O que é exigido, neste século XXI, é uma nova era de responsabilidade, o mundo somos nós ! É socialmente irresponsável – de uma negligência aberrante – dizer e pensar “isso não me afetou”, “eu não vou mudar rigorasamente nada da minha vida por causa do que acontece na história humana do planeta. Cada vez mais precisamos estar inclinados para mudar radicalmente o nosso modo de vida – e talvez até a forma como pensamos sobre a sociedade em que vivemos. E a razão, provavelmente, não é para se proteger a si próprio, mas para ajudar a sociedade como um todo e as pessoas mais vulneráveis e expostas. De fato, é hora de pensar mais nos outros… Isso me levou a uma reflexão : o que nos trouxe realmente o coronavírus para o mundo de amanhã?
Estamos diante uma crise civilizacional, mas temos que ver o lado positivo do coronavírus, que levou as pessoas a refletirem sobre que tipo de planeta que nos queremos no futuro? O Covid-19 continua a ser algo muito sério não sendo possível subestimá-lo, mas julgo que será apenas uma pequena fração da crise que nos espera. Teremos que lidar com muitos outros problemas vastamente maiores, e que são eminentes.
Deparamo-nos com três grandes questões: a ameaça de uma guerra nuclear exacerbada pelas tensões dos regimes militares, a ameaça do aquecimento global e a ameaça da deterioração da democracia! Ambas as questões podem ser superadas se as pessoas tiverem controle sobre o seu destino, de contrário podemos estar condenados a cair no abismo se a Europa continuar subordinada à ditadura financeira de Washington e dominada pelo medo de ser excluida do sistema financeiro internacional. Mas, se pararmos para pensar, temos uma Alemanha que não pode ajudar a Grécia, mas temos uma Cuba que pode ajudar a Europa! Isto é muito significativo e revelador do mundo em que vivemos.
No contexto pandémico, em que a proximidade física passou a ser um perigo e uma certa distância física um dever ético, tornou-se incortornável a necessidade de lançar mão de novas ferramentas, sobretudo as do mundo digital. A internet, com os seus múltiplos recursos, sítios, aplicações e as suas poderosas redes sociais, tornaram-se mais do que nunca os nossos principais aliados nos momentos de isolamento social. A tecnologia permite realmente viver uma comunhão que, alguns dizem virtual, mas que na verdade, é um modo de habitar o nosso mundo real. Porém, neste vasto horizonte do ciberespaço, permanecem os riscos de virmos a mergulhar num universo de despersonalização, de alienação, de falta de autocrítica e criarmos uma espécie de existência paralela que pode afetar a qualidade das relações quotidianas.
Uma outra questão, de natureza ética e política, tem a ver com o uso de
tecnologias para a vigilância dos cidadãos e o controle da sociedade. A existência
de novas tecnologias de vigilância e monitorização dos indivíduos coloca inúmeros
problemas ao modo como concebemos a nossa relação com o estado e,
especificamente, como interpretamos as liberdades fundamentais que as
democracias procuram estabelecer e preservar. Foi nesse contexto que se usou
mais e se desenvolveu um maior conjunto de tecnologias com o objetivo de garantir a
segurança, mas também com a consequência e bom pretexto de uma muito maior
intromissão na vida dos cidadãos e no controle dos seus movimentos.
Com a crise sanitária que nos assolou, desenhou-se um novo paradigma nas
relações humanas, já em andamento, em que já começamos a perceber as falhas na
nossa sociedade moderna: hipermobilidade, economia globalizada, violência,
interdependência…
Serão necessárias múltiplas reflexões e debates, muita investigação com equipas pluridisciplinares e multiculturais, muita imaginação, criatividade e pragmatismo para ir descobrindo e implantando novos modelos organizativos, novas formas económicas, sociais e culturais para este Novo Mundo.
Para finalizar, é premente que a sociedade civil seja mais ativa, que participe, que fale e exprima as suas vontades e anseios. Incitámo-la a, de forma mais visível e mesmo em micro-círculos, assumir as suas responsabilidades… Ou seja, os problemas globais que atualmente enfrentamos e pelos quais nos debatemos têm de impor uma convergência de comportamentos.
Diante dos nossos perigos comuns, vamos enfrentar no futuro uma vez mais as correntes geladas e suportar as tempestades que podem vir com esperança e solidariedade. A Filosofia poderá ser um bálsamo para tempos difíceis que se avizinham ou, pelo contrário, um acordar das consciências adormecidas pelo efeito anestesiante da quotidianidade. Cada um de nós terá de aprender e reaprender a lidar individualmente e não apenas coletivamente com a perda, com a angústia, enfim, com o medo da morte, mas também com a esperança de uma vida melhor!
Estamos condenados a viver apenas no presente; mas a verdade é que o presente não é suficiente, temos essa necessidade de nos projetarmos no tempo, de imaginar o novo. É no futuro que mora a esperança, e é a esperança que nos mantém em movimento. Como será nosso futuro? Isso depende, certamente, de nossa capacidade de inventá-lo e de imaginá-lo no presente.