A morte é um tema inevitável da vida. No entanto, o processo de morrer pode ser doloroso e estressante, tanto para o paciente quanto para seus familiares. A questão da morte digna tem sido objeto de discussão, debate e principalmente reflexão ao longo dos anos. Nesse contexto, surgem algumas práticas médicas que buscam humanizar o processo de morte: a ortotanásia, a eutanásia e o suicídio assistido. A discussão sobre este tema é complexa e sensível, e tem dividido a opinião pública e a comunidade médica por muitos anos. Os termos envolvem questões relacionadas ao final da vida e à tomada de decisões difíceis, e embora pareçam semelhantes, há distinções significativas e fundamentais entre eles. É necessário explorar estes conceitos, e saber como se diferenciam em termos de ética, legalidade e implicações para os pacientes e a sociedade.
Ortotanásia: a passagem natural para a morte
A ortotanásia é frequentemente descrita como a morte natural, sem interferência médica para prolongar ou acelerar o processo de morrer, permitindo que a morte siga seu curso.
Essa prática permite aos doentes e seus familiares defrontarem a morte como um continuum da vida. O paciente pode ter uma morte digna e natural, tendo respeitada sua autonomia e vontade, sem prolongar desnecessariamente o sofrimento através de tratamentos agressivos ou invasivos que não oferecem benefícios significativos ou que podem causar mais sofrimento que alívio, quando todos os recursos médicos disponíveis não são capazes de reverter sua condição. Isso não significa que os cuidados paliativos sejam suspensos; pelo contrário, os cuidados paliativos desempenham um papel fundamental na ortotanásia, pois visam proporcionar conforto, alívio dos sintomas e da dor assim como suporte emocional ao paciente durante os estágios finais da vida.
Em termos legais, a ortotanásia é geralmente permitida em muitos países, desde que seja feita com o consentimento informado do paciente ou de sua família.
Eutanásia: a ação médica ativa para pôr fim ao sofrimento
Eutanásia é o ato intencional de proporcionar a alguém uma morte rápida e indolor para aliviar o sofrimento causado por uma doença incurável e que provoca um grande sofrimento, quando não existem mais tratamentos que possam ser realizados para melhorar o quadro clínico da pessoa. Na eutanásia, o paciente deve expressar seu desejo de pôr fim à vida de forma clara e inequívoca. Caso o paciente não possa tomar essa decisão por conta própria, a eutanásia não pode ser realizada sem o consentimento prévio, a menos que o paciente tenha deixado uma declaração escrita de sua vontade, enquanto ainda estava lúcido e com suas faculdades mentais preservadas.
A eutanásia pode ser classificada em duas formas: voluntária e não voluntária.
Na eutanásia voluntária, o paciente expressa, explicitamente e de forma autônoma, o desejo de morrer e solicita ativamente o procedimento, o qual é conduzido por um médico, onde é feita a administração de medicamentos ou realização de algum procedimento com o intuito de levar o paciente à morte.
Na eutanásia não voluntária, a morte é decidida por terceiros (equipe médica ou a família) sem que o paciente tenha manifestado a sua vontade ou sem o consentimento deste.
Também se pode classificar a eutanásia em ativa ou passiva.
Eutanásia ativa: é o mesmo que causar a morte de um paciente terminal, a pedido dele, respeitando-se uma série de condições. É a indução do processo de morte no doente por meio de injeções letais, desligamento de aparelhos, dentre outros, para causar uma morte rápida e indolor.
Eutanásia passiva ou indireta: a morte do paciente ocorre dentro de um quadro terminal, ou porque não se inicia uma ação médica ou porque há interrupção de uma medida extraordinária, com o objetivo de minorar o sofrimento. Ou seja, o não prolongamento da vida de um paciente em estado terminal, com uma doença considerada incurável pelos médicos.
É importante ressaltar, também, a diferença entre ortotanásia e eutanásia passiva, conceitos que são frequentemente confundidos. Na ortotanásia, é a doença de base a responsável pela morte; na eutanásia passiva, a moléstia não é fatal, ou ainda não chegou ao ponto da terminalidade, da reta final da vida.
As leis relacionadas à eutanásia variam de país para país e podem mudar ao longo do tempo. A eutanásia é legal em vários países do mundo, mas com diferentes regulamentações e restrições. Alguns exemplos: Países Baixos, Bélgica, Luxemburgo, Colômbia, Canadá, Nova Zelândia, Portugal, Alemanha, Espanha, cinco estados dos Estados Unidos, Uruguai, um estado da Austrália, entre outros.
Suicídio assistido: o desejo do paciente levado à ultima instância
O suicídio assistido ou morte assistida configura-se no ato de um paciente com doença grave exterminar a própria vida com o auxílio de um médico que, de forma intencional, disponibiliza à pessoa as informações ou os meios necessários para cometer o ato, incluindo aconselhamento sobre fármacos e prescrição ou fornecimento desses fármacos. No suicídio medicamente assistido é obrigatório que a pessoa tenha plena posse das suas capacidades mentais e que voluntariamente expresse o desejo de morrer e que requisite uma dose letal de medicamentos que ponha termo à vida. Geralmente é necessário que a pessoa seja um doente terminal com um prognóstico de seis meses ou menos de vida.
A diferença do suicídio assistido, ou morte medicamente assistida, da eutanásia, está em quem administra a dose letal ao paciente. No primeiro caso, o próprio indivíduo auto administra o medicamento, geralmente oral, que o leva a óbito. No segundo, uma equipe médica é responsável por administrar a dose medicamentosa.
O suicídio medicamente assistido é legal nos Países baixos, Bélgica, Luxemburgo, Suíça, entre outros. É importante ressaltar que as leis e regulamentos em torno do suicídio assistido podem variar em cada país. Do ponto de vista ético, tanto a ortotanásia, a eutanásia, quanto o suicídio assistido levantam questões delicadas e polêmicas.
A defesa da ortotanásia se baseia na crença de que cada indivíduo deve ter o direito de morrer com dignidade, evitar o sofrimento desnecessário, assim como evitar a distanásia (atitude médica que, visando obstinadamente salvar a vida do paciente terminal, submete-o a grande sofrimento e tratamentos inúteis, ou seja, o prolongamento exagerado da vida de um paciente).
Por outro lado, a eutanásia é uma prática mais controversa e enfrenta maior resistência ética, moral e legal. Aqueles que apoiam a eutanásia argumentam que ela oferece uma opção humanitária para pessoas que estão enfrentando sofrimento insuportável e desejam pôr fim à sua vida de forma controlada e digna. Seus críticos argumentam que tirar a vida de outra pessoa é uma violação dos princípios fundamentais da medicina e da ética. A eutanásia levanta preocupações sobre o papel do médico como curador e defensor da vida, e sobre o potencial para abusos e decisões precipitadas.
Não menos complexo é o debate do suicídio assistido. O direito de morrer é um conceito baseado na opinião de que um ser humano tem o direito de terminar sua própria vida. Os defensores tipicamente associam o direito de morrer com a idéia de que o corpo e a vida de alguém são próprios, para se dispor como se julgar adequado. No entanto, um interesse legítimo do Estado na prevenção de suicídios irracionais é importante de ser discutido. A escolha deve ser estável, não uma decisão impulsiva, não devido à doença mental, alcançado após a devida deliberação, etc.
A discussão em torno destas práticas é complexa e multifacetada. Envolve considerações éticas, legais, religiosas e pessoais. A opinião pública também varia amplamente em relação a essas práticas. Alguns acreditam que a morte deve ser uma escolha pessoal e que os indivíduos têm o direito de decidir quando e como querem morrer. Outros argumentam que a vida é sagrada e que a eutanásia e o suicídio assistido são uma violação desse princípio.
Em última análise, o amplo debate sobre estes temas é um lembrete de que a morte faz parte do ciclo natural da existência humana, e que cada pessoa tem o direito de decidir como deseja enfrentá-la. É uma questão que nos faz refletir profundamente sobre nossos valores, crenças e prioridades. Embora não haja respostas fáceis ou conclusivas, é importante continuarmos a nos aprofundar nesses assuntos, sempre com respeito, sensibilidade e empatia pelos diferentes pontos de vista, levando em consideração todos os argumentos envolvidos.