Ser livre é uma das dádivas que recebemos de Deus. Poder escolher como agir, o que falar, aonde ir – claro, tendo a responsabilidade de assumir suas escolhas – é o que nos faz ser humanos. Um animal não escolhe nada disso e tem sua vida limitada pela sua natureza finita (em todos os sentidos).

Porém, essa liberdade nem sempre é totalmente ilimitada, principalmente quando se pensa nos veículos de comunicação. E isso se dá por causa de um conceito muito conhecido no jornalismo: agenda setting.

Dando voz a um dos teóricos que cunharam o termo na década de 1970, entenderemos o conceito de forma mais clara. Segundo McCombs:

Agenda setting sumariza o contínuo diálogo e debate em toda a comunidade, dos vizinhos locais até a arena internacional, no qual a mídia deveria ser o centro da atenção e da ação pública.1

Tomando como base esse conceito, temos a mídia como um centro irradiador de pautas para a sociedade, sendo ela quem vai dizer qual a direção para a qual se deve olhar e como se deve agir. Tal postura ficou bastante clara no episódio das enchentes ocorridas no Rio Grande do Sul entre abril e maio de 2024. Durante essa época, o assunto que dominou o noticiário das mídias foi a tragédia que atingiu o povo gaúcho. Apesar de toda a relevância que o assunto possui, a tentativa de se pautar toda uma nação existiu. O assunto tomou conta do noticiário, quisesse alguém ligar ou não um aparelho de TV.

Para mostrar essa tentativa, bastante importante para quem deseja implementar uma ditadura da opinião, tem-se a tentativa de enquadrar como fake news notícias que não coadunem com uma forma de visão, principalmente por meio dos fact-checks. A ideia do agendamento traz consigo uma forma de tentativa de controle que se sentia perdida, como aponta a citação que McCombs e Shaw fazem a Cohen ao dizer:

A mídia não obteve sucesso na maior parte do tempo em dizer às pessoas o que pensar; mas seria esplendidamente bem-sucedida em dizer aos seus leitores sobre o que pensar.2

Tal ideia nos mostra a dimensão da importância que a mídia se dava (e talvez ainda se dê), ao querer controlar de certo modo a sociedade a partir das pautas sociais a serem colocadas. E isso se torna muito claro em situações de calamidade (como no supracitado caso da tragédia do Rio Grande do Sul) ou em eventos de grande porte, como nos Jogos Olímpicos ou em alguma Copa do Mundo, ou até mesmo ao se cobrir alguma guerra. O destaque que se dá a esses eventos é grandioso, buscando torná-los o centro da discussão tanto nas pequenas comunidades como na comunidade internacional.

Caixa de ressonância

Ivonete da Silva Lopes3, por sua vez, mostra a questão do papel das narrativas como forma de tentar orientar a sociedade. Para ela, a mídia "sugere papéis, decisões e contribui para determinar os comportamentos dos indivíduos" além de realizar uma outra função de natureza mítica, corroborando com as crenças do grupo, "assim produzindo uma certa tranquilidade dos indivíduos no plano ontológico" .

Esse tipo de conduta nos leva a um outro conceito de suma importância para entender a atuação da mídia: a caixa de ressonância. Tal ideia se refere à amplificação e repetição seletiva de informações e ideias por parte dos veículos de comunicação. Com isso, a percepção pública sobre determinados assuntos é influenciada de modo a parecer unívoca.

O uso dessa estratégia, hoje, em uma sociedade heterogênea pode ajudar, como apontou Lopes, ao mostrar que o indivíduo se sente bem com certos conteúdos que são veiculados, tendo a impressão de que está representado por aquele meio. Assim, atualmente, com mídias cada vez mais parciais, o processo de agendamento parece se tornar cada vez mais forte, mas não apenas por meio de uma visão política, mas de crenças opostas, antagônicas que podem acabar por reforçar comportamentos e visões em quem se liga, de certo modo, a esses meios.

Portanto, liberdade de pensar, de escolher e de agir é um direito que os meios de comunicação se arrogam, mas não o concedem a seus leitores ou espectadores; esses devem se conformar com uma visão que lhes é imposta – devido a vários fatores que neste espaço não serão debatidos – ou simplesmente devem mudar de canal ou de meio de informação.

Notas

1 Mccombs, Maxwell. Setting the Agenda: the mass media and public opinion. Cambridge: Polity Press, 2014.
2 Mccombs, Maxwell; Shaw, Donald. The Agenda-Setting Function of Mass Media. Oxford: Oxford University Press, 1972.
3 Lopes, Ivonete da Silva. O telejornalismo e as narrativas sobre o controle social dos meios de comunicação. Estudos em Jornalismo e Mídia, vol. 8, nº 1, jan/jun 2011.