Caro Candidato,
Gostaríamos de parabenizá-lo pela sua aprovação no Mestrado Internacional em Literatura, Mídia e Cultura Infanto-juvenil.
É impressionante a capacidade que uma simples frase possui de mudar a trajetória da vida de uma pessoa. No caso, a minha. Há dois anos atrás recebi a notícia de que iria estudar fora do Brasil. Mais do que isso, meu Mestrado foi parte de uma iniciativa de diversas universidades Europeias chamada Erasmus Mundus, que promove oportunidades de mestrado com bolsas integrais e dois anos estudando em um país diferente a cada semestre.
Eu fiquei meses preparando documentação, preenchendo formulários de aplicação e aguardando pelo tão esperado email de confirmação. Quando recebi, foi um turbilhão de emoções e uma ficha caiu: eu seria, oficialmente, uma estudante internacional. Na época, eu não tinha a dimensão do que aquilo significava. Hoje, após passar essa experiência, eu venho refletindo sobre como esse status modifica não só a carreira de uma pessoa, mas também quem ela é, como se vê e como percebe o mundo ao seu redor.
Que fique claro: Este artigo não é para apontar os prós e contras de se morar fora, afinal, já é um tópico bastante difundido ao longo dos anos, com posts por toda a internet e diversos vídeos feitos por influencers de viagem. O que eu desejo expor aqui são as emoções e sentimentos, o ser e o existir como um estudante internacional.
A primeira coisa que eu preciso mencionar é o medo do desconhecido. Estudar fora é como olhar para o abismo e temer cair, mesmo que tenha sido você que procurou o abismo por livre e espontânea vontade. É assustador deixar para trás, tudo o que é conhecido em busca do desconhecido, sair da sua zona de conforto para uma aventura que não se sabe muito bem no que resultará. Se vale a pena? Só o tempo irá dizer, mas uma coisa é certa: você nunca mais será a mesma pessoa que era antes dessa experiência.
Deixe-me explicar, não é em um tom melancólico que digo isso, é como uma amiga que já passou pelo mesmo processo e que vem para aconselhar futuros estudantes internacionais. Viver em outro país com outros costumes e culturas não é fácil, mas isso já é de conhecimento geral. O que não se comenta muito, é o fato de viver em uma eterna balança entre querer correr de volta gritando pela sua mãe, e ao mesmo tempo desejar desbravar o mundo apenas com uma mochila nas costas e um laptop na mão.
Mais além, é um tempo de constantes despedidas e recomeços. Enquanto você sai para essa jornada de descobrimento e autoconhecimento, o mundo que você deixou para trás não congela esperando o seu retorno, ele continua a girar sem você. Aniversários, datas importantes e até eventos banais passam a ser online, assim como sua família, seus amigos e aqueles que você ama, acompanham sua vida por fotos e vídeos. Fotos que, inclusive, só mostram as viagens e as alegrias de se morar fora, sem expor todas as horas de aulas, os artigos lidos e as crises existenciais antes de uma avaliação acadêmica. A sensação de FOMO (do inglês Fear Of Missing Out - medo de ficar de fora, ser excluído) e o complexo de inferioridade existirão durante os anos fora, é preciso acostumarse.
Porém, há um contraponto positivo no aspecto familiar. Ao deixar sua família de sangue, você tem a oportunidade de criar sua própria família de coração, com pessoas que, até pouco tempo atrás eram só desconhecidos embarcando na mesma loucura que você. Como em um passe de mágica, passam de estranhos para conhecidos, amigos e até mesmo irmãos, juntos nessa jornada, dando suporte um ao outro nos momentos mais difíceis e criando laços que apenas outros estudantes internacionais serão capazes de compreender. Você se habitua com uma família de diferentes origens, culturas, nacionalidades e um novo lar começa a surgir.
O que me leva à sensação primordial que, lentamente, toma conta do estudante internacional, o pertencimento. É uma sensação agridoce e inevitável que existe quando se mora em um limbo, entre o seu país de origem e aquele que você escolheu como sua nova morada. Quando está no exterior, sente saudades da terra natal. Quando está na terra natal, sente saudades do exterior. Pouco a pouco, percebe-se que aquilo que antes era casa, não é mais, e a casa temporária já não parece mais tão temporária assim.
Deste modo, é correto terminar esta reflexão afirmando para aqueles que desejam estudar fora que nunca mais irão se sentir plenamente em casa. O seu coração vai se quebrando em pedacinhos e cada pedacinho fica preso aos lugares pelos quais você passou e o sentimento de completude nunca retornará. Entretanto, esse sentimento não é algo ruim. A completude dá lugar à imensidão de se afeiçoar ao desconhecido e você adquire a capacidade de transformar qualquer lugar na melhor casa que se poderia querer.