O avanço tecnológico, nas últimas três décadas, é quase sobrenatural. E é simplesmente impossível imaginar-se, nos dias de hoje, sem laptop, celular, internet e outras maravilhas que facilitam nossas vidas. Para o bem, é formidável. Mas quando usadas sem critérios, os resultados são, no mínimo, decepcionantes.
Sim, comecei falando de tecnologia mas para chegar ao…futebol. Esporte que tem milhões de apreciadores em todo o planeta. Uma verdadeira indústria que movimenta bilhões e bilhões de euros, as mentes e os corações de torcedores, investidores, atletas.
25 atrás, para se acompanhar uma partida, em tempo real, era preciso ir ao estádio ou estar com a TV ou o rádio ligados. Hoje há muitas outras plataformas que permitem assistir ao jogo em qualquer lugar. E se há quase três décadas era nos jornais e revistas que se sabia detalhes escritos da partida, hoje isso é possível em tempo real pelas redes sociais. Aqui que quero chegar.
As redes sociais são muito populares, especialmente entre os mais jovens. Muitos deles sequer eram nascidos quando craques como Pelé, Garrincha, Eusébio, Rivellino, Zico, Maradona, Romário ou mesmo Ronaldo tiveram seus auges. E, por não tê-los visto jogar, juram que estes atletas não repetiriam seus desempenhos no futebol atual. Parece piada virtual, mas é real. Francamente…
Quando o homem chegou à lua, em 1969, Pelé era o rei do futebol. E o computador de bordo da Apollo 11, a nave que levou os três astronautas norte-americanos ao satélite natural da Terra, tinha menor capacidade de processamento que o smartphone que você usa diariamente. Mas, para aquela época, isso era uma tecnologia surreal.
Imagine sair da órbita terrestre em um aparelho cujo controle é mais inseguro que um celular que você usa para enviar mensagens e receber vídeos e fotos, situações básicas neste exato momento? Hoje isso é impensável, assim como acho também impensável, e até desrespeitoso, que digam que os jogadores que citei acima não fariam sucesso hoje.
Para começo de conversa, se hoje temos futebol devemos isso aos desbravadores que, corajosamente, arriscavam até suas vidas para praticar o esporte. Em seguida lembremos que a bola dos tempos de Pelé, Zico e Eusébio, quando molhada, chegava a pesar quilos.
O mesmo acontecia com as camisas e chuteiras. Estas tinham pregos. Isso mesmo: pregos que chegavam a ferir e sangrar os pés dos jogadores. Isso sem falar no gramado de jogo: nas fotos e vídeos que hoje encontramos facilmente no youtube, vemos os jogadores correndo em verdadeiras piscinas enlameadas. Isso me faz lembrar o jogo final da Taça Intercontinental de 1987, entre Futebol Clube do Porto e Peñarol, vencida pelo clube português por 2 x 1. Os atletas jogaram debaixo de neve e quase não se via a bola, um pontinho amarelo que, vez por outra, aparecia na tela da TV. Será que Cristiano Ronaldo, Messi, Di Maria, Haaland se sujeitariam a jogar nestas condições? Pois era o que se tinha antigamente e não se podia recusar a jogar.
Outro detalhe: além do material esportivo e arenas de jogo, o que dizer da preparação física, alimentação e recursos clínicos antigos? A maioria dos jogadores encerravam suas carreiras aos 33, 31, 30 anos e até menos idade.
Uma cirurgia no joelho deixava o sujeito longe dos gramados por seis, oito meses. A alimentação era quase a mesma de uma pessoa comum. Isso para não falar nos salários e o status social, infinitamente menores que os atuais. Hoje Messi ganha, em um dia, o que Maradona jogou meses ou anos para receber, só a título de comparação entre os dois gênios argentinos.
Hoje, Cristiano Ronaldo, aos 39 anos e Messi aos 36 ainda jogam em alto nível, mesmo distantes do competitivo futebol europeu. Cristiano tem aparelhos fabulosos de treinamento, como uma esteira usada pela Nasa, dentre outros.
A bola é leve e não encharca, assim como as camisas dry fit. É claro que ele e Messi são acima da média e fora da curva e jogariam no futebol de anos atrás, mas será que com o mesmo desempenho e sem todo o aparato de que dispõe hoje?
Voltemos agora a Pelé. Ele marcou 1283 gols em 1363 jogos (contando com amistosos não-oficiais). Imagine quantos gols ele marcaria hoje com a alimentação, os treinos, o material esportivo, os gramados excelentes e toda a badalação que envolve o futebol, um verdadeiro reality show?
E Maradona? Há vídeos em que ele não está sendo marcado. Nas imagens, ele é simplesmente atacado: agarrado, pisado, chutado, derrubado. Não havia sequer o VAR e valia, unicamente, a interpretação do árbitro. Pelé, Maradona, Zico, Eusébio, todos sofreram nas mãos, e nos pés, de adversários nem sempre leais. Mas ainda assim deixaram um legado de genialidade e elevaram o futebol ao patamar de arte.
Por fim, a turma que diz que os jogadores das antigas não jogariam hoje: grande parte desses “experts” nasceram nos últimos…14 anos ou menos. Não tiveram a chance de ver, ao vivo, a poesia nos campos. Muitos deles nunca foram a um estádio de futebol.
Tudo o que sabem é o que veem nas redes sociais, pois não assistem TV, não leem jornais, livros. No máximo, repetem o que os colegas de grupos virtual também repetem. E isso sem nunca terem chutado uma bola na vida, a não ser em joguinhos eletrônicos.
São estes os “formadores de opinião” que julgam saber mais que um Rivellino, hoje comentarista em programas esportivos e que, ao todo, já dedicou cerca de 80% da vida dele ao futebol, treinando, disputando centenas de partidas por clubes e Seleção Brasileira, e agora analisando.
Devemos, é claro, respeitar todas as opiniões. Mas é impossível não nos divertir com os “craques das redes sociais” que acreditam que o futebol foi inventado em 2010, quando nasceram. É isso aí: bola pra frente que o show não pode parar.