A Galeria Vermelho apresenta, de 24 de fevereiro a 21 de março de 2015, individuais de Marco Paulo Rolla, Dora Longo Bahia e Lia Chaia. Na data da abertura, será lançado pelo selo edições TIJUANA o livro Álbum de Lia Chaia. A Vermelho recebe no mesmo dia o lançamento do livro Novas Derivas, do crítico de arte e curador independente Jacopo Crivelli Visconti, editado pela WMF Martins Fontes.
Marco Paulo Rolla. Impertinência Capital
Marco Paulo Rolla mostra sua produção recente na individual Impertinência Capital. A mostra reflete a pesquisa multidisciplinar do artista, apresentando pinturas, desenhos, esculturas e performances feitas para a câmera de vídeo.
Na sala 1 da galeria, a série Esvaziamento Cotidiano se organiza em 6 pinturas em acrílica sobre telas de grandes dimensões. Dramas cotidianos e tensão entre indivíduos dão a tônica das situações representadas, como no opulento cinema particular retratado em Home Theater, em que a cantora que ocupa a tela de projeção aparece muda diante do microfone a sua frente.
No segundo andar, a série Desenhos Brancos (que junto às pinturas de Esvaziamento Cotidiano forma a família de trabalhos Dramas) é toda executada em lápis e pastel seco branco sobre papel bege. As situações representadas nessa série são todas oriundas de imagens apropriadas de meios de comunicação como revistas e jornais e, assim, partem diretamente de cenas apresentadas pela mídia. A própria técnica dos desenhos remete às fantasmagorias, cuja origem está nas imagens produzidas pelas chamadas lanternas mágicas, antecessoras dos modernos aparelhos de projeção. Essas imagens ganhavam aspecto fantasmagórico por conta de sua projeção em nuvens de fumaça. Walter Benjamin, fascinado por essa tecnologia, usa fantasmagoria como termo para aproximá-la do conceito de fetichismo da mercadoria de Karl Marx, assinalando a universalidade do fenômeno do fetichismo como característica central da modernidade.
Cinco monitores e projeções espalhados pelo espaço expositivo mostram a ação desenvolvida para a câmera de vídeo Homens de Preto. Figuras trajando máscaras e ternos pretos batem incessantemente à máquina de escrever, gerando uma instalação ao mesmo tempo imagética e sonora, em que o artista fala de um modelo de obsolescência. Esses homens parecem trabalhar incansavelmente para extrair algo desses equipamentos, porém o único resultado de sua ação é a falência repentina dos próprios personagens que, cansados de seus movimentos repetitivos, caem em decesso momentâneo para em seguida voltar à ação.
Completam a exposição as esculturas Discurso Interrompido e Discurso Fechado, ambas feitas em pedra sabão, em que microfones se misturam à materialidade da pedra, falando sobre a inercia do discurso contemporâneo.
Dora Longo Bahia. Black Bloc
Na sala 3 da Vermelho, Dora Longo Bahia mostra uma série de trabalhos feitos a partir das manifestações que vem ocorrendo no Brasil desde junho de 2013.
Na instalação que dá título à mostra, 126 placas cimentícias trazem silhuetas de garrafas de vinagre serigrafadas em preto. São como retratos de manifestantes, com seus capuzes pretos e suas garrafas de vinagre, utilizadas para neutralizar os efeitos das bombas de efeito moral usadas pela polícia. Em meio às diferentes garrafas de vinagre, uma única silhueta de um coquetel molotov destaca-se, salientando a iminência da violência. Longo Bahia discute o poder de irradiação da união de uma massa de pessoas sem rosto.
Em outro trabalho, também intitulado Black Bloc, um conjunto de 11 garrafas de vinagre foi esculpido em torno a partir de blocos maciços de nylon preto. Embora sejam feitas em escala natural em relação às garrafas originais, sua materialidade lhes confere monumentalidade e, mais uma vez fica evidente o caráter icônico de simples garrafas de vinagre, transformadas em símbolos de resistência no atual momento histórico brasileiro.
Simultaneamente, nos vídeos Lucifer e Lilith, Dora traça um paralelo entre os Black Blocs e as mulheres mulçumanas que vestem a burca. A artista trata de dois sujeitos sem lugar na contemporaneidade. Os jovens manifestantes sem identidade e as mulheres religiosas que não mostram o corpo. Em Lucifer, os manifestantes são mostrados como crianças que, depois da queda de um anjo numa idílica e misteriosa floresta de cores vibrantes, tentam sobreviver numa paisagem pós-apocalíptica. Uma das crianças é o “portador da luz”, significado original da palavra lucifer, pois tem nas mãos um coquetel molotov – causa ou consequência da destruição?
Em Lilith, a artista apresenta uma paisagem lunar permeada por vulcões e gêiseres, intercalada por tomadas de um casal que parece conversar numa paisagem desértica, inóspita e hostil. A mulher, vestida com uma burca, escuta o homem que, com o rosto coberto por um keffiyeh, gesticula sem fazer sentido. Lilith é a primeira companheira de Adão, feita da mesma matéria prima que ele e por isso é sua igual. É uma "criatura da noite”, significado original da palavra lilith, expulsa do paraíso por disputar sua importância com Adão.
Junto à série Black Bloc, os vídeos Lucifer e Lilith trazem uma visão iconoclasta sobre representações enraizadas na mídia e na religião.
Lia Chaia. Álbum/ Corpo Mitológico
O selo Edições Tijuana lança o novo livro de artista de Lia Chaia, que utilizou o álbum de figurinhas como sistema para articular sua pesquisa sobre o lugar do espectador diante de uma obra.
O álbum de figurinhas é um tipo de publicação bastante popular. Geralmente temático, o álbum sugere a interatividade do leitor, uma vez que a regra é completar os campos vazios deixados em cada página com figurinhas que correspondam exatamente àquele espaço. No caso da obra intitulada Álbum, as figurinhas que acompanham a publicação seguem outra regra. Não existem espaços exatos para que elas sejam coladas, fica a critério do leitor definir o lugar que aquele desenho se encaixa. Além disso, Álbum foi impresso em um material transparente, e isso multiplica as possibilidades de encaixe, uma vez que os desenhos de páginas distantes podem ser sobrepostos e formar novas relações formais e simbólicas.
Paralelamente ao lançamento do livro, Lia apresenta a exposição individual Corpo Mitológico com a série de mesmo nome, trabalho derivado da pesquisa para Álbum. O jogo de encaixe e composição fica aparente aqui, já que Chaia parte de um repertório de figuras pré definidas para elaborar construções casuais e fortuitas por cima de chapas de vidro jateado.
Também faz parte da exposição a série Transfusão, onde, com canos de pvc e cabos de diferentes tons de vermelho, Chaia faz menção não só a um circuito de veias humanas, mas também à arquitetura como algo vivo e proponente.