O Ocidente ainda de ressaca do Réveillon e, a China a preparar-se para a maior festividade anual, a entrada no novo ano lunar.
O Celebração do Ano Novo Chinês é, sem dúvida, o mais importante feriado na China, festejado no primeiro dia do primeiro mês do calendário tradicional chinês. Não se resume a um dia de festividade, mas a um conjunto de celebrações mais conhecidas como Festival da Primavera, Chūnjié春节, tendo a duração de cerca de 15 dias.
Ao contrário do ano novo Cristão, baseado no calendário solar, a festividade chinesa é baseada no sistema tradicional lunar e solar. Os meses lunares têm cerca de 2 dias a menos que os solares, logo um mês extra tem de ser adicionado ao calendário em determinados anos. Esta é a razão para o Ano Novo Chinês ser celebrado em datas diferentes todos os anos.
Este ano, no dia 8 de fevereiro, inicia-se um novo ciclo do zodíaco chinês, simbolizado por um novo animal, o Macaco. Para aqueles que nasceram em 1992, 1980, 1968, 1956 etc, portem-se bem, este é o vosso ano. Para a grande maioria dos chineses esta é a única altura do ano com direito a férias, é a época de retornar às terras de origem, de reunir a família e traçar novos planos para o novo ano que se aproxima.
Tudo encerra, desde os mais variados serviços públicos e privados, restauração, escolas. Existem lugares que ficam praticamente desertos, cidades que viram fantasmas.
Inicia-se a maior época de viagens do mundo, é a maior migração anual realizada por humanos, conhecida como Chūnyùn 春运. Dura cerca de 40 dias em torno do dia do Ano Novo Chinês e o número de viagens excede o dobro da população chinesa, mais de 2.5 mil milhões de viagens realizadas.
Mas o que fazem os chineses?
Tal como a Páscoa em Portugal, o Ano Novo Chinês é a desculpa perfeita para muitos limparem não só a casa como os escritórios e os espaços de trabalho. E digo com toda a certeza que mesmo depois da limpeza a maioria irá continuar suja e a cheirar mal. São conceitos de higiene diferentes, não adianta tentar explicar, só vivenciando.
É da praxe enfeitar as casas e ruas com vários motivos tradicionais, os pendentes vermelhos com poemas afixados nas portas, as vistosas lanternas vermelhas, as tranças de piri-piri ou os posters com imagens do novo signo do Zodíaco são as decorações mais utilizadas na sociedade chinesa.
Ao estilo de um filme do Jackie Chan, naquelas cenas de perseguição em plena Chinatown de uma cidade americana, a tradicional dança do Dragão e do Leão é coisa que não pode faltar. Possui um simbolismo místico e ancestral, o som dos tambores e a dança das bestas afasta os maus espíritos e dá as boas vindas aos espíritos da fortuna.
Uma das mais características tradições são os envelopes vermelhos, usados para oferecer dinheiro aos mais novos.
A moda dos envelopes vermelhos ganhou uma faceta, passou de uma forma física e pessoal para o virtual. O Wechat, a maior plataforma de partilha de mensagens e conteúdos diversos na China, inclui uma função que permite gerir uma carteira virtual, com acesso à conta bancária como forma a proceder pagamentos online. Desde janeiro do ano passado, o Wechat permite aos usuários trocar envelopes vermelhos com quem quiserem, bastando colocarem a quantia desejada a oferecer. Estima-se que, durante as celebrações deste ano a transacção de envelopes vermelhos gera um montante perto dos €100 milhões.
Por último, mas igualmente importante, o mundialmente conhecido fogo de artifício chinês, não tivesse sido ele inventado na China, uma forma de espantar a má sorte do passado e trazer a boa sorte para o futuro. De pauzinhos na mão!
A comida, algo de muito sério para os chineses. Ou não fosse uma das saudações mais utilizadas o Nĭ chī le ma? 你吃了吗, que literalmente significa Tu já comeste?
Nunca vi povo que gostasse tanto de comer, não pelo prazer sensorial, mas pelo facto de ter o bandulho cheio. Adiante, tal como em todas as culturas existem pratos e comidas tradicionais a cada época do ano e nem a isto os chineses são diferentes.
O famoso Hot Pot, no qual as famílias se reúnem à mesa e partilham a refeição, os pratos de galinha, como a Galinha Assada com Chá Verde, especialmente no centro da China. O peixe muito apreciado, e em muitas regiões visto como um luxo, não é comido na totalidade de forma a relembrar a ideia de fartura para o futuro. O pato é também obrigatório em muitas mesas chinesas, e a sua mais famosa receita Pato à Pequim.
Tradicionalmente consumidos no norte, os jiaozi, pequenos bolinhos de massa cozida a vapor e com recheio variado, estilo os nossos rissóis, têm um simbolismo de bolinhos da sorte.
A carne seca tem um lugar especial no coração dos chineses e, durante o período do Ano Novo Chinês é frequente ver os patos, nacos de porco e peixe a secar pelas ruas e às janelas.
As laranjas e tangerinas são utilizadas como oferendas e decoração nas mesas, pelo facto de a sua sonoridade em chinês ser semelhante a riqueza e sorte respetivamente.
Tal como os portugueses, os chineses são dos que aproveitam tudo do porco, tudo. O porco é comido de mil formas diferentes e em receitas variadas.
As salsichas chinesas são também um dos petiscos gastronómicos fáceis de encontrar, existem centenas de salsichas, de diferentes formas e feitos, no entanto sabem todas ao mesmo.
Claro que, num país tão grande, com uma cultura tão profunda e vasta, com províncias tão diferentes umas das outras, certas tradições não se aplicam na generalidade, como o cão.
De todos os chineses que conheci, nas mais variadas cidades por onde passei, apenas um me constatou que o prato favorito era caldeirada de cão com molho picante. Por acaso não era mau, fazia lembrar chanfana de cabrito, mas julgo que grelhado com molho picante ia melhor.