, a sua casa.