Viver a vida aproveitando tudo o que ela oferece, curtindo e usufruindo o máximo, frequentemente é o objetivo das pessoas. É um propósito que começa desde cedo, um comportamento aparentemente espontâneo, mas na verdade incentivado da infância à vida adulta, com tudo conspirando para a conquista de resultados vantajosos e afirmativos. Essa diretriz que é uma norma, praticamente uma regra, encontra obstáculos, exceções, que mesmo sendo raras podem transformar o pretendido por influência de outras variáveis e contextos. É o impedimento que vemos, por exemplo, quando se nasce em época de guerra, ou em meio a catástrofes climáticas como terremotos e vendavais, ou durante epidemias e também quando se nasce em bolsões de miséria, sujeito a abandono, fome e desabrigo. O que determina bem-estar ou mal-estar é variável, e são as condições de vida que estruturam ou desestruturam o humano.
Nascer é caminhar para crescer, tanto quanto é rapidamente exilar-se do mundo por falta de condições adequadas para sobreviver. Esses dados contextuais são estruturantes de vida assim como de morte. Quando a vida persiste e continua, a todo instante o sim e o não musicalizam o existente. É a batida constante de possibilidades e impossibilidades que cria sinfonias, ritmos, compassos e descompassos. Buscando amenizar e organizar, muitos educadores, incluindo-se aí pais, amigos e professores, orientam para conquista de resultados, para atingir objetivos. Esses propósitos quando realizados se constituem no que garante tranquilidade e satisfação. Eles acreditam e ensinam isso. Tudo é conduzido para o diploma, o certificado, ou até mesmo, em certos contextos, para ser mais exímio na suposta "arte de roubar e enganar" exercida pelos pais. Buscar bons resultados, ter os diplomas, as pós-graduações é tudo o que se quer. A continuidade desses processos constrói a máquina produtiva, o ser treinado, o robô. Esse indivíduo vive para conseguir, e conseguir é validado, ratificado pela titularidade necessária, pelo resultado econômico. É a selva de títulos, vantagens, referências e indicações.
Transformado em peça de jogo, resta ao ser humano procurar prazer no organizado de outra forma, talvez o "desorganizado que organiza..." e assim sobe nas cotações os opiáceos, os barbitúricos, as drogas lícitas e ilícitas, as religiões e meditações apaziguadoras. Sobram regras. Falta desregulamentar o indivíduo imobilizado, já despersonalizado pelas sinonímias apaziguadoras de sua curiosidade e espanto.
Nesse cenário nada é novo, salvo a falta de novidade, a mesmice, que quando constituída, questiona. Esse questionamento, porém, nada implica, pois tudo está reduzido às estacas que precisam ser atingidas ou às que devem ser evitadas. Grandes jogos em pequenos tabuleiros. É o "perde ganha", o "de grão em grão", que aniquila. O previsível é sempre desmotivante e acabar com a possibilidade de novidade é enrijecer o indivíduo na sobrevivência, por isso o "salve-se quem puder" quando é o orientador de condutas, é, paradoxalmente, o destruidor das possibilidades de humanização, não passando de orientações aniquiladoras que impossibilitam o humano. Viver para conquistar, para alcançar resultados pré-estabelecidos, para administrar impedimentos é um viver no qual se perde o espontâneo e, assim, até a respiração é mecanizada para sobreviver.