Uma festa da minha família não era digna se não tocássemos o famoso Disco do Coelhinho, como nós chamávamos o lendário vinil The Album da série de vinis Jive Bunny and the Mastermixers. Ninguém sabia as letras das músicas e nem o que elas queriam dizer, mas a melodia tinha efeito imediato: já nas primeiras notas todos os primos dançavam como se estivéssemos nos grandes bailes das Big Bands das décadas de 20 a 50, muito embora estivéssemos no final da década de 80. Foi exatamente o mesmo impacto melódico que senti quando meu marido compartilhou comigo um vídeo do YouTube há alguns anos. De pronto eu fiquei fascinada!
Do seu apartamento em Nova Iorque, sem emprego e seguindo os passos de Duke Ellington e Glenn Miller, grandes Big Band leaders e, de certa maneira, propondo uma espécie de «medley» à la Jive Bunny no YouTube, Scott Bradlee, pianista e jazzista, simplesmente viralizou por volta de 2009 quando Neil Gaiman, escritor britânico, tuitou o seu vídeo com clássicos dos anos 80 em formato vintage.
Primeiro solitário ao piano e depois acompanhado por amigos devidamente vestidos e mais recentemente liderando o coletivo artístico PMJ - Postmodern Jukebox, com diversos músicos e cantores, Scott Bradlee usa todo o seu talento ao piano e repertório compondo versões de diversas músicas, sobretudo pop. O efeito é como se Lady Gaga, Adele, Bruno Mars, Guns'N'Roses e outros tivessem sido colocados dentro de uma máquina do tempo e tivessem composto seus grandes hits em Jazz, Swing ou Soul. Sob a batuta de Bradlee, presente e passado são uma única camada temporal em compassos dançantes.
Além de surfar na onda do resgate de tudo o que é vintage, o sucesso de Bradlee também surfou em outras praias, que não apenas a da recriação musical. O modelo de negócios do PMJ é bem semelhante ao de uma start-up, o que mostra uma certa visão futurista da música. Ancorado, em um primeiro momento, em uma produção caseira com vídeos no YouTube, o sucesso viral demandou capital, conseguido em plataformas de crowdfunding e depois com mídia digital, venda de “discos” e shows. Coloco discos entre aspas porque a grande maioria da produção da banda é vendida em mídia digital. Certamente o PMJ é um case que serve de exemplo para uma inovação no mundo da música por diversos pontos de vista, o que me fascinou ainda mais.
A banda mantém um custo de produção relativamente baixo por veicular suas composições pelas redes sociais e por se valer de estrutura itinerante. Diferentemente de bandas de rock, por exemplo, os integrantes são rotativos, o que sustenta uma agenda insana de quase 128 shows até o momento este ano em todos os continentes. Ao mesmo tempo, todos conseguem manter uma qualidade e energia no palco como o que vemos nos vídeos online. Mas não pense que o preço é low budget... o ingresso do primeiro show deles em São Paulo não saiu por menos de R$440,00!
Por fim, eu não poderia deixar de ressaltar a sagacidade do líder da banda, pois, enquanto outros artistas demoram anos para lançar novas músicas, ele, por se valer de um estoque quase que infinito de músicas, consegue rapidamente fazer suas recriações e manter o padrão de postagens diárias e músicas novas uma vez por semana, o formato fast-food das novas mídias. Assim, seus fãs estão sempre saciados nos cliques diários do coraçãozinho do Instagram e do play no Youtube enquanto voltam no tempo embalados por melodias vintages cantando as músicas que tocam nas rádios. Como não aplaudir?