Em exposição no Centro Cultural Correios de Salvador fotografias da premiada fotógrafa e pesquisadora Denise Camargo. Os instantes eternizados por ela nas imagens da exposição E o Silêncio Nagô Calou em Mim alforriam as crenças e tradições africanas sufocadas no preconceito de uma nação que insiste em negar ou desconhecer traços indeléveis de suas próprias raízes. A mostra traz imagens acompanhadas de textos, trilha sonora composta especialmente para o projeto, vídeo e um ambiente interativo.
As lentes de Denise focam a cultura afro-brasileira ao entrar no espaço mítico-ritual do candomblé, revelando o processo de criação da artista no território sagrado dos ritos. "Parti da premissa que o território sagrado das cerimônias de candomblé é um espaço de experiência, de imersão cultural, de contemplação e respeito ao acervo de saberes", detalha ela, que recebeu o Prêmio Palmares em 2012, para publicação da tese Imagética do candomblé, uma criação no espaço mítico-ritual e o Prêmio Brasil Fotografia – Bolsa para desenvolvimento de projeto, este ano.
O resultado do trabalho surpreendeu até a própria fotógrafa, que sempre pensou em tirar o tema do lugar comum. "Em geral, o que se fotografa são os rituais públicos, que são lindos. Mas a minha proposta é reflexo de uma convivência, um mergulho, uma permissão. Quis acrescentar algo àqueles que não conhecem o candomblé e lancei mão de uma luz singular para não tornar o registro fotográfico tão óbvio", observa Denise.
A curadoria de E o Silêncio Nagô... é de Diógenes Moura, escritor, editor, roteirista e curador de fotografia da Pinacoteca do Estado de São Paulo entre 1998 e maio de 2013. Moura endossa que a exposição reforça o debate contemporâneo sobre a diversidade étnica e cultural do Brasil como um patrimônio imaterial, desconstruindo visões errôneas e estereotipadas, tão recorrentes, sobre a realidade afro-brasileira.
Segundo o curador, a mostra promove uma ruptura das percepções equivocadas dos terreiros, difundidas, entre outros fatores, pelo estigma brasileiro de não buscar entender suas próprias raízes. "E o Silêncio Nagô trata do silêncio profundo diante do desconhecido, do que poderá ir do ontem ao muito além, desse corpo índio e africano que temos obrigação em reconhecer, que somos nós, sem abortar Macunaíma", pondera.
Diógenes enfatiza que a coletânea de Denise é a revelação das coisas que nos pertencem, do que temos direito, do que somos nós. "Trata da existência dos que não gostam de mentir, dos que assumem o próprio rosto. Dos que não têm medo de seguir adiante como possuidores de uma humanidade distinta, de uma protocélula impregnada de mitos que dançam dentro do nosso corpo/memória insistindo em nos fazer despertar", adianta.
E o Silêncio Nagô... , que chega a Salvador depois de ficar em cartaz com sucesso em Brasília, coloca em circulação, de maneira inédita, ideias sobre um objeto artístico geralmente renegado à invisibilidade. É uma exposição enriquecedora tanto em seu conteúdo quanto na forma de proporcionar a aquisição de conhecimento.
Acessível aos deficientes visuais e ao público de todas as camadas sociais, a coletânea alia tecnologia e arte em um só espaço. Além das imagens, da trilha sonora, de palestras da artista e de convidados, de oficina de formação para educadores, o projeto contempla sinalização podotátil que auxiliará a visita de cegos. Eles recebem na entrada da sala um aparelho com audiodescrição das imagens, garantindo total autonomia durante o percurso expositivo. "Meu registro será imaginado por eles. É uma troca interessantíssima e enriquecedora para os dois lados", empolga-se Denise.
Para a artista, proporcionar acessibilidade ao espaço expositivo e facilitar o acesso à arte é viabilizar um aspecto da democratização social. "O Brasil tem diretrizes de acessibilidade e os artistas e produtores devem se preocupar em cumpri-las", frisa ela, referindo-se à Lei nº 10.098/2000.
Fabiane Beneti, da Empresa Livre, assina a produção-executiva do projeto, que é patrocinado pelos Correios e realizado pelo Ministério da Cultura, por meio da Lei de Incentivo à Cultura do Governo Federal. E o Silêncio Nagô... tem apoio do Centro Cultural dos Correios em Salvador – BA, onde a exposição faz itinerância, de 19 de dezembro de 2013 a 22 de fevereiro de 2014.
Centro Cultural Correios
Pelourinho
Travessa Cruzeiro de São Francisco, 20
Salvador 40020-280 BA Brasil
Tel. +55 71 33216665
oju.cultural@gmail.com
www.oju.net.br
Horário
Segunda a sexta-feira 10h às 18h
Sábados 8h às 12h
Entrada gratuita
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