Diversidade é o tópico mais recente das discussões acesas das mesas de café e dos plenários públicos. Ainda que seja motivo de preocupação e reflexão constantes, somente quando se dá um evento que destaque o problema da diversidade é que este volta a ser centro de ponderações sérias. Pondera-se a multiculturalidade, avalia-se o preconceito e a marginalidade, as minorias e o poder da globalização. Aconteceu assim com a cerimónia anual dos Óscares do presente ano. A falta de diversidade nas escolhas para os candidatos preocupa gregos e troianos. Uns pela falta de multiplicidade por entre estas seleções, questão que conduzem maquinalmente a abordagens sobre a igualdade, o racismo ou a xenofobia; outros percebem que só o ato de erigir estas questões revela também preconceito e incitação ao conflito (veja-se a afirmação de Charlotte Rampling sobre a situação) por parte dos – alegadamente - ostracizados. Bom, seria de esperar uma avaliação imparcial e profissional dos candidatos aos Óscares. Estaremos a levantar problemas onde eles não existem? Foi apenas um mero acaso? Os tópicos de avaliação são os mesmos independentemente do tom de pele dos candidatos. Terá esta questão mais a ver com lóbis e competência do que com diversidade? Temos soldados dos dois lados das trincheiras.
Analisemos a questão no setor da moda. Segundo o website Business of Fashion, durante a coleção de Outono/Inverno de 2015, 80 por cento dos modelos que caminharam pelas passerelles das quatro semanas de moda mais importantes do mundo eram de raça branca. Na coleção anterior a percentagem tinha sido de três percentis abaixo. Ainda que de forma quase impercetível, denota-se um melhoramento e não um agravamento. Em capas de revistas e campanhas publicitárias os números são mais aterradores. Em 2014, um estudo feito em 44 revistas com grande relevância no mercado, demonstra que noventa por cento dos modelos seriam de raça branca. Escandaloso! Porquê? Porque o perfil dos consumidores do setor da moda revela-se cada vez mais diverso e multicultural. Atualmente, os consumidores asiáticos e africanos são os maiores investidores no segmento do luxo, por exemplo.
Existe, então, algum motivo para as marcas de moda continuarem a afastar-se da diversidade racial e cultural quando delineiam as suas estratégias comunicacionais? Os consumidores são cada vez mais plurais e diversos. Deixando-se de parte a ideia de que a Europa e a América são os consumidores-alvo da indústria da moda, deveria investir-se numa comunicação mais diversa e adequada às realidades circunstanciais. O facto de ainda se venerar o quimérico de beleza sustentado por ideias estéticos ultrapassados e obsoletos revela que as nossas mentes aclamem encarceradas. Anuem a estes arranjos públicas, de insensibilidade moral e ética sem poder sair de marcha. É tão fácil definir um padrão, uma regra e bater baquetas para todos marcharem ao mesmo ritmo.
Numa época em que as marcas se preocupam – estrategicamente, não se iludam – com a responsabilidade moral, com a ética e com a sustentabilidade ambiental porque é que não se manifestam também contra a imposição de cânones inconscientes e injustificados? Preceitos que vão contra os princípios da igualdade, da ética e da moral, da justiça e da veracidade. Não podemos fazer nada? Pois parece-me, se a mim me poderá parecer alguma coisa, que tão mau é a aceitação de quem se encaixa nestes ideais, como de quem reconhece a sua diferença e se marginaliza aceitando as condições impostas pela máquina industrial. Já passamos o tempo em que a moda refletia posições políticas e morais, gritava bem alto e dava pontapés no que se punha no seu caminho. Vivienne Westwood, volta. A impotência sempre foi um problema. O trabalho escravo infantil, a falta de condições laborais, os discursos que só se baseiam na forma e se esquecem do conteúdo, são motivo de preocupação para alguns. Mas só para alguns. Para outros a moda continua a ser um artifício de motivação individual e egoísta. Não se coloca a questão de sermos todos da mesma raça ou falarmos todos a mesma língua. A questão que deverá vir ao de cima é a oportunidade e o preconceito. Descartar alguém baseado apenas no seu tom de pele reflete ainda o pensamento faccioso, castrador e ditador de muitas marcas. E nós continuamos num marasmo de impotência.
Pensamos não haver nada a fazer. Recorrendo ao pensamento de Hans Magnus Enzensberger, inspirada na ideia da direção editorial do Jornal Público sobre a crise política em Portugal, o poeta alemão ressurge-se contra o célebre e cómodo “Não há alternativa”. O não haver alternativa é um insulto à razão. É assim que resolvemos serenamente as questões dentro da consciência individual: não podemos lutar contra esta maré portanto vamos deixar-nos guiar pela corrente. A bolsa oscila mas as vendas continuam. Porque não conseguimos manter uma posição ideológica quando o que está em jogo é o desejo versus a responsabilidade moral. Esta escolha é problemática. Meus senhores: Terramoto de 1755 em Lisboa. A maré revolta-se e quando dermos por ela deixará apenas um rasto de destruição na retaguarda. Mas nós continuamos num marasmo de impotência.