Passado um ano da realização do maior evento esportivo mundial, a constatação, do ponto de vista ambiental, é que mais uma vez fomos feitos de idiotas no Rio de Janeiro pela maioria dos políticos que, em 2009, prometeram e mais uma vez não cumpriram, a materialização dos tão desejados legados ambientais.
Simplesmente os tomadores de decisão brasileiros, eleitos pelas urnas eletrônicas, não tem um pingo de vergonha na cara. Isso é fato! Num país onde gravações e vídeos explícitos de corrupção ativa e passiva não querem dizer nada, para as muitas das esferas de fiscalização, o não cumprimento de ações existentes na matriz de responsabilidade olímpica não querem dizer absolutamente nada para partidos políticos que funcionam como verdadeiras organizações criminosas.
Voltando ao assunto ambiental que nunca foi, não é, e provavelmente continuará não sendo assunto prioritário para as autoridades brasileiras, aliás como a educação, saúde, transporte e segurança entre outros, chama a atenção para quem tem a tal "vergonha na cara", como nem as Olimpíadas com toda a cobertura da mídia internacional e pressão da mídia nacional, tenham conseguido uma vez na história desse país, colocar para funcionar a pesada, obesa mórbida máquina pública à favor do ambiente.
Os legados ambientais que ficaram para trás estão relacionados com os dois maiores passivos ambientais da cidade do Rio de Janeiro e da região metropolitana do Rio de Janeiro, respectivamente o sistema de lagoas da baixada de Jacarepaguá e a baía de Guanabara.
Ambos os passivos são o produto do histórico descaso público tanto com a ausência de políticas públicas voltadas para a habitação e ordenação do uso do solo como para a universalização dos serviços de coleta e tratamento de esgoto. Sob uma ótica bem resumida, a primeira ausência transformou-se numa fábrica de votos, onde direitos constitucionais de cada cidadão de baixa renda são transformados em favores eleitorais.
Na segunda ausência, na medida que os serviços cobrados e recebidos são executados geralmente por uma estatal, mesmo não entregando o serviço de coleta e tratamento de esgoto, a empresa continua recebendo, criando uma máquina inesgotável de dinheiro fácil, visto que se não pagar o tratamento não recebido, o cidadão não recebe a água. Como se sabe, sem água não se vive, mas sem esgoto se sobrevive. Coroando essa catástrofe típica de colônias de exploração do século XXI, soma-se a apatia da sociedade desnorteada por tantos escândalos como pela ineficiência da maior parte da estrutura fiscalizatória que parece estar sob um estado de torpor quando o assunto é o ambiente.
As lagoas da baixada de Jacarepaguá em menos de 80 anos foram transformadas de verdadeiro paraíso ambiental da cidade em cinco imensas latrinas onde periodicamente explosões demográficas de cianobactérias tóxicas contaminam e fauna residual existente, escoando durante o período de maré baixa para uma das praias mais famosas da cidade, a da Barra da Tijuca. Nesse caso de degradação explícita, do mais famoso ativo econômico-ambiental da cidade, isto é, a praia, aparentemente os cariocas incorporaram em sua rotina a degradação das águas e areias, não se importando muito em dividir as águas com coliformes, resíduos variados, cianobactérias ou demais microorganismos patogênicos mesmo que com isso estejam expondo sua saúde.
Não por outro motivo, em 2017, a etapa do campeonato de surf mundial foi obrigada à ser realizada em outro município com praias não contaminadas, visto que nos dois anos anteriores, fruto da péssima qualidade das águas, atletas passaram mal, vomitando, tendo diarréias, febre e etc.
No caso da baía de Guanabara, a falta de vontade política de resolver o problema passa no meu entendimento, pela malévola lógica da indústria da degradação onde de tempos em tempos os governos estaduais criam projetos faraônicos para a recuperação da baía obtendo de bancos internacionais algumas centenas de milhões de dólares que objetivamente nunca chegam a melhorar as condições ambientais da baía. Sem uma eficiente fiscalização e com a certeza mais do que cristalina da impunidade do mau uso dos recursos, gestores públicos "deitam e rolam" com os recursos públicos sem dar satisfação dos sucessivos fiascos ambientais, apelidados pela autoridades públicas como "equívocos técnicos". Nem mesmo quando fazem algo, mesmo de pequena ação geográfica, e inauguram como se fosse a chegada do homem à Marte, as autoridades locais não conseguem alcançar o objetivo ambiental desejado. Exemplo disso é o que acontece na Marina da Glória, onde depois de gastos 14 milhões de reais, justamente para livrar a marina, que foi a base náutica dos jogos olímpicos da chegada do esgoto, desde o fim das olimpíadas, as águas da marina continuam recebendo abundantemente esgoto e não acontece nada, além da chegada de mais esgoto ao custo de alguns milhões de reais.
Tombamentos por conta de órgãos internacionais como a Unesco, nada, simplesmente nada comove as autoridades brasileiras à trabalharem direito e dessa forma tanto no sistema de lagoas como na maior parte da bacia hidrográfica que chega na baía de Guanabara, praticamente todos os rios estão mortos por esgoto e resíduos de todos os tipos.
Vivemos numa cidade, numa metrópole do século XXI que continua tendo uma relação com o ambiente como se fosse a sede da colônia de exploração do século XVIII, onde leis, órgãos ambientais, representantes políticos, praticamente não tem servido para coisa alguma no sentido de reverter o cenário de barbárie ambiental que eu pessoalmente flagro e denuncio há mais de vinte anos. Continuamos vivendo na cultura do pau-brasi, ou seja, desde que dê lucro, pode-se degradar até a extinção de um ou do conjunto de recursos naturais explorados.
Normalmente as autoridades sempre tem a resposta pronta em relação aos problemas ambientais sem solução, informando ao distinto público pacato e ordeiro, quase apático, que é por falta de recursos financeiros que esses problemas se perpetuam, esquecendo que num lugar sem qualquer prioridade, a política do "pão e do circo" tem prevalecido sobre as chagas ambientais locais e nacionais.
Como exemplo disso, com os recursos utilizados para preparar exclusivamente o estádio do Maracanã para a copa do mundo, por volta de um bilhão e seiscentos milhões de reais, teria sido possível recuperar não só todas as lagoas como todos os rios, transformando a região num imenso parque temático ambiental que beneficiaria potencialmente um milhão de cariocas, tanto do ponto de vista econômico, ambiental e socia.
No entanto, nossos líderes, eleitos pelas urnas eletrônicas têm optado historicamente por intervenções mais rentosas e menos sustentáveis e dessa forma hoje, o estádio apresenta-se abandonado, o mesmo destino de lagoas, rios e baías.
Esse é o Brasil, um país sem prioridades e sem futuro.