O brutalismo, na arquitectura, é uma ramificação do movimento moderno que figurou na década de 50 e estendeu-se até à década de 70. Tendo sido baptizado inicialmente de new brutalism, o nome que permaneceu foi brutalismo, à mercê de Reyner Banham (1922-1988) que protagonizou este movimento no seu artigo de 1955 na Architectura Review intitulado «The new brutalism; ethic or Aesthetic?»1. O termo também surge com base no material que mais caracteriza este movimento, o betão á vista, em cru (raw). Os primeiros edifícios que personificaram este movimento são o edifício da escola de Hunstanton, dos arquitectos Alison e Peter Smithson e o Centro de Artes de Yale do arquitecto de Louis Kahn.

Seguiram-se diversos arquitectos que prosseguiram este movimento, ou melhor dizendo, esta forma de pensar o espaço através da ética e das pessoas, materializando-o na sua forma mais pura e numa atmosfera despojada. Alison and Peter Smithson, Reyner Banham, Louis Kahn e Le Corbusier, Felix Candela, Alvar Aalto, Marcel Breuer, Kenzo Tange e Atelier 5 são alguns dos protagonistas deste movimento.

«(…) What moves a New Brutalist is the thing itself, in its totality, and with all its overtones of human association».

(Banham, Reyner, 1955. «The new Brutalism», Architectural Review)

Uma maneira de proteger o hediondo

Apesar de tudo, este movimento não foi especialmente apreciado pelo público em geral e criou uma espécie de animosidade entre a arquitectura brutalista e os críticos de arquitectura. Muitas vezes este movimento é associado a sinónimos como bruto, monstruoso, inumano, hediondo, que estão relacionados com a sua aparência crua em betão e com a sua dimensão imponente. Levando assim a que estes edifícios começassem a ser desprezados.

Nunca descorando da qualidade deste movimento e do seu contributo para a arquitectura, e apesar da opinião negativa dos críticos, baseada no gosto pessoal, estes edifícios e os seus arquitectos merecem respeito e o protagonismo que não tiveram no seu momento áureo.

É com o intuito de preservar e glorificar este movimento que nasce a plataforma #SOSBrutalism2. Esta plataforma é uma base de dados que reúne globalmente edifícios brutalistas e que no presente momento conta com mais de 1000 edifícios contabilizados. Mais do que partilhar estes edifícios, esta plataforma reúne uma descrição e fotografias dos mesmos, bem como o seu estado - demolido, recuperado ou em risco.

Esta é uma iniciativa sem antecedentes, que merece a divulgação, não só do brutalismo entre os seus apreciadores, como também do movimento e dos seus edifícios como um legado e parte de um momento histórico para a arquitectura. Esta plataforma é aberta e conta com a participação de todos para não só aumentar e divulgar a sua base de dados, como também na defesa de edifícios em risco.

Os monstros de betão

Estes edifícios são em termos de estética parte de um movimento que é um subgénero do modernismo. Maioritariamente implantados na Europa, como mostra a plataforma #SOSbrutalism, aparecem num momento do pós-guerra, onde existia uma carência na habitação e outros serviços públicos. Das características destes edifícios evidenciam-se a sua honestidade para com a estrutura e a repetição de módulos arquitectónico, com formas geométricas básicas, capazes de se multiplicar para formar um edifício pelo seu conjunto.

Não seria possível falar de arquitectura brutalista sem destacar um dos exemplares mais importantes, o complexo de edifícios do Barbican Center. É, sem dúvida, um monstro pelas suas dimensões, mas é, sem dúvida também, um bom exemplo de uma monstruosidade funcional e que se enquadra não só em termos urbanos como também tem atenção à escala humana. Ao contrário de muitos outros exemplares, espalhados pela cidade de Londres e arredores que estão pouco enquadrados com a escala urbana e que geram zonas habitacionais de pouca qualidade devida à má conotação que foi erguida em torno destes exemplares de arquitectura brutalista. Mas este género de arquitectura não se aplicou só a programas habitacionais, foi também um género muito utilizado em programas públicos, como escolas, igrejas e entre outros, como podemos ver em edifícios, como por exemplo, a igreja di Sant'Ildefonso em Milão, do arquitecto Carlo de Carli, o Centro de Conferências da UNESCO em Paris, do arquitecto Marcel Breuer e do engenheiro Luigi Nervi, ou até a escola secundária Smithdon em Hunstanton, já referida como anteriormente como um dos primordiais exemplos mais relevantes do brutalismo, dos arquitectos Alison and Peter Smithson, todos estes edifícios são pertencentes à década de 50.

O caso português

Em Portugal, existem nesta plataforma catalogados cinco edifícios, são eles a escola secundária José Gomes Ferreira, do arquitecto Raul Hestnes Ferreira, 1976-78, a igreja da Nossa Senhora da Conceição, do arquitecto Pedro Vieira de Almeida, 1970-88, a os escritórios e museu da Fundação Calouste Gulbenkian, dos arquitectos Alberto Pessoa, Pedro Cid, Ruy d’Athouguia, Leslie Martin, Sommer Ribeiro, Ivor Richards e Nunes de Oliveira, 1956-1983, o Palácio da Justiça dos arquitectos Januário Gadinho e João Andersen, 1962-70, e por fim um dos maiores exemplares portugueses: a igreja do Sagrado Coração de Jesus, dos arquitectos Nuno Portas e Nuno Teotónio Pereira, 1961-70, todos situados em Lisboa.

Muitos dos edifícios estão ainda a carecer de descrições, e outros ainda por catalogar, como por exemplo o edifício “Franjinhas” do arquitecto Nuno Teotónio Pereira e João Braula Reis, 1966-1969, em Lisboa, o mercado municipal de Santa Maria da Feira, do arquitecto Fernando Távora, de 1953-59, ou até o edifício das antigas caixas de previdência em Setúbal do arquitecto Chorão Ramalho, 1965-69.

Mas mais importante do que a divulgação desta plataforma, #SOSbrutalism, é o seu propósito: desmistificar a arquitectura brutalista, valorizar a beleza sublime destes monstros hediondos e, provavelmente o mais importante, reavivar o humanismo que existiu no movimento ligado ao brutalismo.

Notas

1 Em 1955, o critico de arquitectura Reyner Banham escreve um artigo que inicia uma complitação sobre um movimento em ascenção – «The New Brutalism».
2 Esta plataforma pode ser consultada a partir do seguinte link.