Em 8 de julho de 1497 partiu de Belém, antiga freguesia portuguesa perto de Lisboa, uma armada composta por quatro navios: São Gabriel, São Rafael, Bérrio e uma nau sem nome, que servia apenas para transportar mantimentos que permitissem realizar uma viagem tão longa. O seu destino era a Índia das especiarias. Depois de uma viagem que durou quase um ano, avistaram a tão esperada terra indiana, a 18 de maio de 1498, fundeando em Calecute no dia 20. Restavam três navios, pois a nau de mantimentos tinha sido queimada pouco depois de a armada ter penetrado no Índico.
No regresso ao reino perderam mais um navio, a São Rafael, pois sofrera um rombo e além disso não dispunham de tripulantes em número suficiente para manobrar três navios. Finalmente, em finais de agosto, ou início de setembro, de 1499, Vasco da Gama regressa a Lisboa. Parou nos Açores, onde faleceu seu irmão, Paulo da Gama. Por essa razão, a notícia do sucesso da viagem chegou a Lisboa cerca de um mês antes do capitão-mor, quando a Bérrio entrou a barra do Tejo.
O quotidiano dessa viagem que durou mais de dois anos foi registado por um dos elementos da tripulação. O relato termina em abril de 1499, quando a armada se encontrava próximo de Cabo Verde, supondo-se que tal aconteceu porque o autor teria ficado em África, onde viveu alguns anos. O documento é anónimo, sendo atribuído por diversos estudiosos a Álvaro Velho, do Barreiro. Dele existe uma cópia na Biblioteca Pública do Porto. Foi depositado nesta biblioteca em meados do século XIX, pertencendo anteriormente ao Mosteiro de Santa Cruz, em Coimbra. Este relato da primeira viagem de Vasco da Gama foi inscrito em junho de 2013 no Registo da Memória do Mundo, da UNESCO.
De acordo com a informação existente na página portuguesa dessa agência das Nações Unidas: “O Programa Memória do Mundo está vocacionado para a identificação e preservação de documentos e arquivos de grande valor histórico, assegurando a sua ampla disseminação”. Que género de documentos são inscritos neste programa? Observando a lista de documentos inscritos verifica-se que são bastante variados. Na sua maioria são textos. Em termos cronológicos encontramos documentos do Segundo Milénio a.C., como as tabuinhas cuneiformes hititas de Bogazköy, propostas pela Turquia; até vários outros documentos do século XX, como os já mencionados relatórios. Alguns dos textos são bastante famosos, como a Magna Carta, a Bíblia de Gutenberg, o primeiro livro impresso em carateres móveis, o Diário de Anne Frank, entre outros.
Portugal inscreveu seis documentos. O primeiro documento a ser inscrito, em 2005, foi a Carta de Pêro Vaz de Caminha, que, redigida entre abril e maio de 1500, relata a descoberta do Brasil pela armada de Pedro Álvares Cabral. Em 2007, Portugal consegui que fossem reconhecidos o Tratado de Tordesilhas ‒ assinado em 1494 entre Espanha e Portugal para dividir “as terras descobertas e por descobrir” ‒ e o Corpo Cronológico, conjunto de documentos relativos aos Descobrimentos Portugueses. Em 2011 foi inscrito o Arquivo dos Dembos, que abrange mais de um milhar de documentos referentes a esta cultura, oriunda de Angola. Nesse mesmo ano foram inscritos os relatórios de Gago Coutinho e Sacadura Cabral sobre a primeira travessia aérea do Atlântico Sul, em 1922.
Com a inscrição, em 2013, do relato da primeira viagem de Vasco da Gama à Índia, é dado mais um passo no reconhecimento internacional desta viagem que muitos consideram como o primeiro passo da globalização.