A Chapada dos Veadeiros, localizada no estado de Goiás, Brasil, é conhecida por sua beleza natural exuberante e oferece uma variedade de pontos turísticos fascinantes, como o Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros — reconhecido pela UNESCO como Patrimônio Natural Mundial, Vale da Lua, Cachoeira Santa Bárbara, Mirante da Janela, Catarata dos Couros, Cachoeira Almécegas, Loquinhas, Trilha dos Cânions, entre outros encantos escondidos no cerrado brasileiro.
Conhecida por abrigar uma variedade de cristais, como ametista, cristal de rocha, ágata, calcita e uma riqueza mineral infinita, Alto Paraíso, cidade base da Chapada dos Veadeiros, está em cima de uma placa enorme de quartzo, de quatro mil metros quadrados, cercada por rochas e paredões. Além de toda opulência natural, geológica e seu clima subtropical, é cortada pelo Paralelo 14°S (linha de latitude que está situada aproximadamente a 14 graus ao sul do equador), que também atravessa Machu Picchu, no Peru. Assim, um contexto místico é dado ao território, que atrai visitantes interessados em espiritualidade, terapias alternativas e práticas holísticas, pois acreditam e sentem a energia elevada do lugar que recepciona seus visitantes com uma escultura de nave espacial.
A primeira vez que estive lá foi para comemorar meu oitavo aniversário de casamento, desde então, ali passou a fazer parte das nossas escolhas de viagem em diferentes épocas do ano, e em todas elas voltamos para casa com experiências únicas em meio à natureza e muitas histórias para contar.
Era janeiro de 2020 quando decidimos fazer algo diferente. Por ser um lugar deslumbrante, meu marido e eu escolhemos a Chapada dos Veadeiros para a nossa primeira incursão no mundo do camping. Armados de empolgação, compramos barraca espaçosa e todas as parafernalhas que, amadores, imaginávamos usar. Por fim, encontramos um hotel/camping badalado próximo ao Jardim de Maytrea com vista a tirar o fôlego. E foi ali que nossa aventura começou.
Naquele cenário exuberante, onde cachoeiras sussurrantes e trilhas enigmáticas sorriam para nós como personagens de um sonho, montamos nosso lar temporário entre outras barracas de todas as cores e tamanhos. Era bonito e até poético o colorido no gramado em vários tons de verde em contraste harmônico com o céu azul que abraçava tucanos, araras, borboletas e aves de diferentes espécies.
Na primeira noite, a lua, quase cheia, iluminava o céu estrelado, enquanto nos aninhávamos na nossa barraca. Risadas e histórias dos campistas vizinhos ecoavam pelo ar, criando uma atmosfera tão acolhedora que até o canto dos grilos se juntavam ao coro noturno. A emoção da nossa estreia no acampamento tornava cada detalhe ainda mais especial.
No dia seguinte, saímos bem cedinho para desbravar, mergulhar e nos reenergizar nas águas tranquilas e cristalinas dos dezoito poços do complexo da Loquinhas. É pura beleza em cor esmeralda! Passamos o dia ali e passou tão rápido. Com o coração quentinho, apesar das águas geladas, voltamos para o acampamento de tardezinha. Após um banho relaxante, começamos a preparar o jantar na cozinha compartilhada. Era relato de lugares maravilhosos por todo canto. De repente, olhamos para o céu pasmos, metade estava azul celeste e metade bem escuro, com nuvens carregadas e um arco-íris uniam as partes. Foi uma cena inesquecível. Corremos para o gramado munidos de câmeras fotográficas e paralisia de contemplação, e nem ligamos de sermos “devorados” por alguns insetos.
Como a noite prometia chuva, um vizinho de barraca, que viajava sozinho após o seu divórcio, disse que iria até o centro de Alto Paraíso para jantar. Despediu-se de todos e partiu. Meu marido e eu ficamos ali para finalizar nosso alimento e aguardar a tempestade, afinal seria a nossa primeira chuva na barraca e estávamos com dúvidas se nossa estrutura molharia ou aguentaria aquela novidade. A noite caiu e a lua cheia apareceu. Por alguns instantes acreditamos que a chuva não viria, mas ela veio, e veio com toda força.
As gotas desceram do céu, transformando o solo verde em poços de lama e testando a nossa perícia em manter a barraca seca e em pé. Ao observar as estruturas ao redor, notamos a complexidade de cada tenda e entendemos o por quê demoramos para montar a nossa barraca com os seus mil ganchos, que não faziam sentido até aquele momento. Foi então que a barraca vizinha, como se possuísse vida própria, passou por nós voando em direção ao mato.
Meu marido e eu, olhamos um para o outro sem acreditar no que vimos. Não sabíamos se dávamos risada, corríamos ou ficávamos na nossa barraca, que balançava violentamente. Como nosso lema de viagem é ter em nossa bagagem histórias regadas à empatia e solidariedade, lançamo-nos na missão de salvar a pobre barraca voadora do vizinho deprimido, que agora parecia mais um guarda-chuva virado ao avesso. Meu marido a pegou do meio do mato, num ato heróico, pois já era tarde da noite e os animais poderiam estar à espreita, mesmo que embaixo d’água. Após o resgate ser concluído com sucesso, percebemos a força da chuva, pois pelo peso da barraca, havia muitas coisas dentro dela, mas optamos por não abri-la para não invadir a privacidade alheia. Encharcados, a reposicionamos rápida e estrategicamente, na esperança de que seu dono não percebesse a intervenção.
Já secos e satisfeitos de nossas ações, dormimos embalados pela melodia das gotas em nosso “telhado” e pelos murmúrios da natureza. Tarde da noite, acordamos ao ouvir o proprietário da barraca voadora chegar ao camping, ouvimos o zíper da lona abrir, ele se adentrar nela e fechar sua porta enzipada. Aparentemente ele não percebeu o ocorrido, possivelmente vítima de uma noite de excessos. Voltamos a dormir com a sensação de dever cumprido, afinal, foi um dia perfeito em que vimos lugares incríveis, dois “céus” ligados pelo arco-íris, lua cheia, chuva intensa e uma barraca voadora. Como não ter bons sonhos depois de tudo isso? A noite seguiu tranquila.
No entanto, no dia seguinte, uma nova trama começou. Mais sóbrio, ao acordar e se deparar com sua barraca em uma posição peculiar, sua expressão misturava perplexidade e êxtase. Entre risadas contidas, o dono da barraca, com um olhar confuso, começou a tecer uma história inusitada sobre uma abdução alienígena. Afinal, como explicar que sua barraca estava posicionada ao contrário, grudada à terra com os ganchos e tudo? Jurava que não a deixara assim, concluindo que seres de outro planeta se envolveram na travessura.
O acampamento tornou-se o palco de uma narrativa de drama, suspense, humor e de ficção científica, alimentada por risos e olhares cúmplices. Havia tanta empolgação em sua fala naquele contexto extraterrestre que decidimos guardar para nós a verdade, preservando o momento especial daquele homem solitário. Se fizemos o certo? Ainda não sabemos. No dia seguinte, quando optamos por contar, ele já havia ido embora.
Assim, entre trilhas deslumbrantes, cachoeiras revitalizantes e uma noite de histórias cósmicas, nossa viagem à Chapada dos Veadeiros tornou-se memorável, onde até mesmo as barracas protagonizaram suas próprias aventuras e enredos intrigantes, impulsionadas pelo mágico Paralelo 14 e suas pitadas de humor intergaláctico.