Quando ouvimos algo ou alguém experienciamos uma sensação de preenchimento. As ondas sonoras envolvem-nos e estimulam reações, emoções e pensamentos. Seja pela simples musicalidade de um determinado som ou pela interpretação do conjunto de sons que compõem determinada mensagem: as palavras. Somos diariamente recetores ( e também emissores ) de uma infinita coleção de sons que compõe o mundo que nos rodeia.
O espaço possui similar condição de diálogo para connosco. A sua matéria, escala e volume determinam a mensagem a comunicar – o programa. Da conceção de uma casa até à praça da cidade, o arquiteto funciona como uma espécie de compositor. O seu desenho será a pauta para a execução de uma sinfonia construída para audição permanente. Os espaços funcionam como instrumentos, concebidos para produzir determinado tipo de som. A sua composição será mais agradável quanto maior for a correspondência com os seus recetores, decorrente da sensibilidade do espaço à sua função e relação formal e material para com o individuo.
Nos espaços que habitamos ecoam e são amplificadas as sensações e pensamentos que experienciamos todos os dias. É necessária a devida afinação para que a vivência do espaço não resulte em constante tom desafinado. Em silêncio ou em plena comunicação, o espaço traduzirá sempre a mais profunda manifestação física de diálogo entre indivíduos e civilizações. Os espaços que habitamos durante a nossa vida ocupam fragmentos da nossa memória. Por vezes, de forma inesperada, somos conduzidos à lembrança de determinado momento e espaço que julgávamos perdido no tempo pela mão de um particular elemento: o aroma.
Toda a matéria possui aroma. Da madeira ao metal, da pedra ao reboco. A sua presença e combinação determinam a atmosfera de um espaço: o soalho tratado de uma sala emana singular cheiro, criando especial impressão ao individuo que a habita. Apesar de inconscientemente relegado para um plano secundário, o olfato desempenha crucial papel na disciplina da arquitetura. Assim como a fusão de materiais na construção de um qualquer espaço culmina na criação de um distinto cheiro, também a apropriação funcional estabelece a sua marca singular na atmosfera aromática desse espaço. Habitante e habitáculo geram, na sua relação, o aroma que marcará a memória de todos aqueles que o visitarem.
Para cada casa, uma coleção de aromas: da entrada à cozinha, da sala ao quarto. Para cada cidade, um compêndio de cheiros: das ruas às praças, dos rios aos parques. A atmosfera aromática de um espaço revela instantaneamente algo que por vezes se apresenta oculto: a sua condição de salubridade (ou ausência desta). A arquitetura emana aromas, entre materiais e habitantes. Esses cheiros percorrem gerações em permanente ressurgimento no interior da vasta memória coletiva que caracteriza um povo.