Desde que nós existimos enquanto sociedade, regendo as nossas vidas sob os princípios legais que consagram os nossos direitos, também as várias nuances da criminalidade existem desde então. De forma simples e linear, a partir do momento que se define algo como bom ou correcto, o que vier interferir com isto acabará por ser mau ou incorrecto. A título de exemplo, todos temos o direito à propriedade, pelo que a subtracção do que é nosso (roubo, furto) é declarado como ilegal.
O primeiro passo está sempre ligado à consagração dos bens jurídicos, ou seja, dos valores que, à luz do Direito, devem ser protegidos. De seguida surgem os vários recursos disponíveis para garantir que esses mesmos bens jurídicos se mantêm invioláveis. Temos a lei escrita na forma da Constituição da República Portuguesa e do Código Penal, as instituições que executam a lei na forma dos tribunais, e os Órgãos de Polícia Criminal (OPCs) marcam presença no terreno para prevenir e lidar com quaisquer irregularidades, remetendo-as consequentemente para as respectivas estruturas para que “se faça justiça” e os bens jurídicos violados sejam reparados.
Com a óptica a incidir nos agentes que estão no terreno, rapidamente fica claro que é necessário um elevado grau de preparação, não só ao nível das competências físicas e psicológicas, mas ao nível do conhecimento técnico. A criminalidade evolui ao mesmo ritmo da sociedade, adaptando-se às várias técnicas e métodos que são empregues para a combater, com ela rapidamente a elevar a fasquia para requisitos ainda mais complexos.
Com isto fica rapidamente claro o quão necessário é garantir que o primeiro contacto é feito à luz da experiência de alguém munido com os recursos necessários para garantir que tudo é tratado de forma íntegra e célere.
É aqui que entra o paradigma da Criminologia em Portugal. Apesar de ser considerada uma área imprescindível, continua a ser raro encontrar um Criminólogo a exercer funções na área em que se formou. Um dos principais indicadores que compromete este objectivo passa pelo estereótipo que é dado ao nome, pois, a criminalidade é algo que é tratado pelas polícias. Isto barra a porta que permite descobrir que, como alguém que estuda o comportamento criminoso, um Criminólogo pode exercer as suas funções numa escola, num escritório de advogados, num laboratório de polícia científica, num tribunal, num gabinete de apoio à vítima ou em qualquer outro local em que, de uma maneira ou de outra, o contacto com a criminalidade é uma constante.
Isto levanta peculiares questões, nomeadamente ao processo de formação de OPCs. Apesar de haver um investimento individual da parte de cada Criminólogo na sua educação e formação, não deixa de ser suficiente para ingressar (fora pontuais excepções) nas respectivas forças de segurança, que se sustentam através dos tradicionais concursos através dos quais se confere, posteriormente, uma formação que, à partida, um Criminólogo já deteria.
Os Criminólogos em Portugal viram a sua licenciatura ser reconhecida em 2019 com a Lei no 70/2019, de 2 de Setembro. Contudo, isto não foi impedimento para que as universidades não disponibilizassem o curso de Criminologia durante vários anos, condicionando quem seguisse este caminho a um período de incerteza no momento de ingressar no local de trabalho.
A criminalidade é, em si, algo complexo e mutável, assumindo várias formas e enveredando por vários sectores sociais. Perante isto, torna-se crucial garantir que quem está em contacto directo com ela esteja devidamente preparado. Como tal, torna-se claro que o primeiro passo está em dar a devida e merecida oportunidade aos Criminólogos.