Era uma vez Londres em Christmas time!
O London Eye, qual Sherlock Holmes, persegue-nos ao longo do Tamisa. Mas é aí mesmo, ao fazer o cruzeiro de barco que nos damos conta do peso dos contentores, do lixo acumulado na capital londrina. Já ao desembarcar, a multidão que se acumula em Westminster bridge sufoca quem deseja tranquilamente passar adiante... Só apetece parar na Cosy Library do County Hall para a Cup of Tea. Do peso, passamos à leveza do prazer serpentado pela música de Natal.
Táxi! Assobio do porteiro do Hotel e o conforto ansiado pelo táxi londrino conduz-nos ao destino: Her Majesty Theatre: O Fantasma da Ópera!
Bravo!!!! Das vozes aos cenários, ao contar da história, ao vivermos narrativamente essa mesma história, a do fantasma, é claro! Dividido entre sombras e a luz da sua fantasia, entre o mistério e a terrível realidade, entre o Passado e as memórias e um futuro adiado…
Neste revisitar de Londres dei por mim a percepcionar a cidade do Passado, dos filmes, dos escritores, dos músicos, dos becos, do nevoeiro e do mistério que encerra Londres ; a pesar as suas toneladas de encontrões, filas, bookings etc e por outro lado a admirar os seus contrastes, as suas montras mágicas, os manjares nos pubs a preços acessíveis e revi a Alice e a Rainha de Copas; o sonho e o palco dos tribunais e dei mais uma vez conta do peso do relógio especial, que marca o tempo que Peter Pan quis matar um dia: O Big Ben!
Assim, cruzamos Kundera e o fantasma da ópera em terras de Sua Majestade!
Londres.
Escondendo a sua história e as suas múltiplas faces, Londres mantém o mistério e a sedução da relação com os seus fãs.
Como? Através do Teatro!
«A arte constitui-se um meio caminho entre a realidade que frustra os desejos e o mundo dos desejos realizados da imaginação».
(Freud, [1911-1913] 1975, p. 144).
«A capacidade imaginativa do ser humano e seus produtos se adaptam às percepções que o sujeito tem da vida, de acordo com as lembranças e vivências de seu passado. Existe uma relação entre fantasia e tempo, no qual ela circula pelo passado, pelo presente e pelo futuro, ligada pelo fio do desejo que a sustenta em seu conteúdo, permitindo que ultrapasse a barreira do tempo cronológico e supere as barreiras anímicas. Assim, o desejo vale-se de uma ocasião presente para buscar uma satisfação segundo marcas impressas no passado, que resultarão num acontecimento futuro, ou seja, terão repercussão nas escolhas do sujeito».
(Freud, [1906-1908] 1975).
Se a leveza é a metáfora para a efemeridade da vida humana, o peso é seu contrário: é a vida vivida sob a segurança de algum lastro de solidez e realidade que permite a fuga da consciência da finitude e da falta de sentido intrínseco a uma existência destinada ao desaparecimento.
Respeitando a letra da reflexão com a qual Kundera abre o seu romance- A insustentável leveza do Ser- , o peso deveria ser, por essência, pesado, isto é, insustentável: uma existência que se repetirá eternamente é uma existência que convida, mesmo que silenciosamente, à sua efectivação mais plena. Esse é o sentido da noção nietzscheana de «eterno retorno»: o que você faria da sua vida se soubesse que ela se repetirá?
Tentaria vivê-la como exuberância de experiências ou a desperdiçaria, tornando-a um desperdício eternamente repetido? Nietzsche nos faz um convite existencial através do qual tenta nos mostrar um beco sem saída da existência humana: seja a vida uma experiência singular e única ou a expressão de uma repetição perpétua, a existência per se convida o ser humano ao desfrute de uma realização plena.
Na leveza ou no peso, a existência por si mesma ameaça com a falta de sentido. O peso, contudo, aparece implicitamente como modo de existência através do qual o deserto de sentido da existência fica velado sob um mundo de significações estanques, sólidas e capazes de oferecer uma segurança. Kundera afirma, com todas as letras, que o peso tem um aspecto «desejável»!
Quanto mais pesado o fardo, mais próxima da terra está nossa vida, e mais ela é real e verdadeira. Ou seja: mesmo que seja tão insustentável quanto a leveza, o peso confere contornos de realidade à existência humana. Se a imagem da leveza nos remete ao carácter efémero e fugaz de uma existência que se dissipa como fumaça ao vento, a imagem do peso nos remete à uma imagética da solidez na qual a existência humana, tal como os objectos sólidos, tem peso, matéria, realidade; é constituída de uma substância que perdura pelo tempo e resiste à acção das forças que poderiam desgastá-la.
Disfrutemos da “ Balança”!