O rei Arhur é uma personagem de grande importância para o folclore britânico. Apesar de não se ter comprovação de sua existência, esse rei traz importantes lições para o ser humano do século XXI. Mergulhado em uma era digital e de pouca preocupação com o outro, o homem atual precisa aprender um pouco mais com essa figura lendária. Vejamos abaixo algumas lições.

Humildade

Apesar de ser um rei poderoso – era o governante da Grã-Bretanha –, Arthur procurava não se valer de sua posição para conseguir o que queria. Um exemplo disso é o modo utilizado por ele para conquistar Guinnevere. Disfarçando-se de ajudante de jardineiro, ele se subjugou a ela e até mesmo a desconhecidos que lhe davam ordem. Seguindo o ideal cristão do serviço, ele se colocou sob suas ordens e só depois de muito tempo se revelou a ela como rei.

Outra prova de humildade dele é a sua ligação com Merlin, ao qual sempre ouvia de bom grado.

Tão belo quanto o exemplo do rei é o de Sir Gawaine que, para ajudar o rei a cumprir sua palavra a uma anciã, aceitou casar-se com ela para que o monarca não sofresse as consequências de desonrar um trato. A recompensa por seu ato é revelada logo após.

Confiança

Confiança mútua é algo raro que, em tempos tão volúveis e incertos, se torna quase impossível. Golpes de diversos tipos, ofertas enganosas a todo tempo, soluções milagrosas são a tônica de uma sociedade cada vez mais egoísta, em que o outro apenas serve para que os interesses individuais se realizem.

O mesmo não acontece nesse livro que retrata a Idade Média. Os cavaleiros e os súditos confiam no rei e vice-versa. Por exemplo, em uma luta entre dois cavaleiros, aquele que perdia se submetia ao vencedor e lhe cumpria a vontade. Isso ilustra o poema de Camões Amor é fogo que arde sem se ver, em que diz: [...] é querer estar preso por vontade; é servir a quem vence, o vencedor.

Em uma sociedade que apenas valoriza a vitória, a felicidade, reconhecer-se vencido por alguém, submeter-se ao outro por vontade é quase uma afronta.

A confiança em Deus e na providência divina é outro ponto que se deve destacar. E a retirada da espada ilustra bem esse ponto, pois, quando a Grã-Bretanha se encontrava em situação delicada sem um rei que a pudesse governar, foi confiada a Merlin a missão de encontrar um rei. E foi por meio desse desafio que Arthur – filho de Uther Pendragon, mas criado longe do reino – se tornou o rei esperado, mas não sem uma boa dose de desconfiança.

Porém, quando confiaram na Proviência, tiveram toda a sorte de um rei digno, bom, justo e cavalheiro.

Coragem

Rei Arthur e os cavaleiros da Távola Redonda sempre se demonstram corajosos – alguns talvez se exacerbem nessa virtude e a transformem em temeridade, como foi o caso de Sir Pellias.

Normalmente, no entanto, quando percebem uma situação de injustiça, buscam resolvê-la e não se acovardam, mesmo se o desafio parece difícil. É antológica a luta do Rei Arthur contra o Cavaleiro Negro que nem sempre era justo em suas lutas e que é vencido pelo monarca britânico sem que este se valesse de qualquer intervenção de Merlin.

O rei o vence de maneira completa, mas não o desonra e mostra todo o seu cavalheirismo nessa hora.

Cavalheirismo

O cavalheirismo não é simples manual de boas condutas, mas um modo de vida, como nos mostra o genial C.S. Lewis1.

O cavaleiro é um homem de sangue e ferro, um homem familiar à visão de rostos despedaçados e restos rasgados de membros decepados. Ele também é um convidado acanhado, quase tímido, no salão, um homem modesto, gentil e discreto. Ele não tem compromisso com um meio termo entre a ferocidade e a mansidão. Ele é absolutamente feroz e absolutamente manso.

Esse ideal parece nos escapar nos dias hodiernos. Egoístas e fracos, não resistimos a pequenas adversidades, desesperando-nos, ao passo que, em meio a duras batalhas, ou mesmo quase morrendo, os cavaleiros reuniam forças e lutavam até o final, não se entregando de forma alguma.

Em relação ao trato com as damas e senhoritas, sabiam ser gentis e corteses, não fazendo distinção de classe, de beleza, de idade. Eles sempre buscavam tratar delas com a devida reverência.

Hoje, infelizmente, há quem considere o cavalheirismo uma forma de machismo, pois não entende o real significado desse modo de vida em que a mulher é valorizada não como uma mercadoria descartável, mas como alguém que tem consigo algo especial: a vida. E justamente por isso ela merece todo a reverência, todo carinho e todo cuidado que um cavalheiro possa dar.

Em tempos tão difíceis como estes em que vivemos, é preciso buscar a nossa vocação de reis, mas não aqueles que são servidos, e sim, o que servem. Vale, portanto, a pena lembrar a pergunta que o brilhante Howard Pyle2 nos coloca sobre o espírito real de Arthur: o que mais posso fazer para que o mundo seja melhor por causa de meus esforços?

Se assim passarmos a agir, com certeza, resgataremos um pouco da beleza do modo cavalheiresco de Arthur e teremos uma sociedade um pouco menos egoísta e um pouco melhor para se viver.

Notas

1 Lewis, Clive Staples. A necessidade do cavalheirismo.
2 Pyle, Howard. Rei Arthur e os cavaleiros da Távola Redonda. Rio de Janeiro: Zahar, 2015.