Num dia onde consegui a façanha de quebrar dois dedos, um de cada uma das mãos e ter de cobrir a “inEsperada” queda, renúncia da ministra Liz Truss (ela bateu o recorde histórico de ficar menos tempo no cobiçado cargo de Primeiro Ministro do Reino Unido), terminar a minha noite numa das principais galerias de arte na Europa e entrevistar um dos maiores artistas de street art do mundo, o Eduardo Kobra, era realmente tudo o que precisava para terminar o dia bem.
O nome da galeria só poderia ser Éden, o paraíso da criação humana fica aqui, na New Bond Street, em Londres.
Logo na entrada já me senti chegando em casa depois de um dia enlouquecido de trabalho. Gente interessante, trilha sonora adequada, sim, definitivamente estava no meu meio ambiente com as obras do Alec Monopoly, Angelo Accardi, Gal Yosef, David Kracov, Dorit Levinstein, entre outros grandes artistas, mas meu foco era para o criador de “Etnias”, para o brasileiro que durante as Olimpíadas do Rio de 2016 quebrou o recorde mundial do Guiness com a maior obra de arte de grafite do mundo.
Kobra levou dois meses para concluir o trabalho que ocupou uma área de quase 30.000 pés quadrados.
“Etnias” revela as cinco faces dos cinco continentes e traz a mensagem que todos nós somos um! Essa é apenas uma das famosas obras do artista paulistano da periferia do bairro do Campo Limpo, em São Paulo - Brasil, que o mundo ganhou de presente.
As obras do brasileiro estão nas principais países, cidades, muros do planeta. Influenciado por artistas da arte moderna e contemporânea, o realismo dos seus grafites muitas vezes faz com que suas pinturas de superfície plana pareçam tridimensionais.
Eduardo Kobra conversou com a Meer sobre arte, política, direitos humanos e futuro.
Por que você demorou tanto tempo para vir para Londres?
Eu fiz um mural em Camden Town há 8, 9 anos, mas ele não existe mais, porém a Inglaterra, de uma forma geral, é muito especial por conta da história da arte, dos grandes museus. Eu pintei em Bristol, cidade do artista fabuloso, Banksy, um ícone! Ele já gravou o nome dele na história da arte. Agora eu tenho essa oportunidade de trazer um pouco do meu trabalho, expondo aqui no Eden Gallery, no centro de Londres. Acabei de fazer um pequeno mural no Camden Market (Camden Town) e espero ter a oportunidade de pintar outros murais grandes aqui em Londres, embora o processo burocrático seja um pouco complexo, mas a gente está se organizando para isso, a gente já deu entrada para estar realizando esses murais.
Quais são os temas centrais do teu trabalho? Alguns deles trazem mensagens políticas, de direitos humanos. Esse é o foco da tua arte?
Meu trabalho, por si só, trata de vários temas. A mensagem política já está alojada, consistente, ela é pertinente nas minhas obras. Eu falo da união dos povos, de tolerância, respeito, proteção dos povos indígenas e das florestas, falo da questão do racismo, eu tenho vários temas e eu acabo levando essas mensagens para o mundo todo. Essa é a posição política que eu acredito. Posição voltada para a paz, para o respeito que acho que o Brasil e o mundo tanto precisam atualmente. A gente está vivendo conflitos, misérias, fomes, guerras. Eu quero com o meu trabalho, de certa forma, transformar, trazer esperança. Além da questão estética, as mensagens são os fatores principais da minha obra.
O que você diria para aquelas adolescentes, principalmente, grafiteiros, pixadores das periferias do mundo? Existe espaço para eles?
Olha, arte de rua é multifacetária, existem vários segmentos. Existe o pich (Pichar), tem o grafite, tem o mural, tem artistas que pintam com spray, com stickers, com rolinho, enfim. Cada um escolhe o caminho que quer. Eu sou alguém que surgiu nas ruas do Campo Limpo, na periferia de São Paulo. Comecei com pixação ilegal, fui detido algumas vezes, mas eu não acredito que uma coisa seja evolução da outra. Pixação é uma coisa, grafite é outra e mural é outra coisa. Aqueles que tem afinidade com desenho e pintura têm, hoje, um campo muito importante aberto no mundo inteiro de possibilidades e oportunidades.