«Lá vem a Nau Catrineta,
que tem muito que contar!
Ouvide, agora, senhores,
Uma história de pasmar».(Tradição popular)
«A Europa jaz, posta nos cotovelos:
De Oriente a Ocidente jaz, fitando,
E toldam-lhe românticos cabelos .
Olhos gregos, lembrando.O cotovelo esquerdo é recuado;
O direito é em ângulo disposto.
Aquele diz Itália onde é pousado;
Este diz Inglaterra onde, afastado,
A mão sustenta, em que se apoia o rosto.Fita, com olhar esfíngico e fatal,
O Ocidente, futuro do passado.O rosto com que fita é Portugal».
(Fernando Pessoa)
Quando a bússola se desmagnetiza:
“leva muito que contar”…
Folheámos 2 das 3 vias para destruir um país (guerra, catástrofes “naturais” e finanças) identificadas e estudadas por especialistas.
Ouçamos, agora, a lição da velha Esfinge.
As Humanidades apontam 2 outras vias por onde o sentimento identitário se esvai: a social e a cultural (ainda que seja difícil falar de uma sem a outra).
Isto, porque a Nação, seja ela Invenção ou Mito (Patrick J. Geary, O Mito das Nações: a invenção do nacionalismo, 2003), Rito (Fernando Catroga, Nação, mito e rito: religião civil e comemoracionismo, 2005) ou Comunidade Imaginada (Benedict Anderson, Comunidades Imaginadas, 1983-91)… é uma complexíssima teia de mútuas influências e reflexos projectados e elaborados no tempo por uma população tendencialmente estabilizada e coesa pela história, pela progénie, pela língua, por referências, história, tradições, mapas, sabores, lugares, monumentalidade, patrimonialidade imaterial, efemérides, cronologia, etc..
Convirá, no entanto, não esquecer que as comunidades não agem em bloco, mas com assimetrias e que há focos de resistência à mudança, particularmente no caso de grupos profissionais e sociais não sujeitos ao escrutínio comunitário. Exemplos disso são situações como a do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 11/Outubro/2017, sobre um caso de violência doméstica (Processo nº 355/15.2 GAFLG.P1) do Tribunal da Relação (juízes Joaquim Neto de Moura e Maria Luísa Arantes) que fundamentou com citações da Bíblia (Antigo Testamento) e de lei já não vigente (Código Penal de 1886, artigo 372.0) a sua decisão, causando uma reacção pública de revolta, com Petições Públicas, queixas e manifestações de, pelo menos, 40 associações.
Ou petições contra arquivamentos de processos sem julgamento (p. ex. o “caso dos submarinos”) ou que atingem grupos representativos da política e da administração (a do “Fim da atribuição, antes dos 65 anos, das pensões de reforma aos detentores de cargos públicos e políticos, bem como da sua acumulação” ou a da “Redução do Número de Deputados na República de 230 para 180 (a partir da interpretação e aplicação do artigo 148 da Constituição da República)”, por exemplo.
Clivagens comunitárias com indicadores visíveis numa sociedade em que a população acima dos 50 anos não tem grande expertise no uso da net: p. ex., a petição mais subscrita, em nome da “qualidade, com isenção e transparência” da televisão pública, é a “Recusamos a presença de José Sócrates como comentador da RTP”, referente a um ex-Primeiro Ministro, arguido em diversos megaprocessos, e a uma televisão pública em que assumiu um programa de comentário semanal. Ou visíveis na clivagem ainda em situações como as dos lesados do BES, fracturantes (lesados vs. Tribunais vs. Banco de Portugal vs. Ética).
...o espaço transforma-se & as coordenadas culturais tradicionais perdem-se...
Há muitas formas de o transformar, entendido ele no plano do homem ou no do que ele habita. Por exemplo, do modo como deles se fala e os representamos.
Na toponímia, p. ex.: a mudança dos nomes da família e dos das ruas e edifícios. Nas revoluções comunistas, isto foi feito no imediato, com efeito desorientador para os que permaneciam e para os que saíram… o espaço urbano, rural e humano, mas também o das comunicações (estradas, comboios, telefones, etc.), reconfigurou-se.
Com a nova nomenclatura, outra história, com outra cronologia, heróis, efemérides… se elabora.
Mas a mudança pode ser por progressiva perda de referências que na toponímia, nas efemérides, na patrimonialidade material se exprime. Quando disciplinas como a História e a Literatura deixam de ser marcantes no ensino, p. ex., vias privilegiadas de formação de consciências, de quadros de referências compreensivos de todas as áreas disciplinares, da evolução cultural e civilizacional.
No caso do Português do 10º ao 12º anos, segundo as metas curriculares, os textos a estudar são “predominantemente não literários”, “nos domínios da Oralidade, da Leitura e da Escrita”. Uma década de ensino de língua saldando-se por c. de 12 autores, com c. de 5 obras de leitura integral. Ora, a Literatura é a instância em que todos os saberes se encontram, cruzam, sintetizam e divulgam: das ciências, às artes e letras, da tradição popular à inovação de ponta, da irreverência vanguardista à mais simplista conformação social, da doxa às heteroxias… é a “antropologia das antropologias” (Fernando Cristóvão), lugar de cristalizações culturais e estéticas.
No caso da História, as metas curriculares privilegiam uma visão abrangente e transversal, mundial: dos 9 módulos, apenas 1 confere algum protagonismo perspéctico a Portugal (o 8º: “Portugal e o Mundo da Segunda Guerra Mundial ao Início da Década de 80 – Opções Internas e Contexto Internacional”), num período circunscrito a 4 décadas… Ora, nem se esclarecem as linhas de força culturais que informam as opções desse período, nem a diversidade de ritmos e de motivações de um plural histórico que não se resume à perspectiva eurocêntrica ou outra, nem à acumulação de factos: os povos permanecem ininteligíveis, rostos deformados num espelho desfocado, míope.
Ou a mudança pode ser promovida por progressiva massivação dos media e das tecnologias.
Observemos o caso da informação. É tanta, tão heterogénea e tão incontrolada, que já promoveu a criação de novas categorias, com destaque para a “inverdade” e para a “pós-verdade”: se aquela é já antiga, Trump protagonizou-a em 2016, dicionarizando-a.
Vejamos um exemplo do efeito do *marketing+. A sua eficácia no aliciamento de jovens para o voluntariado no 3º mundo é tal, que já não vemos a juventude pensar em ERASMUS com o fascínio de outrora, mas obsessivamente a pensarem neste tipo de voluntariado em que ainda têm de pagar, além de oferecerem tempo, empenho, trabalho do seu tempo de férias.
P. ex., veja-se a MarcaMundos, projecto de uma Associação de Estudantes universitária “para estudantes de Medicina que querem fazer a diferença” (quem não quer?), cujo “princípio orientador e que rege toda a dinâmica do MarcaMundos é a promoção da saúde”: além de organizar e oferecer voluntariado para o 3º mundo, vai ainda busca ao país tão carenciado os fundos para o fazer, pouco lhe dando em troca... Desenvolve actividade internacional:
- “com duas edições, mais a deste ano, já foram enviados voluntários para Nampula, Moçambique. Este ano, teremos missões na mesma em Nampula, e a adição de novos destinos: Polónia e Indonésia.”
E actividade nacional:
- “A vertente nacional do projecto está a cargo da associação Raríssimas, que trabalha com crianças com patologias raras. De seguida, estão as actividades de angariação de fundos, que fazem tudo isto acontecer.”
Ora, a verdade é que essa dedicação generosa de tempo, esforço, risco pessoal (até de vida) nada conta na progressão na carreira, na escolha das especialidades, na contratação, nos concursos…
- Ex. diferente é a AIESEC, que apresenta um painel para “Líderes para o Mundo” (quem não quer ser?) com “em qualquer momento”, “em qualquer altura” e “qualquer modalidade”. Em 2017: “Voluntariado Global”, apresenta 7110 hipóteses, mas apenas em Cabo Verde, Paraguai, Brasil, Itália, Malásia ou Colômbia (mão de obra grátis para os países de destino…), para “Talento Global” são 972 e “Empreendedorismo Global” oferece 912.
Ou tudo se transforma bruscamente com variações sociais massivas:
a. na renovação geracional:
não se dá com a normal emancipação (c. de 50% de jovens de 25-34 anos permanecendo em casa dos pais) nem com manutenção numérica (de 2013 a 2060, Portugal perde mais de 20% de população e a Suécia e o Reino Unido aumentam mais de 20%);
não se dá com falta de condições económicas para enfrentar os custos de lares (3ª geração) e infantários (1ª geração);
nem se o casal estiver em situação de precaridade profissional em países diferentes onde conseguiram bolsas ou contratações;
nem tão pouco se ambos os membros dos casais tiverem profissões sem estabilidade profissional mínima: caso dos casais de professores todos os anos deslocados cada um para seu lado, tendo que enfrentar os custos de 2 residências (ou 3, se tiverem casa própria com empréstimo), de recolocações anuais…
b. no movimento migratório (1998-2015: 60 450 124 imigrantes e 39 560 579 emigrantes)
na imigração: quando os refugiados acorrem em massa (20/minuto, perfazendo milhões) a um determinado espaço geográfico, o impacto social é brutal e transformador: na coesão, na língua, na economia, no perfil populacional, na cultura…
na emigração: a diáspora, actualmente, corresponde, em geral, à fixação e à progénie no país de acolhimento, com todas as consequências da aculturação na 2ª e 3ª gerações;
no movimento incontrolado e desmesurado dos refugiados, cuja alteridade cultural terá efeitos a breve prazo no tecido social, económico…
na natureza de ambos os fluxos:
- p. ex., a saída massiva de jovens graduados e c. 50% de investigadores de Portugal (‘brain drain’), resulta em prejuízo nacional a 4 níveis: perda de valores, mais-valia concorrencial dos países que os recebem, despesas de formação sem retorno e progressiva baixa de desempenho dos que ficam. A realidade vai além dos dados. O projecto Generation E estuda alguns casos do sul da Europa em 2014;
- p. ex., o acolhimento de condenados de delito comum com vistos de residência aumentará exponencialmente a criminalidade nacional, tanto mais que a expulsão só é autorizada "em caso de suspeita fundada da prática de crimes de terrorismo, sabotagem ou atentado à segurança nacional ou de condenação pela prática de tais crimes". A situação de quase livre trânsito de criminalidade violenta para Portugal é clara, porquanto a extradição por crime “a que correspondam penas ou medidas de segurança com carácter perpétuo” só está prevista em casos muitíssimo particulares.
Depois, o próprio funcionamento das instituições pode minar, progressivamente a confiança nelas, com prejuízo do sentimento comunitário que essas configurações ‘guarda-chuva’ promovem: os aparelhos judiciais, militares, policiais e políticos mantêm correlações que repercutem em cadeia qualquer indicador mais forte de disfunção.
Assim, o desaparecimento de armas em Tancos, os megaprocessos judiciais sem condenados (como o actual Presidente afirmou num dos seus comentários semanais anteriores à eleição), os escândalos financeiros, a criminalidade sem consequências, as catástrofes de um país em chamas com falta de socorro contrastando com a indiferença dos seus executivos governamentais lapidarmente expressas em frases citadas à exaustão: “Minha senhora, não me faça rir a esta hora” e “O país tem de ter consciência que a situação que estamos a viver vai seguramente prolongar-se para os próximos anos. O pacote florestal vai produzir efeito ao longo de uma década” (António Costa, Primeiro Ministro), “Para mim seria mais fácil, pessoalmente, ir-me embora e ter as férias que não tive, mas agora não é altura de demissões” (Constança Urbano de Sousa, Ministra da Administração Interna). … tudo vai desfazendo esse sentimento de solidariedade, de corpo solidário, criando abismos entre governo e povo, políticos e não políticos, fragmentando e insularizando cada vez mais os seus membros…
Efeitos sobre a Nau Catrineta
Efeitos de tudo isto e do que assinalei em secção anterior sobre a Nau Catrineta nacional?
Comecemos pelos Relatórios (inter)nacionais (A), passemos aos gráficos estatísticos mais globalizadores (B) e acabemos com o discurso de responsáveis políticos (C): uma metamorfose complexa do rosto nacional.
1. Relatórios oficiais
- Em 2015, o relatório da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento) declarou Portugal no 3º lugar no ranking mundial no tocante ao consumo de anti-depressivos, que triplicara em 13 anos:
- Em 2017, o Relatório do Programa Nacional para a Saúde Mental reconheceu que Portugal é o 1º no ranking europeu de consumo de ansiolíticos e antidepressivos e assinala a duplicação desse consumo em 4 anos (2013-17) com receita médica, com claro agravamento no início da crise e ainda:
mesmo em 2016, no ano em que regista uma melhoria da situação, saíram das farmácias quase 11,8 milhões de embalagens, mais do dobro de 2013 (cerca de 5,6 milhões).
a perturbação mental de ansiedade e depressão está “cada vez mais presente nas gerações mais novas, num mundo que parece que nos obriga a acompanhar o excesso de informação que cria, potencia a ansiedade” e 65% dos afectados por ela:
segundo a Ordem dos Médicos,1/3 da população afectada não recebe os cuidados de saúde adequados”;
em gráfico, o Programa define um quadro de agravamento do problema e de diminuição dos internamentos hospitalares, afirmando em letra mais miúda o aumento progressivo da incapacidade quotidiana, “imp[ondo] uma sobrecarga para a sociedade” (p. 8):
Gráficos estatísticos internacionais globalizadores
Imagens ao espelho: negativos da fotografia.
Contrastando abissalmente com estes indicadores de uma população doente, eis a sua imagem no espelho das estatísticas:
do Relatório da UNICEF em que se baseiam os 17 objectivos para o desenvolvimento sustentável até 2013 e os Objetivos de Desenvolvimento do Milénio: Portugal em 1º lugar entre os 41 Estados mais desenvolvidos no índice de saúde de qualidade e bem-estar dos mais novos
do Índice de Bem-Estar da OCDE, Portugal é o 21º em 34 no âmbito da Saúde (score entre 1.0 e 7.5 em 10);
do Índice de Saúde do Human Developement Report de 2016, Portugal é o 41º em 187 analisados e parte dos 91 países de “Muito Elevado Desenvolvimento”;
do Índice de Bem-Estar em Portugal (INE):
Considerava-se Portugal acima da média europeia e a subir:
Figura 4 (valor global e apenas da saúde)
No conjunto, 2004-15 apresentam-se graficamente assim no Índice de BE:
Valores que contrastavam com outros indicadores, dos quais a subida para “números assustadores” dos endividamentos individuais e familiares, para além das falências empresariais:
Em contrapartida, o tempo de avaliação dos processos de crime de branqueamento de capitais, em geral (não dos megaprocessos de anos de averiguações), é de 422 dias, o que nos coloca em 17º lugar na UE…
E contrastando, também, com o movimento da Justiça, que, no seu portal, apresenta estatísticas gerais do seguinte teor:
mostrando a diferença entre processos cíveis e penais no tocante a entradas e despachos, pendentes e duração média (2001-2015) na fase processual ou de entre 22-31 meses na 1ª instância:
apresentando indicadores de eficiência em que a população não se reconhece e que contraditam os da Ordem dos Advogados (média de 710 dias/processo em tribunal): v. no siej
Comparativamente com os seus homólogos europeus, os tribunais portugueses, sem surveys em alguns períodos são assim classificados nos rankings de 2017:
Valores em contraste, também, com os que nos eram reconhecidos em perspectiva externa: 6,8 contra 7,1/média dos 28 países da UE
A segurança, porém, deriva também da confiança na autoridade policial.
Relativamente à criminalidade, o Relatório de Segurança Pública de 2016 assinala,desde 2008, uma descida para 1/5 da criminalidade geral e para 1/3 da violenta e grave. Insolitamente, confrontando 2016 com 2015, regista, p. ex., diminuição de 11,6% na criminalidade violenta e grave diminuiu 11,6%, contradito, adiante, pelo aumento de 11,2% na ofensa à integridade física grave…
Se olharmos para o Portal da Queixa, com c. 7000 queixas/mês, verificamos que consagra, por serviços, no seu Índice de Satisfação (IS) da população: 4,3% para a PSP (com 5,7% de taxa de resposta), 14,5% para Serviços Polícia-Emergência-Bombeiros (taxa de resposta de 12,5%), 0% para o 112-Número Europeu de Emergência (com 0% de taxa de resposta), Portal do Cidadão com 0% de taxa de resposta… por sua vez, e incrivelmente, o Portal apresenta 95% de IS, com 100% de taxa de resposta com apenas 1 de 2 queixas despachadas, 7 recomendações e 3 censuras!…
No Vision of Humanity, Portugal é o 3º de 163 países do ranking de 2017, passando de 14ª em 2008 e 18º em 2013-14 para 5º em 2016.
No International Property Rights Index de 2017, Portugal está em 31º lugar dentre os 127 avaliados e em 16º na Europa Ocidental.
Observemos a posição em rankings mundiais. Portugal está em 34º de 36 países da OECD por segurança de emprego,13º lugar em 56 no Índice de Qualidade de Vida e 10º na Europa dos 28, em 76ª (em 160) no Índice de The Global Economy (“Trade openness: exports plus imports as percent of GDP”), com tendência a subir, em linha oscilante, desde 1960, o 77º no Index of the Economic Freedom de 2017 (com pequena melhoria desde os anos 90) e, no The Good Countries Index, entre 163, está em 46º (Ciência & Tecnologia), 18º (Cultura), 131º (Segurança e Paz Internacional), 40º (Ordem Mundial), 4º (Planeta & Clima), 12º (Prosperidade & Igualdade) e 25º (Saúde & Bem Estar), era o 7º entre 180 no Environmental Performance Index , 36º no Índice do The World Bank de 2016, 20º no The Social Progress Index de 2017 (128 países e 50 indicadores), Sustainable Society Index de 2016 (com 21 indicadores em 7 categorias), o 6º no Commitment to Development Index de 2017 e no Global Footprint Network e 22º no The Soft Power 30 2017, 36º no World Economic Forum: Global Competitiveness Report, 39º em 173 países em Natural Disaster Risk, 25º no The Legatum Prosperity Index de 2016 (só com a cultura e a educação muito abaixo das suas expectativas), é considerado um “paradoxo de produtividade” pelo Centre for the Study of Living Standards e não consta dos 126 países do Transformation Index BTI 2016.
As estatísticas oferecem, pois, imagens dissonantes…
no Índice para uma Vida Melhor do OECD, os mesmos aspectos surgem bem diferentes em comparação com os outros, quer em geral, quer por região central;
no Índice de Desenvolvimento Humano, os gráficos correspondendo ao 41º lugar de Portugal em 187 países analisados em 2016 são, com 11 indicadores e com um lugar de variação entre 1990 e 2015 dentro do patamar dos 91 países com Very High Human Developement
Vejamos, ainda, um indicador muito significativo da coesão e da harmonia social: o Global AgeWatch - HelpAge International, que classifica os países de acordo com o bem-estar social e económico das pessoas mais velhas. Nesse Índice, Portugal, em 2015, está em 38º em 96 países do mundo, mas, quando a análise se circunscreve aos 19 países da Europa Ocidental, é o 3º pior, caindo 4 lugares desde 2013.
E podemos, ainda, consultar as perpectivas de pessoas em risco de no limiar da Pobreza em Portugal, segundo a EU
Em suma, as fotografias de Portugal no mesmo período contraditam-se, deixando o leitor em permanente suspeita sobre os dados, a sua recolha e o seu uso:
3. Consequências no discurso oficial
Eis, insolitamente, o que resulta do Relatório do Programa Nacional para a Saúde Mental de 2017:
Comentário governamental da situação: o secretário de Estado Adjunto e da Saúde garantiu ainda que Portugal tem um dos programas na área do foro mental “mais ambiciosos da Europa”, sublinhando que é um “dos mais bem vistos pela Organização Mundial de Saúde.”
Solução advogada: “o director do Programa Nacional para a Saúde Mental, Álvaro Carvalho, defendeu mesmo que o consumo de tranquilizantes em Portugal chegara a “níveis de risco para a saúde pública” e defendeu uma medida dissuasora – a diminuição da comparticipação estatal deste tipo de medicamentos”. Ou seja, as estatísticas desse consumo com receita médica descerão em flecha e a doença agravar-se-á, pois os doentes deixam de poder contar com ajuda em fase crítica…
Tudo isto, num mundo cuja população ultrapassou a marca dos 7,5 mil milhões, (v. World Population Clock, segundo dados das Nações Unidas, da Organização Mundial de Saúde e do Banco Mundial) e onde se prevê um crescimento até 11.184.367.721 em 2100. E onde estes números se desenvolvem na razão inversa dos recursos naturais…
Tudo isto num mundo cuja população tenta redefinir-se em termos de género, abandonando o tradicional binarismo (binómio clássico homem-mulher – cisgénero) para caminhar disforicamente num sentido de progressiva complexidade na subtilização da descoincidência entre género e sexo: de 8 para 71 géneros (em 2014, o Facebook dos EUA).
Tudo isto num mundo onde se elabora um Índice da Maldade (Michael Stone, da Universidade de Columbia, com 22 níveis, do mais brando ao mais cruel), inspirado nos círculos do Inferno de Dante e que inspirou série de sucesso (Most Evil) no Discovery Channel, índice divulgado em Portugal por obra homónima de Hernâni Carvalho (2017), que exemplifica com casos nacionais. Tema tão polarizador que dele se podem fazer listas intermináveis de antologias de textos (ex.: The Supernatural Index: A Listing of Fantasy, Supernatural, Occult, Weird and Horror Anthologies, 1995, de Mike Ashley e William G. Contento, que passa em revista a produção bibliográfica desde 1813, assinalando mais de 2100 antologias, mais de 7700 autores e mais de 21300 histórias.
Mundo onde também se vão criando alguns sinais de esperança, como máquinas de acelerar moléculas com possíveis efeitos no desenvolvimento de medicamentos e onde projectos como o Life Sciences, divisão de ciências da vida do antigo laboratório Google X (agora X Lab) se autonomizam, mantendo e anunciando potenciar os seus objectivos.
Mundo que, desde 1/Agosto/2017 (Earth Overshoot Day), vive de crédito, segundo o Global Footprint Network.
Enfim…
“Quero a Nau Catrineta, para nela navegar. Que assim como escapou desta, doutra ainda há-de escapar.”
Esperanças, há.
Em/para Portugal:
Um indicador é o projeto Global Shapers Lisbon Hub (lançado em 2013), patrocinado pelo Presidente da República, jovens em posições de liderança que prometem lutar por uma sociedade mais justa e igualitária. Conta com 25 membros em Outubro de 2017…
Outro são os prémios internacionais: de investigadores, de produtos, de projectos, de Festivais, de Cinema, de Fotografia, de selos, de designers, de médicos, de hoteis, de Concursos de ideias, de trabalhos, de Campeonatos, no Desporto, dos mais tradicionais e Olímpicos aos Paralímpicos e às Universíadas, etc.. E as patentes.
Mas, se, em 2009, o European Innovation Scoreboard atribuía o 16º lugar no ranking da inovação, com a 7ª maior subida nos 5 anos precedentes, em 2017, desce 2,4%
Em 2017, apresenta uma performance de “inovador moderado” desdobrada por itens, dos quais muitos com evolução negativa:
Outro sinal positivo são as redes de colaboração como a GPS - Global Portuguese Scientists, de entreajuda de cientistas portugueses pelo mundo.
Outro, ainda, as narrativas de documentários como “Portugueses pelo Mundo”.
Também o conhecimento do nosso cérebro poderá ajudar e também aí os portugueses se distinguem: desde o casal Damásio até Paulo Rodrigues, com o seu software que gera mapas 3D a partir da ressonância magnética do cérebro do paciente (v. Mint-Labs e Qmenta).
Ou a vinda a Portugal de The School of Life em 2017, sinalizando a atenção a vias alternativas de conhecimento e de estar no mundo, apesar dos valores elavadíssimos da inscrição no programa, da Web Summit, onde as startups portuguesas chamam a atenção (7 já estão no ranking das preferidas dos investidores).
Com uma perspectiva externa e transversal, acessível:
3 receitas fáceis e sem custos para o futuro:
a receita de “senso comum” da Islândia para a sua juventude, que ascendeu da mais flagelada pelas drogas ao 1º lugar no ranking europeu: um estilo de vida saudável;
a de Einstein: “Uma vida simples e silenciosa traz mais alegria do que a procura do sucesso num desassossego constante”, muitas vezes associada à convicção ““when there’s a will, there’s a way”;
a do sono reparador, em número de horas que permitam sonhar, contra a “crise de saúde pública” da sua falta, pandemia que mata lentamente.
Algumas sugestões, como a de 2h/semana para pensar (Two Hours Rule, uma ideia do blogger e designer Zat Rana) ou a fórmula dinamarquesa hygge para a felicidade ou, até, apps (Smiling Mind, p. ex.).
As startups portuguesas estão a chamar cada vez mais a atenção nos media
O Observatório das Cidades Culturais e Criativas, que defende a cidade cultural e criativa ideal na Europa como resultante da amálgama das cidades com melhor desempenho em cada indicador e que defende, também, a importância da criatividade e da cultura como operadores de prosperidade, posiciona muito bem cidades portuguesas entre 168 cidades em 30 países europeus nos dados de 2017
Bastarão estes sinais? Ou…
…a Nau perde-se no mar…