Comida é muito mais do que apenas uma necessidade, é uma expressão cultural e emotiva, definitivamente, um ato de amor. No entanto, em muitas cozinhas profissionais, a pressão e o ambiente intenso têm levado a uma rotina marcada pelo estresse. Ao discutir informalmente com colegas cozinheiros, chegamos a conclusão que na maioria das vezes não comemos um prato feito com amor, mas sim com ódio, muito ódio!

Ao longo dos anos, programas de TV e filmes têm retratado a vida nas cozinhas profissionais de maneira dramática, com chefs autoritários gritando e insultando suas equipes em busca da perfeição. No entanto, é importante compreender que este retrato não é a realidade de uma culinária saudável e sustentável. A comida é um elo que une pessoas, como uma forma de transmitir sentimentos positivos, e é nesse contexto que a noção de cozinhar sem ódio ganha destaque.

Quantas vezes já testemunhamos chefs de cozinha a gritar, tal como no aclamado programa de TV "Hells Kitchens". A série de televisão é um exemplo marcante dessa representação exagerada da culinária, onde o caos e a hostilidade são destaque. Esses programas podem proporcionar entretenimento, mas é crucial separar a ficção da realidade. Outro exemplo é a série “The Bear”, um fenômeno atual que retrata o caos na vida dos personagens misturado com a uma cozinha descontrolada.

Em um trecho de um famoso vídeo, o chef Anthony Bourdain explana que muitos cozinheiros são alcoólatras porque não conseguem entender como o mundo exterior não funciona como o universo dentro da cozinha profissional, onde tudo é sistematizado, preciso e cronometrado. Este tipo de comentário evidencia a rigidez e exigência que esta profissão impõe. Enquanto no filme “O Menu” mostra de maneira explícita o esgotamento mental dos funcionários da cozinha, onde todos carregam muitos traumas e fizeram inúmeros sacrifícios buscando reconhecimento. Aliado aos filmes e séries, há um novo formato de entretenimento que tenta pelo humor gerar engajamento: os "memes da internet”. A sua maneira, glorificam uma vida massacrante e perturbada, sempre dizendo que é preciso gostar do calor, do barulho, dos conflitos e da competição.

A vida nas cozinhas profissionais, geralmente, tendem a ser exaustiva fisicamente, carregada emocionalmente, repleta de sentimentos e lembranças ruins. Esta profissão é muito penosa, paga pouco e não traz benefícios à saúde, pelo contrário, acarreta muitas sequelas e traumas psicológicos. Fomentar este tipo de comportamento só tende a piorar a sociedade, levando para casa e para a rua todo esse ódio. Devemos conscientizar-nos e buscar informações para melhorar o local de trabalho. É evidente que em um ambiente harmônico, obtemos melhores resultados, além de oferecer a facilidade de direcionamento da equipe e das atividades. É importante salientar que, além da falta de respeito, há ainda, muito preconceito ligado ao sexo, a cor, a naturalidade, entre outros. Este é um problema crônico que está enraizado em diversas culturas, afortunadamente, vivemos em uma época onde crescem a quantidade de movimentos que buscam equalizar essas diferenças para acabar com a discriminação.

Paralelamente à esta carga negativa, procuro acreditar numa cozinha onde não há necessidade de uma guerra, onde não precisa haver tanto ruído. Não significa que não haja calor e barulho, mas ter uma equipe instruída onde o ambiente de trabalho proporcione respeito, igualdade de crescimento, estreitar o relacionamento da equipe e cooperativismo, tende a criar uma atmosfera de trabalho com benefícios físicos e mentais. Estes fatores tendem a diminuir a evasão de profissionais, aumentar o comprometimento da equipe, melhorar a execução das atividades, aumentar a lucratividade e otimizar o tempo.

É fundamental reconhecer que a comida, quando preparada com amor e dedicação, tem o poder de criar experiências memoráveis. Ou seja, a comida não deve ser feita com ódio! É necessário reconhecer a importância de uma abordagem mais tranquila e harmoniosa na culinária, onde a paixão e a positividade sejam os ingredientes principais. Ao fazermos isso, não apenas criamos pratos excepcionais, mas também promovemos um ambiente de trabalho saudável e sustentável, onde a comida se torna uma expressão de amor e conexão.