Nos últimos 50 anos, a produção global de plásticos aumentou exponencialmente, atingindo cerca de 350 milhões de toneladas métricas por ano. Infelizmente, a maior parte desse plástico acaba em aterros sanitários ou nos oceanos, onde pode levar centenas de anos para se decompor, dependendo da composição e dos fatores ambientais. Os resíduos plásticos se degradam em microplásticos (MPs) — partículas de plástico menores que 5 milimetros — devido à exposição à luz, ao calor, à umidade e aos micróbios.
Os MPs se tornaram onipresentes em nosso ambiente, e a exposição a eles ocorre principalmente pela ingestão ou inalação. Vários estudos detectaram MPs em água do mar, água doce, solos agrícolas e colheitas usadas tanto para consumo animal quanto humano. Estima-se que até 2050, cerca de 12 bilhões de toneladas métricas de resíduos plásticos serão liberadas no meio ambiente, por meio de processos como bioturbação, deposição atmosférica, irrigação de esgoto e aterros sanitários. Com cerca de 3,2 toneladas métricas de MPs sendo liberadas no ambiente por atividades comerciais e domésticas a cada ano, a exposição a MPs se tornou inevitável.
Microplásticos: uma ameaça Invisível à Saúde Humana
Em 2019, a Organização Mundial da Saúde (OMS) emitiu um comunicado afirmando que, com base nas evidências disponíveis, a exposição a MPs representa uma preocupação baixa para a saúde humana. No entanto, relatórios subsequentes sobre toxicidade celular e bioquímica de MPs deixaram claro que as interações prejudiciais entre MPs e sistemas biológicos dependem da dose, o que significa que os impactos das exposições a MPs aumentarão com o tempo, sendo a ingestão a principal forma de exposição a MPs.
Estudos em peixes-zebra expostos a MPs mostraram indução de lesão e inflamação intestinal. Em humanos, evidências recentes mostram que os MPs são abundantes em cólons coletados após colectomia e aumentaram nas fezes de indivíduos com doença inflamatória intestinal, no entanto, os efeitos dos MPs na saúde gastrointestinal ainda estão sendo decifrados. Além disso, estudos em animais marinhos, roedores e culturas de células humanas mostraram que os MPs podem alterar a bioenergética celular, induzir estresse oxidativo e inflamação em vários órgãos imunes e extraintestinais.
Acúmulo de microplásticos e alterações metabólicas
À medida que começamos a entender os tamanhos, tipos e doses de microplásticos no ambiente que os humanos estão ingerindo, os pesquisadores conseguem avaliar de forma mais realista os efeitos dos MPs usando doses, tamanhos e tipos ambientalmente relevantes. Uma revisão de 2019 de mais de 50 estudos existentes sobre MPs sugere que a ingestão de alimentos e bebidas comuns resulta em humanos ingerindo aproximadamente 5 gramas de plástico por semana.
Em um recente estudo, publicado na revista Environmental Health Perspectives, pesquisadores da Universidade do Novo México descobriram que os microplásticos estão tendo um impacto significativo em nossas vias digestivas, encontrando seu caminho do intestino para os tecidos do rim, fígado e cérebro. No estudo, foi realizada microscopia de luz polarizada em amostras de soro, cérebro, fígado e rins isolados de camundongos expostos a microesferas de poliestireno e plásticos mistos durante quatro semanas. As microesferas foram observadas no soro e em todos os três tecidos isolados, com maior quantidade no fígado. Usando espectroscopia Raman e análise de XPS, confirmou-se que as microesferas translocadas sistemicamente eram de poliestireno, embora tenham sofrido alterações bioquímicas durante a translocação.1
Dessa forma, o estudo mostra que MPs podem se incorporar a outros órgãos internos após a ingestão, como confirmado pela translocação sistêmica de MPs. A exposição a quatro semanas de poliestireno (PS) sozinho ou a plásticos mistos impactou várias vias metabólicas no cólon, fígado e cérebro de camundongos. As vias metabólicas mais comuns desreguladas estavam associadas aos aminoácidos, o que pode influenciar inúmeros processos fisiológicos. A exposição a MPs pode alterar a via do metabolismo xenobiótico pelo citocromo P450 no cérebro, sugerindo potenciais efeitos neurotóxicos.
Além disso, as alterações metabolômicas observadas no cólon, fígado e cérebro, mostram respostas diferenciais dependentes da dose e do tipo de exposição a MPs.
Resultados preocupantes
Os resultados desse estudo fornecem uma prova de conceito para a identificação de alterações metabolômicas associadas à exposição a MPs e adicionam insights sobre os potenciais riscos à saúde que a contaminação por MPs mistos pode representar para os humanos.
A exposição a microplásticos é inevitável. Logo, é crucial entendermos e enfrentarmos o problema dos microplásticos, não apenas como uma questão ambiental, mas também como uma séria preocupação com a saúde pública. A ação é necessária em níveis individuais, industriais e governamentais para reduzir a produção e o consumo de plásticos.
Além disso, é vital investir em pesquisa contínua para entender melhor os efeitos dos microplásticos na saúde humana e desenvolver soluções eficazes para mitigar esse problema crescente. O futuro da nossa saúde e do nosso planeta depende da nossa capacidade de lidar com os desafios impostos pelos microplásticos.
Referências
1 Marcus M. Garcia, Aaron S. Romero, Seth D. Merkley, Jewel L. Meyer-Hagen, Charles Forbes, Eliane El Hayek, David P. Sciezka, Rachel Templeton, Jorge Gonzalez-Estrella, Yan Jin, Haiwei Gu, Angelica Benavidez, Russell P. Hunter, Selita Lucas, Guy Herbert, Kyle Joohyung Kim, Julia Yue Cui, Rama R. Gullapalli, Julie G. In, Matthew J. Campen, Eliseo F. Castillo. In Vivo Tissue Distribution of Polystyrene or Mixed Polymer Microspheres and Metabolomic Analysis after Oral Exposure in Mice. Environmental Health Perspectives, 2024; 132 (4) DOI: 10.1289/EHP13435.