Se você pudesse viajar no tempo, iria para o passado ou para o futuro? Aposto que você esboçou um sorriso em apenas imaginar como seria, e qual seria o seu destino. É fascinante imaginarmos poder viver em qualquer época da história, testemunhar os grandes acontecimentos, reviver as emoções da juventude ou dar uma espiadinha no futuro.

O cinema captou esse fascínio e o transformou num gênero de filmes, ou num subgênero, como alguns críticos o classificam, da ficção científica. Acredito que o tema da viagem no tempo vai além, com grandes filmes que vão da comédia ao drama, do faroeste ao romance, do filme de aventuras aos filmes de super-heróis.

Não só o cinema vem se valendo dessa matéria, mas a televisão o vem fazendo há anos. As séries de streaming e até novelas brasileiras tiveram o tempo com base de algumas de suas histórias. Desde a década de 60, estivemos expostos a esse tipo de narrativa.

Em 1960, o livro clássico de H. G. Wells “A Máquina do Tempo” já fora adaptado ao cinema, e teria uma nova versão em 2002. Mas com certeza, alguns cinquentões de hoje lembram-se do “Túnel do Tempo” (Time Tunnel), série de duas temporadas e trinta episódios, na qual dois cientistas viajavam ao passado e vivenciavam episódios marcantes da história, como o naufrágio do Titanic, a Guerra de Tróia, o ataque a Pearl Harbour ou, viajavam ao futuro, nos episódios menos inspirados da série. Comparado às séries e filmes de hoje, o “Túnel do tempo” era muito tosco na sua produção, mas estamos falando dos anos de 1966 e 1967 (só chegaria a TV brasileira na década seguinte).

O ano de 1968 foi um marco para a ficção científica no cinema com dois clássicos de todos os tempos: “2001 — uma Odisseia no Espaço”, e “O Planeta dos Macacos”. Este, contando a história de astronautas que viajam por acidente ao futuro e descobrem um planeta dominado por uma sociedade de macacos inteligentes, falantes, onde os seres humanos são tratados como animais. O astronauta protagonista, Taylor, descobre que esteve sempre no planeta Terra, dois mil anos no futuro, numa cena que é um dos plot twists mais geniais do cinema.

O filme daria origem a quatro outros filmes em sequência à história, que passeiam pelo passado e futuro, e contam como a civilização humana foi suplantada pela civilização símia. Essa história, na verdade, já rendeu 10 filmes desde o original de 1968 até ao mais recente de 2024.

Na década de 80, as viagens no tempo explodiram no cinema, talvez como reflexo de uma busca da comunidade científica por uma explicação física e matemática que comprovasse a possibilidade de tal feito. Enquanto os cientistas quebravam a cabeça, os roteiristas e diretores de cinema consolidavam o gênero.

Em 1980, um dos filmes mais românticos do cinema explora o amor que quebra barreiras temporais em “Em Algum Lugar do Passado” (Somewhere in Time). O romance e as relações pessoais através do tempo também foram tema de filmes que tiveram como pano de fundo a viagem no tempo. “Peggy Sue, seu passado a condena” (Peggy Sue Got Married) de 1986 foi a investida do renomado diretor Francis Ford Coppola no gênero. Na história, Peggy Sue, mãe de família em processo de divórcio, volta ao tempo da high school, onde começou a namorar seu ex-marido. Agora, com a maturidade de uma mulher adulta e com a experiência do casamento e do divórcio, ela vê seu mundo e seu futuro de uma forma completamente diferente. Uma mistura de drama, comédia e fantasia.

Dois outros clássicos do cinema e ícones da cultura pop dos anos 1980 tiveram em suas histórias a viagem no tempo como elemento fundamental. Em 1984, um jovem diretor chamado James Cameron nos brindou com “O Exterminador do Futuro” (The Terminator), um thriller de ação em que um robô assassino é enviado do futuro ao tempo presente para eliminar a mãe do líder da guerra entre humanos e máquinas, evitando assim que ele nasça e que vença a guerra. Porém esse filho é fruto da relação entre ela e o soldado humano enviado do futuro para protegê-la do robô assassino. O filme catapultou a carreira do pouco conhecido Arnold Schwarzenegger.

O paradoxo temporal está na base do conflito de todos os filmes do gênero. O que nos leva ao maior deles, na minha opinião, e já citado em outro artigo como um dos meus filmes perfeitos. Falo de “De Volta para o Futuro” (Back to the future) de 1985.

Back to the future marcou uma geração de amantes do cinema. Aventura, drama, suspense, fantasia, romance, é difícil caracterizar esse filme. Tem de tudo, e em especial um protagonista, Marty McFly, interpretado por um dos atores mais carismáticos da história do cinema, Michael J. Fox. O roteiro é uma delícia, com reviravoltas até o último instante, e a realização do Robert Zemeckis é magistral.

O gênero é tão propício a boas histórias no cinema, porque consegue transportar-nos a mundos e épocas através da fantasia. Não importa o meio que a história utiliza para o “transporte”. Pode ser um laboratório altamente tecnológico, um foguete interestelar, ou mesmo um carro, um armário, um pensamento ou uma caverna. Não há explicação lógica nesses filmes. Mas quem se importa com isso? Queremos é perceber como os protagonistas irão resolver os conflitos e paradoxos e regressar a seu tempo. Como Marty McFly fará para que sua mãe não se apaixone por ele, e sim pelo seu pai no futuro? Como o exterminador será impedido de criar o próprio futuro de onde vem? Não vale racionalizar, não vale buscar explicações, o que vale é deixar-se levar pela fantasia.

O gênero voltou forte nos últimos anos, no cinema e na TV (streaming) com séries como a americana “Outlander” (2014), a alemã “Dark” (2017) ou a Coreana “O tempo traz você para mim” (2023). No cinema, não posso deixar de citar o “Interstellar” do Christopher Nolan de 2014 que, apesar de não tratar do clássico enredo de viagem no tempo, é um filme sobre o tempo e sobre teorias científicas possíveis que explicam a passagem do tempo em ritmos diferentes. Vale incluí-lo.

No campo do enredo tradicional, mas nem tanto, está um filme simples, mas genial chamado “Uma Questão de Tempo” (About Time), de 2013, de Richard Curtis. É uma comédia romântica em que o protagonista, Tim, tem o dom de voltar no tempo sempre que precisar. Um dom possuído pelos membros masculinos de sua família. Tim é apaixonado por Mary e usa o seu dom para que ela se apaixone por ele numa série de situações cômicas e dramáticas, sempre “consertando” o passado recente ao seu melhor interesse.

Consertar o passado também é tema de “Os Vingadores — Ultimato” (Avengers – Endgame) de 2019, em que os super-heróis voltam ao passado para impedir a morte de seus companheiros na batalha anterior. O “Super-Homem” (Superman) original de 1978 já fizera com que a Terra girasse ao contrário para retroceder o tempo e impedir a morte da Lois Lane. Não é de hoje que a manipulação do tempo nos fascina tanto. O poder de voltar no tempo e fazer diferente abre margem para uma fantasia sem limite. Ir ao futuro e espiar o “como será” também é tentador.

O tempo está aberto à criatividade e à imaginação de autores e realizadores. Em todos os meios de narrativa de ficção, sejam eles na literatura, teatro, cinema e televisão temos exemplos de boas histórias. Até as novelas brasileiras ganharam sua história de viagem no tempo. Em 2018, “O tempo não para” foi uma divertida história de uma família que fica congelada por mais de 100 anos e “descongela” nos dias atuais. O choque cultural, a admiração pelo mundo novo e as relações entre os personagens do passado e do presente foram a base para a construção de uma novela leve e divertidíssima.

Na fantasia, vale tudo, ou quase tudo. Mesmo essas histórias de viagens no tempo têm suas regras: “não altere nada do passado”, “não encontre consigo mesmo”, “não traga nenhum objeto do passado ou futuro”, são todas regras criadas pelos roteiristas para gerar conflitos narrativos e adversidades para os protagonistas. Na realidade, só temos conhecimento que o tempo caminha numa única direção, mas na fantasia essa estrada tem dois sentidos, atalhos e bifurcações.

Ao final, chego a perceber que gênero está na base da proposta mais original do Cinema: a magia. Aproveitem o show e, quem sabe, nos reencontramos a qualquer tempo.