Através das nossas construções legais em prol do combate à criminalidade, destacam-se valências de prevenção e de repressão. De forma simples, a partir do momento em que um bem jurídico se vê consagrado aos olhos da lei, o mesmo é protegido preventivamente, no sentido em que se vê reconhecido e exposto a todos os cidadãos. O carácter repressivo verifica-se através da pena associada à violação desse mesmo valor. A título de exemplo, os crimes contra a vida estão listados no Capítulo I do Código Penal e o primeiro artigo (131º) diz de forma directa e clara que quem matar outra pessoa é punido com uma pena de prisão de 8 a 16 anos.
Tradicionalmente, a imagem de justiça que se detém é esta mesma, de ver uma pena atribuída a alguém que cometeu um crime, sendo, nos casos mais graves, uma pena de prisão efectiva até 25 anos. Perante esta realidade, é necessário referir a intenção que se pretende com todas as penas repressivas: a reinserção do agente agressor. Com isto em consideração, torna-se necessário não só alocar recursos para garantir que a justiça é feita e a sentença atribuída, mas também garantir que, durante o cumprimento da pena, se reúnem condições para que o agente agressor seja reintegrado na sociedade.
Este é o cenário ideal, mas não deixa de ser proporcionalmente utópico. Os recursos são transversalmente escassos, desde os recursos alocados para processar a quantidade de processos que inundam os tribunais, a falta de espaço nas prisões e, consequentemente, a escassez de profissionais e de iniciativas assentes na premissa da reinserção social.
Perante esta dificuldade torna-se importante repensar estratégias. Durante este processo, e atendendo à incidência actual da criminalidade, torna-se aparente que esta filosofia reactiva (é necessário um crime acontecer para que algo seja feito) deixa de ser eficaz. Perante isto, há que procurar a premissa inicial da prevenção e explorar os resultados que daí possam advir.
De forma a que a prevenção possa realmente funcionar, a mesma deve ser aplicada o mais cedo possível. Como tal, surge a necessidade de começarem a ser implementadas medidas preventivas na infância, tanto em contexto escolar, social e familiar. Não é necessário, nem recomendado, que se opte por uma abordagem incisiva, pois tal acabaria por espoletar o efeito contrário em que as estruturas e entidades judiciais seriam vistas com desconfiança e hostilidade.
Em alternativa sugere-se um contacto mais amistoso e informal, uma explicação constante e propocional quanto ao papel desempenhado e os serviços disponíveis. Para colmatar isto, é necessário ter, não só profissionais competentes nas escolas para reconhecer comportamentos de risco para que, de forma célere, estes possam ser neutralizados antes de crescer para cenários de delinquência e crime, mas também formar e capacitar os restantes elementos do staff escolar para esta realidade.
Esta consciencialização transversal em que tanto alunos, escola, pais e encarregados de educação (e consequentemente a envolvência social em questão) ficam mais bem capacitados a longo prazo para lidar tanto com questões de inteligência emocional e as várias implicações que daí advêm, tanto com todas as nuances de efeitos criminógenos.
É uma premissa com potencial, nem que seja pelo facto de contrariar o ciclo constante actual de crime-acusação-condenação-pena-liberdade-reincidência. Contudo, é inegável que é algo que requer políticas sociais próprias, devidamente focadas e especializadas para garantir a devida implementação em prol do que realmente se pretende: a criação de uma sociedade mais humana, empática e segura.