“A imagem é subjectividade”; Sartre, A Imaginação

Todos aqueles que se debruçaram sobre o problema da imagem aperceberam-se do primado formal daquilo que se poderia chamar um super- espaço subjectivo. Sartre reconhece esse carácter qualitativo da imagem quando afirma que “estamos num mundo de representações. O critério passou a ser o acordo das representações entre si. Estamos, assim, desembaraçados do realismo ingénuo” (SARTRE: 1936:85) ou quando conclui que “A imagem é consciência de alguma coisa” (ibidem).

De facto, para Sartre a imagem não se confunde coma percepção, nem com a “coisa”, existe na medida em que se conhece; como refere Maria Noel Lapoujade referindo-se a Sartre “ Cuando evoco una imagen es preciso describirla tal como aparece a la reflexión. `qué muestra la reflexión?

Fundamentalmente la *cualidad posicional de la imagen* (LAPOUJADE : 1998: 123) ; mas mais do que esta qualidade posicional, do que a qualidade intencional da imagem, a imagem é consciência na concepcção sartreana. Para Sartre a consciência do mundo está carregada de imaginário, sempre que se apresente como uma superação do real. Daí a função interrogativa da imaginação, a função de representação, um trabalho que se conjuga com a memória (também Ricoeur sublinha isto mesmo numa das suas últimas obras publicadas: Mémoire, Histoire, Oubli) e a actividade anticipatória da imaginação, pois ela move-se no âmbito do possível e como tal promove uma função libertadora.

Secundando Lapoujade, quando afirma que, apesar disto, “nos queda aún otro trecho por recorrer, porque una de las posibles activiades de la imaginación consiste en `proponer mundos alternativos´” (ibidem) constrói-se esse espaço laboratorial do imaginário. Um verdadeiro laboratório, como sublinha Paul Ricoeur, salientando o papel das narrativas literárias, parasitas do imaginário, na construção dos sujeitos leitores.

Para Ricoeur, autor de De l’Interprétation. Essai sur Freud (1965), os símbolos do arcaico, do sonho e da infância são os mesmos que representam a nossa imaginação criadora, a nossa aventura espiritual e que representam a projecção das nossas possibilidades. Assim, criação e escatologia reflectem-se na dialéctica reflexiva descrita como “l’horizon de mon archéologie” e “horizon de ma teleologie”, conceitos que serão retomados mais tarde.

Segundo o filósofo, é apenas no movimento da interpretação que nós percebemos o ser interpretado. Assim sendo, uma reforma da consciência só poderá realizar-se quando se descobrir na própria natureza do pensamento reflexivo, uma experiência dialéctica fundamental. Esse esforço e desejo de ser, essa reflexão concreta implicará uma arqueologia e uma escatologia da consciência, no sentido de ter os ouvidos no passado e os olhos no futuro, numa metavida que nos faz desejar ir para além de nós, e transformar a nossa condição humana. Então ficará claro que a experiência hermenêutica da verdade é a experiência da auto-compreensão humana: simbólica e dialéctica.

Bibliografía

DURAND, Gilbert, ( 1989) As estruturas antropológicas do Imaginário,Lisboa, Ed.Presença.
LAPOUJADE, Maria Noel, ( 1988) Filosofía de la Imaginación, Mexico, Siglo veintiuno.
RICOEUR, Paul, ( 1984) Temps et Récit II, Paris, Seuil.
SARTRE, Jean Paul, ( 1940) L`Imaginaire, Paris, Gallimard.
SARTRE, Jean Paul, ( 1936) A Imaginação, ( trad.Manuel João Gomes),Lisboa, Difel.
WUNEMBURGER, J.J., ( 1999) “Lo imaginario en la filosofia francesa contemporãnea” in Primer coloquio Internacional sobre espacios imaginários da universiad nacional autónoma do México, México, UNAM.